Na pior das hipóteses, alguém incauto poderia olhar o pôster e a sinopse de Os Anarquistas e julgá-lo como um daqueles filmes que só servem como ferramentas metodológicas em aulas de história, a fim de ilustrar melhor um determinado período histórico ou um movimento específico. Pena que o longa francês passe longe até mesmo disso: a tal anarquia está só no nome do filme dirigido por Élie Wajeman. O que temos, na verdade, é um romance sem graça que desperdiça os talentos de um bom elenco.

Os Anarquistas conta a história do policial Jean Albertini (Tahar Rahim), que é recrutado para se infiltrar em um grupo de anarquistas na Paris de 1899. Uma vez no grupo, ele se torna amigo do líder (Swann Arlaud), mesmo sob a desconfiança de alguns, e, ao mesmo tempo, começa a ter um caso com a companheira deste (Adèle Exarchopoulos), vivendo então o dilema de denunciar o grupo ao passo que simpatiza com os integrantes.

Nesse ponto, talvez um dos atos mais corajosos do roteiro de Os Anarquistas seja não disfarçar ou romantizar em momento algum a aparente covardia de Jean em todas suas ações: por mais desconfortável que o personagem se sinta em sua posição de “infiltrado”, ele nunca parece estar disposto a sujar as mãos, seja levantando a bandeira dos anarquistas ou agindo como um delator e traidor até as últimas consequências. Essa indecisão se torna um fator importante tanto para o personagem quanto para os rumos da história. Enquanto isso, a fotografia em tons de azul onipresente só realça a melancolia de toda a trama, em um bom trabalho, embora óbvio, de David Chizallet.

Os Anarquistas (Les Anarchistes), com Tahar Rahim e Adèle Exarchopoulos

Esses recursos não são o suficiente, porém, para trazer algum tipo de urgência à história: falta contextualização histórica e mais detalhes sobre o período retratado e o processo conturbado por qual a sociedade da época passa. Assim, a anarquia se torna apenas um detalhe na composição dos personagens da trama, aparecendo em alguns poemas e discursos como mero enfeite. Não à toa, curiosamente, um dos próprios personagens joga em questão a problemática de muito discurso e pouca ação a certa altura do filme, mas até isso passa muito rápido. Quem espera um filme politizado ou pelo menos uma dramatização histórica nas tintas de um programa do History Channel, vai se frustrar – Élie Wajeman prefere investir no romance entre Jean e Judith, por mais sem sal e obrigatório que ele pareça. Pelo menos Tahar Rahim e Adèle Exarchopoulos fazem o que podem com seus papeis, ele investindo na dualidade do protagonista e ela se cercando de uma aura de segurança e mistério – até desabar num choro tão poderoso quanto o de Azul é a Cor Mais Quente.

No fim das contas, alguns breves momentos interessantes e o belo uso de uma música do The Kinks não bastam para salvar Os Anarquistas: para um filme sobre anarquia, está tudo muito no lugar. É aquele filme inofensivo, que não faz mal, mas também não cativa.