Conhecido por filmes como “Eu, Meu Irmão e Nossa Namorada” e “A Estranha Vida de Timothy Green”, Peter Hedges costuma criar tensão a partir de dinâmicas familiares difíceis. Em “O Retorno de Ben”, ele traz isso ao dirigir o filho, Lucas Hedges, e Julia Roberts em uma trama sobre dependência química e um complicado encontro familiar na véspera de Natal.

Roberts dá vida a Holly Burns, uma mãe que fez sacrifícios para que o filho (Lucas Hedges), pudesse ir para uma clínica de reabilitação e se recuperar de seu vício das drogas. Holly tenta ser uma fortaleza, enquanto assiste seu filho desmoronar e luta para manter a sanidade e dignidade dele. Para isso, ela escolhe acompanhá-lo e protegê-lo em uma jornada dramática e emocionante, porém sem escapar de irregularidades.

A volta de Ben é um risco à família: ele já cometeu vários crimes e o recorte do roteiro assinado por Hedges são as conseqüências de suas escolhas. O primeiro ato cria uma atmosfera de desconfiança para com o personagem principal; como ele mesmo relata a mãe, não devemos confiar nele.  O bloco seguinte, porém, procura desmistificar tanto a visão que se adquire de mãe e filho, criando situações em que a câmera na mão traduz com eficácia o desespero enfrentado.

Há de se destacar a parceria entre Lucas Hedges e Julia Roberts: “O Retorno de Bem” funciona pela densidade dramática que eles trazem e a confiança com que correspondem a direção de Peter Hedges, superando situações constrangedoras e fora de timing. Indicado ao Oscar por “Manchester à Beira-Mar”, Lucas consegue ser ambíguo e transparecer o desespero por cura e redenção do personagem, enquanto Roberts se reafirma com uma das melhores atrizes em atividade. Ela vai a extremos e cria conexões com a motivação de uma mãe em salvar seu filho. Digo isso porque ela supera melancolia, medos e aflições para desbravar territórios perigosos e longe de sua zona de conforto por amor.

E para pontuar a confiança na interpretação e capacidade dos atores, o roteiro de “O Retorno de Ben”, escrito pelo próprio Peter Hedges, faz com que conheçamos a desilusão familiar sem recorrer a flashbacks. O conhecimento nasce dos confrontos rotineiros que a presença de uma pessoa em tratamento contra dependência química causa na comunidade próxima.

É interessante como a situação se desmonta aos nossos olhos por meio das lentes de Stuart Dryburgh. O diretor de fotografia faz escolhas de planos interessantes que recriam imageticamente a atmosfera conflituosa em que a relação de Ben e Holly se estabelece. Quando mãe e filho estão em sintonia de pensamento e ideais, aparecem na mesma linha visual – situação expressa na reunião de viciados anônimos. De forma semelhante, ao Holly não concordar com a maneira de agir de Ben, o enquadramento fica torto: rememorando a distorção da visão de vida que ele tem.

Outra contribuição fotográfica são as cores, especialmente, os tons frios. O azul e cinza são constantes no primeiro bloco e não se resumem apenas a família Burns, mas se estendem a todas as ambientações do filme.  Como se a fotografia e direção de arte se apropriassem da fala de Holly – todos ficam bem de azul” – para recriar a maneira hostil e distante com que todos os personagens tratam Ben.  O problema é que essa harmonização visual só é funcional na primeira parte do filme, pois, ela diminui ao mesmo tempo em que a tensão explode em um suspense road movie. E é nesse ponto que as irregularidades do filme se sobressaem.

“O Retorno de Ben” é um filme profundamente humano.  Apesar de escorregar em alguns momentos e se tornar previsível, Peter Hedges conduz o expectador a acompanhar os sacrifícios de uma mãe por seu filho e se identificar com as falhas e anseios deles. Além de sensibilizar ao tocar em um assunto contemporâneo e perigoso como a dependência química juvenil e seus estragos a longo prazo.