De vez em quando, até mesmo como exercício, entro numa sala de cinema sem saber absolutamente nada sobre o filme. Para quem escreve sobre filmes ou vive um pouco esse universo de informações sobre produções, diretores, etc., é uma experiência refrescante poder se desligar de contextos prévios para uma visão mais seca do que quer que se esteja vendo.

Da última vez em que isso aconteceu em um filme que resenhei aqui, tive uma grata surpresa. Dessa vez, com a nova produção dos estúdios Disney, “Meu Amigo, o Dragão”, uma coisa causou impacto logo de cara: aos desavisados, o filme é live action. Com a maioria dos cartazes dando muito ou completo destaque ao protagonista feito de CGI, esse é um detalhe que pode passar despercebido.

Infelizmente, nada mais na produção traz tanta surpresa ou emoção quanto essa descoberta (a qual, se você tiver visto o trailer, você nem vai ter). “Meu Amigo, o Dragão” é um remake de um musical da Disney da década de 1970 que misturava animação tradicional com atores de carne e osso. Curiosamente, ambos chegam ao cinema com a pretensão de replicar sucessos prévios: seu antecessor almejava repetir o combo animação + atores + músicas de “Mary Poppins” (1964) e este, pelas dicas de roteiro e divulgação, quer muito ser o novo “Mogli, o Menino Lobo” (2015).

Meu Amigo, o Dragão

Antes fosse: enquanto a aventura de Jon Favreau encantou o público retirando atuações extraordinárias de seu elenco vocal e empregando basicamente o melhor CGI que o dinheiro pode comprar em 2015, “Meu Amigo”, a despeito de uma computação gráfica bem eficiente, pena para fazer os atores que aparecem na tela reagirem a um roteiro pedestre que lembra os telefilmes da época em que telefilmes eram ruins.

A trama de um menino selvagem, criado por um dragão que fica invisível, e que se vê de volta à civilização sem entender nada e sem o único ser com quem tem vínculo afetivo tinha tudo para ser melhor aproveitada. A morte dos pais, a adaptação à nova vida, o trauma… Claro, o filme é infantil e não um drama à la “O Quarto de Jack” (2015), mas, mesmo nos termos exigidos pelo teor, sobram buracos narrativos e, no final das contas, o longa opta por apostar suas fichas em um discurso ambientalista batido que não faz favores a ninguém.

O fato de Oakes Fegley, que interpreta o protagonista, não ter o talento de um Jacob Tremblay não colabora: seus momentos em cena que mais funcionam são os que ele têm de representar uma criança feliz com seu dragão. Quando precisa demonstrar outro tipo de conflito, o ator padece. Pior de tudo é ver um elenco que conta com gente do naipe de Bryce Dallas Howard, Wes Bentley e Karl Urban não conseguindo emocionar. Raios, nem Robert Redford é poupado da ineficiência.

'Meu Amigo, o Dragão': filme com cara de Disney Channel dos piores

Isso ficou notório, inclusive, durante a sessão: os ganchos de humor do filme não conseguiam impressionar a meninada que lotava a sala de cinema e vários saíram durante a projeção. A duração pode também ter colaborado: com 102 minutos, o filme se arrasta, já que sua história parece esticada para preencher um tempo de longa-metragem. “Meu Amigo, o Dragão” poderia ser um bom especial de uma hora do Disney Channel, mas, do jeito que está, é uma aventura infantil rasa que relembra que, apesar do seu histórico, a Disney não está imune a tiros no pé.