No começo da década de 1990, quando o cinema de ação era dominado pelos atores Sylvester Stallone e Arnold Schwarzenegger (e seus personagens brutamontes), o estúdio Paramount Pictures começou a levar para as telas um tipo de produção que poderia se qualificar de “o filme de ação com cérebro”. Eram as adaptações cinematográficas dos livros do escritor Tom Clancy: histórias que misturavam suspense e aventura com cenários e situações plausíveis, ambientados no mundo da Guerra Fria e o imediato período após o seu fim. E esses livros eram estrelados por um herói bastante humano: o analista da CIA Jack Ryan, sempre metido em encrencas maiores do que ele, e das quais ele escapava usando, sobretudo, a sua inteligência.

Pelo menos um dos filmes com Jack Ryan já merece ser considerado um clássico dos gêneros suspense/espionagem no cinema, o extraordinário “A Caçada ao Outubro Vermelho” (The Hunt For Red October, 1990). Naquele primeiro filme, Alec Baldwin interpretou Ryan. Baldwin, no entanto, não quis retornar ao papel e então Ryan foi interpretado com carisma e seriedade por Harrison Ford em duas produções que, embora não chegassem ao nível de “Caçada”, eram legais – “Jogos Patrióticos” (Patriot Games, 1992) e “Perigo Real e Imediato” (Clear and Present Danger, 1994). E bem depois deles, o estúdio tentou rejuvenescer o personagem dando-lhe o rosto de Ben Affleck no fraquinho “A Soma de Todos os Medos” (The Sum of All Fears, 2002).

Agora a Paramount tenta rejuvenescê-lo de novo, trazendo a primeira aventura cinematográfica de Jack Ryan feita após o falecimento de Tom Clancy em 2013, e a primeira não baseada num dos seus livros: “Operação Sombra: Jack Ryan”. Chris Pine, famoso dentro do estúdio por ter interpretado o jovem Capitão James Kirk nos dois longas “Star Trek” dirigidos por J. J. Abrams, se torna o quarto ator a viver o personagem. De acordo com o contexto atual, agora a história dele se inicia com a queda das Torres Gêmeas em 2001. O atentado o leva a se alistar nos fuzileiros e ele parte para o Afeganistão. Lá sofre um grave acidente de helicóptero (mencionado, em outro contexto, em “Caçada”) e, enquanto se recupera, é recrutado para a CIA pelo misterioso Thomas Harper (vivido por Kevin Costner).

Ryan começa a fazer análise financeira para a CIA, tentando identificar fundos pertencentes a grupos terroristas em todo mundo. Ele então se depara com a movimentação do suspeito Viktor Cherevin (Kenneth Branagh), um industrialista russo, e na sua investigação o analista começa a correr perigos junto com sua “quase-noiva” Catherine (Keira Knightley).

Além de atuar no filme, Branagh também o dirige, e parece ter deixado definitivamente para trás suas versões para o cinema de peças de Shakespeare, tornando-se mais um operário padrão dos estúdios americanos. Sua tentativa de adaptar Ryan e a trama ao estilo de Tom Clancy aos dias atuais até começa bem, mas logo a sensação de rotina se revela. O filme tem todas as situações e figuras-padrão desse tipo de história: Costner faz o “mentor” que vai orientar o jovem herói, a mocinha entra em perigo (por conta própria, no fim das contas, porque não consegue se afastar do herói)… Até a tradicional cena da invasão ao computador do vilão está presente. E o fato dos russos serem usados como vilões da trama representa um anacronismo que contribui para deixar a produção com jeito de velha.

O elenco é quem traz um pouco mais de qualidade ao filme. Costner consegue trazer um pouco de peso dramático a Harper, apesar do personagem ser meio raso, e até participa de algumas cenas de ação. E Branagh demonstra se divertir com seu papel de vilão e chega a roubar algumas cenas. Já Keira é prejudicada pela caracterização fraca de Catherine no roteiro, e entrega mais um desempenho hesitante, se limitando a bancar ora uma tola apaixonada, ora uma mocinha amedrontada.

Pine, por sua vez, tem uma atuação sem brilho como Jack Ryan. O ator até consegue convencer como um personagem inteligente e também se vira bem nas suas cenas de ação – pois os tempos são outros e hoje em dia, Ryan precisa ser um pouco mais ativo fisicamente que seus predecessores. Mesmo assim, embora esforçado, ele não causa grande impressão no papel.

Apesar do novo rosto, Pine não consegue realmente trazer Jack Ryan de volta para o cinema porque sua nova aventura já parece velha. Este retorno do personagem ao cinema existe não porque havia uma grande história para contar, mas porque Hollywood, especialmente hoje em dia, tenta ressuscitar suas velhas franquias a todo custo, mesmo que algumas delas na verdade pertençam a outra época. Os “filmes de ação com cérebro” infelizmente continuam meio difíceis de encontrar, mas o cenário nesse gênero hoje está melhor – Nesses últimos anos vimos a série “Bourne”, os filmes “Missão Impossível”, a revitalização da franquia 007, entre outros… Nesse cenário, Jack Ryan, com essa produção pouco empolgante, se tornou apenas mais um.

NOTA: 4,0