Há muitas bandas de rock com anos de estrada que privilegiam os sucessos do passado. Por exemplo, Bon Jovi e Iron Maiden investem pesado em clássicos dos anos 1980 e 1990 em detrimento de trabalhos de estúdio recentes.

O Metallica também segue essa linha. O setlist da sua apresentação no último Rock In Rio mostra como eles estão investindo em músicas com décadas de idade e aprovadas pelos fãs. Com o filme Metallica: Through The Never, os músicos James Hetfield, Kirk Hammet, Lars Ulrich e Robert Trujillo, conhecedores da força das suas imagens e acompanhados pelo diretor Nimród Antal, procuram, com uma mistura de apresentação ao vivo e ficção, agradar aos fãs – e ganhar dinheiro.

Ações “caça-níqueis”, como turnês só com sucessos do passado, não são rigorosamente um problema. Graças a elas, muitos fãs mais novos puderam conferir ao vivo clássicos como Hit The Lights Master of Puppets. O problema mesmo é ver como uma apresentação pirotécnica e sensacional da banda é diminuída pela inconsistência da parte ficcional do longa.

Durante o show filmado no Canadá, os músicos nos brindam com as músicas citadas acima e mais For Whom The Bell Tolls, And Justice For All One, dentre outras obras-primas. Quanto à performance, só há elogios. Os artistas, apesar de já serem senhores na casa dos cinquenta anos, têm mais energia do que muitas bandas de moleques que estão começando agora. A apresentação é empolgante a ponto de ser capaz de você ouvir alguém, ao seu lado, cantarolar as músicas ou bater o pé de acordo com o compasso da bateria.

O recurso 3D ajuda, de fato, a nos imergir naquele momento. Quando a câmera filma da plateia, nos sentimos como se estivéssemos no show, ao lado daquele cara mais preocupado em filmar e fotografar tudo com o seu celular do que em curtir o momento. Em um instante da apresentação, alguém lança um “cotoco” pros músicos, e é capaz de você achar que quem fez o gesto foi aquele cara do pé nervoso ao seu lado.

Apesar da força dos protagonistas e as qualidades da fotografia, o filme despenca quando acompanhamos a sua parte ficcional, que conta a história do roadie Trip (Dane DeHaan), que procura um motorista e uma mala misteriosa.

A jornada do protagonista, que tem a expressão facial similar à do cigano Igor, é cheia de incoerências. A seguir, vão algumas:

Como uma banda do porte do Metallica manda um moleque para uma missão aparentemente importante numa van caindo aos pedaços?

Como ninguém liga pra ele, cobrando-o por estar demorando?

O que diabos tem na maleta?

Era para nós “pirarmos” com a maneira que o diretor a aborda, é isso mesmo?

Como pode um protesto, em pleno 2013, não ter ninguém usando a máscara do V de Vingança?

Nimród Antal tenta defender as incoerências do filme ao usar uma abordagem surrealista. Ele não cria as condições necessárias, como uma mínima apresentação do contexto da história, para que os elementos absurdos da trama se tornem aceitáveis. Em vez disso, ele joga informações com o intuito de só e somente só querer surpreender e chocar o público. As afetações de Antal, que optou por transições de planos dignas do fim de “Casamento”, do Porta dos Fundos, parecem nos querer dizer algo como “mamãe, olha como eu sou surrealista”. Não é assim que a banda toca.

A parte ficcional de Through The Never nos entristece quando percebemos que ela se aproxima. Mas, em compensação, ela nos deixa mais ansiosos para que a parte do show chegue.

A obra não é o primeiro longa do Metallica. O mais famoso deles é Some Kind of Monster. O documentário tem o mérito de ir para além das fronteiras de ser uma produção de fãs para fãs ao analisar como as relações interpessoais podem ficar desgastadas com os anos de convivência, o que reforça, dessa forma, o apelo universal da história.

Metallica: Through The Never não tem uma temática forte como o seu antecessor e é um vídeo institucional sem medo de ser feliz. Foi feito para agradar aos fãs e vender a imagem da banda. Nele, Lars Ulrich parece ser uma pessoa flexível. Ao mesmo tempo, é uma obra que tem os seus méritos, como a fotografia, ofuscados pelas suas falhas, como o roteiro.

Sendo fã da banda, talvez você consiga ignorar a parte ficcional e se concentrar na apresentação, que é o que realmente importa.

NOTA: 7,0

P.s.: a plateia canadense é muito morna. Se fosse no Brasil, o show teria beeem mais empolgação.