Como a maior parte dos garotos da minha geração (tenho 25 anos), peguei a última grande fase dos ícones do cinema de ação americano.

Sylvester Stallone, Chuck Norris, Charles Bronson, Jean-Claude Van Damme, Steven Seagal, Dolph Lundgren, Christopher Lambert, Bruce Willis e o bom e velho Arnold Schwarzenegger estavam no último suspiro no início dos anos 1990, mas nós não tínhamos como adivinhar – afinal, filmes como O Exterminador do Futuro 2 (1991), Soldado Universal (1992), O Demolidor (1993) e Duro de Matar 3: A Vingança (1995) faziam um enorme sucesso no cinema, e eram reprisados ad nauseam nos Temperatura Máxima e Domingo Maior da vida.

Nos últimos 15 ou 20 anos, porém, todos esses nomes – exceto Willis –, se não foram totalmente esquecidos (Lambert, Lundgren), passaram a amargar um longo ostracismo. Alguns, na ânsia de se conservarem “jovens” e ativos, se submeteram a plásticas horrendas (Van Damme, Stallone), outros mudaram de ramo (Schwarza virou político, conquistando o posto de governador da Califórnia), enquanto outros ainda se conformaram com o status de anciões do gênero (Norris e Seagal, que foi ressuscitado ao virar mentor do ídolo Anderson Silva), e assim permaneceram.

O empreendedor Stallone, porém, responsável por alguns dos maiores sucessos do grupo – Cobra, a série Rambo – conseguiu revitalizar a velha gangue ao emplacar o sucesso Os Mercenários (2010), no qual os nomes citados dividem espaço com jovens astros, como Jason Statham (série Carga Explosiva) e Jet Li (de O Mestre das Armas). Com a trilha do sucesso reaberta, a pergunta que os antigos heróis devem estar se fazendo agora é: como continuar a ter apelo junto ao público jovem – seus principais consumidores? Como se manter relevante quando o cinema acelerado e violento, do qual eles foram expoentes, está muito mais rápido e mais violento?

A resposta dada por Schwarzenegger neste O Último Desafio é pouco satisfatória. Não é um filme ruim, conseguindo divertir razoavelmente durante suas quase duas horas de duração, mas não acrescenta nada à carreira do ator, que tem no currículo desde grandes filmes, como os dois primeiros O Exterminador do Futuro, a produções menores, mas ainda assim cheias de fôlego, como O Vingador do Futuro (1993) ou True Lies (1995). A culpa disso é a insistência em reaproveitar o personagem habitual do austríaco: durão, impassível e – aí está a ironia – em plena forma para aniquilar seus inimigos. O filme reconhece a tolice desse esforço, numa cena à moda de Os Mercenários, onde Ray, o xerife vivido por Schwarza, cai de um edifício junto com um inimigo que ele acabou de matar e, ao tentar se levantar, admite para os fregueses de uma lanchonete, que presenciaram a cena: “Estou velho!”.

Na origem, O Último Desafio é uma espécie de despedida desse personagem, e, desse modo, guarda coerência com a carreira do mito: Ray Owens foi um policial de prestígio em Los Angeles, mas, após décadas usando de violência contra seus algozes, e presenciando todo tipo de tragédias, ele se retira para a cidadezinha de Sommerton, onde busca ter uma velhice tranquila como xerife. Quando o chefão do tráfico internacional Gabriel Cortez (Eduardo Noriega) é transferido para outra prisão pelo FBI, ele arma uma fuga engenhosa, que inclui atravessar a fronteira mexicana usando uma ponte móvel, a ser erguida – onde? onde? – na cidadezinha de Sommerton.

O filme marca a estreia do diretor sul-coreano Kim Ji-Woon, do excêntrico western Os Invencíveis (2008), em Hollywood. Tal como naquele filme, Kim faz uma releitura do gênero americano, onde o xerife solitário Ray, como o Gary Cooper de Matar ou Morrer (1952) tem de defender com seus parcos recursos a minúscula cidade. O cavaleiro negro é Cortez, e, no lugar dos cavalos, entram máquinas tunadas como o Corvette C6 ZR1 usado pelo vilão. Aí reside o único elemento “atual” da trama: nas longas tomadas do carro de Cortez, com o som trovejante potencializado pelos alto-falantes da sala de cinema, o filme aproveita lições da série Velozes e Furiosos, e até consegue remeter ao extraordinário Drive (2012), especialmente na melhor cena do filme, aquela em que Cortez usa o veículo para despistar um helicóptero.

Dito assim, parece mais interessante do que o filme realmente é. Mas O Último Desafio, apesar dessas referências, é só mais um longo desfile de frases de efeito e matança indiscriminada. Schwarza ainda encontra apoio no bem-intencionado elenco secundário, com Rodrigo Santoro, eficiente mas nada memorável, e Luis Guzmán, de longe o melhor – e mais humano – personagem do filme, com toda a sua sensata covardia.

Ji-Woon ainda tenta desenvolver uma segunda trama, trazendo Forest Whitaker como o coordenador da equipe do FBI que caça Cortez, mas tudo existe em função do personagem de Schwarzenegger. E, embora o ator ainda esbanje carisma e atuações canastronas, como Ray bem lembra, ele está velho – bem como o estilo de filme que ele se acostumou a fazer. Não convencem mais a correria, as quedas dos edifícios, o armamento absurdo dos personagens. E o clímax do filme, o embate final entre Ray e Cortez, é sofrível – vai desde Ray achando um Camaro ZL1 dando sopa na esquina até um duelo que mais faz rir do que cria tensão – digo isso ao observar a profusão de risadas da plateia. A cereja do bolo é a presença irritante de Johnny Knoxville (do programa Jackass), dizendo e fazendo coisas estúpidas o tempo todo.

Apesar dele, O Último Desafio consegue fazer rir – o que parece ser uma característica desse revival dos heróis de ação, que abusa de piadinhas sobre a velhice dos atores, em vez de apostar na aura de invencibilidade dos mesmos – no que faz bem, aliás.

E o filme também é um adendo digno à carreira do eterno ‘Terminator’. O velho Exterminador transparece o cansaço nas cenas. Cansaço não só do corre-corre incessante, mas também do personagem durão que lhe deu fama. Ainda assim, ele caminha, cheio de autoridade, em sua investida final contra Cortez, para dizer uma frase que, em sua voz grave, entra para a galeria de frases antológicas dos seus filmes: “Você está preso!” – o mais próximo de Clint Eastwood que qualquer dos seus colegas de geração já chegou.

Nota: 6,0