Na semana passada, o Cine Set publicou uma notícia um tanto quanto curiosa: esnobada na temporada de premiações pelo desempenho em “Joy – O Nome do Sucesso”, a atriz Diane Ladd botou a boca no trombone e reclamou da escolha de alguns estúdios em colocarem protagonistas concorrendo como coadjuvantes. Ela citou o caso de Rooney Mara, que divide os holofotes com Cate Blanchett em “Carol” e ainda deu a entender que outras duas estrelas estavam indicadas na categoria errada – uma delas certamente é a sueca Alicia Vikander, favorita à estatueta pelo trabalho em “A Garota Dinamarquesa”.

Essa reclamação de Ladd colocou em pauta algo há muito debatido por quem acompanha o Oscar: as chamadas “category frauds”, ou, em português, “fraudes de categoria”. Há quem defenda que essa prática chegou junto com o agressivo método de campanha de Harvey Weinstein, que, para conseguir o maior número de indicados possível vindo de sua produtora, jogou para coadjuvantes atores principais e vice-e-versa. No entanto, não dá para botar totalmente na conta de Weinstein essas tais “fraudes”. Bem antes de o produtor começar a mexer seus pauzinhos para movimentar a corrida do Oscar, a premiação da Academia já reconhecia os atores certos em categorias erradas, como o Cine Set vai mostrar nos parágrafos a seguir.


Timothy Hutton
Melhor Ator Coadjuvante, por “Gente Como a Gente” (1981)

A dita “fraude de categoria” costuma ocorrer quando o ator é jovem demais ou quando ele tem mais chances de vencer como coadjuvante/principal. Um dos casos mais gritantes é o de Timothy Hutton, que preenche os dois quesitos citados acima. Na época com 20 anos, o jovem era inquestionavelmente o protagonista do drama familiar “Gente Como a Gente”, de Robert Redford. No entanto, a Academia costuma ser reticente ao premiar homens tão ~novinhos~ (para se ter uma ideia, o ator mais jovem a ganhar o Oscar de protagonista foi Adrien Brody, que venceu quando tinha 29 anos).

Ao mesmo tempo, Robert De Niro era o favorito absoluto ao prêmio de melhor ator pelo desempenho em “Touro Indomável”, considerado um dos melhores da história do cinema. A solução? Jogar Hutton para a categoria de coadjuvante. Lá, ele bateu Joe Pesci, Jason Robards, Michael O’Keefe e o colega de elenco Judd Hirsch e se tornou o homem mais jovem a ganhar um Oscar de atuação.

Isso QUASE voltou a acontecer em: 2016, com Jacob Tremblay, cotado (porém esnobado) para o Oscar de coadjuvante por “O Quarto de Jack”.

PaperMoon_043PyxurzTatum O’Neal
Melhor Atriz Coadjuvante, por “Lua de Papel” (1974)

Falando em gente jovem, um caso semelhante ao de Hutton ocorreu alguns anos antes. A pequena Tatum O’Neal dividiu os holofotes com o pai, Ryan, no singelo “Lua de Papel”, de Peter Bogdanovich. O filme foi bem recebido pelo público e pela crítica e, com o amor que o Oscar nutre por crianças-prodígio (do sexo feminino, geralmente), era natural que a garotinha de dez anos fosse indicada a um prêmio. Naquela época, a estatueta destinada a atores mirins (que foi parar na mão de jovens como Judy Garland, por exemplo) já havia sido aposentada.

Então, por que não indicar O’Neal a um prêmio competitivo? Mas, colocá-la para bater de frente com a tarimbada Glenda Jackson (que venceu, na ocasião) e com a estrela Barbra Streisand? Melhor tentar a sorte em uma categoria menos ‘inflamada’, pensou o estúdio. Dito e feito.

Aos 10 anos, a adorável garotinha levou o Oscar de melhor coadjuvante e, como Hutton, fez história como a vencedora mais jovem da categoria (e de qualquer prêmio competitivo já dado pela Academia).

Isso voltou a acontecer em: 2011, com a indicação de Hailee Steinfeld por “Bravura Indômita”.

notes-on-a-scandal_2Cate Blanchett
Indicada a Melhor Atriz Coadjuvante, por “Notas Sobre Um Escândalo” (2006)

Nem só rostos desconhecidos são indicados a coadjuvantes mesmo quando interpretam papeis principais. Apesar de a Academia já ter indicado atrizes do mesmo filme na categoria de protagonistas (‘Thelma e Louise’ e ‘Laços de Ternura’, por exemplo), de uns tempos para cá os estúdios têm preferido arriscar menos e apostar na segurança de não ter suas estrelas concorrendo entre si. Em 2006, Cate Blanchett e Judi Dench chutaram bundas no subestimado “Notas Sobre Um Escândalo”.

Natural que as duas, favoritas da Academia, fossem reconhecidas, certo? É, mas com apenas cinco vagas em cada categoria, melhor ‘dividir a fortuna’. No caso, a veterana Judi Dench, que tinha o papel mais chamativo no drama, encarou Helen Mirren e sua “Rainha” na categoria principal, enquanto Cate Blanchett sorriu e aplaudiu Jennifer Hudson enquanto a jovem levou seu Oscar por “Dreamgirls”.

Isso voltou a acontecer em: 2014, com Julia Roberts e Meryl Streep (sim, isso também ocorre em vice-e-versa) em “Retratos de Família”.

secret-de-brokeback-mountainJake Gyllenhaal
Indicado a Melhor Ator Coadjuvante, por “O Segredo de Brokeback Mountain” em 2006

Os críticos da indicação de Rooney Mara como coadjuvante geralmente lembram do caso de Jake Gyllenhaal. O crítico e blogueiro Nathaniel Rodgers, do site The Film Experience, costuma dizer que os estúdios dividem os protagonistas de filmes de relacionamento entre pessoas do mesmo sexo baseando-se em quem são os personagens mais dominadores e os mais passivos (sem piadinhas, ok), emocionalmente falando.

Aqui, Gyllenhaal e seu romântico Jack Twist foram colocados na categoria de coadjuvante, concorrendo com atuações realmente ‘ladras de cena’, como a de William Hurt, que apareceu por poucos minutos em “Uma História de Violência” (nesse sentido, a vitória de George Clooney em ‘Syriana’ também pode ser contestada como ‘fraude de categoria’).

Isso voltou a acontecer em: 2016, com Rooney Mara, em “Carol”.

a beautiful mind jennifer connellyJennifer Connelly
Melhor Atriz Coadjuvante. por “Uma Mente Brilhante” (2002)

Se tem uma coisa que os votantes do Oscar A-D-O-R-A-M é o arquétipo da “esposa sofredora”. Nem sempre elas aparecem tanto quanto os interesses amorosos nos filmes, mas em casos como o de Jennifer Connelly, a presença e a importância delas é tão grande quanto a do dito “protagonista”. Connelly chegou a ser indicada ao SAG de protagonista em 2002, o que não é novidade – no ano anterior, o Sindicato chegou a premiar Benicio Del Toro como ator principal semanas antes de ele vencer o Oscar de coadjuvante por “Traffic”.

Contudo, o estúdio viu que a categoria de melhor atriz estava cheia com as favoritas Nicole Kidman, Halle Berry e Sissy Spacek e investiu suas fichinhas em Jennifer Connelly derrotando Kate Winslet (ainda uma jovem não oscarizada) e Marisa Tomei (já dona de um Oscar um tanto quanto controverso). A aposta deu certo e a bela atriz foi premiada pelo trabalho como a devotada esposa do matemático John Nash.

Isso voltou a acontecer em: em 2016, com Alicia Vikander por “A Garota Dinamarquesa”