De “Birdman” e “Boyhood” a “Coda” e “Ataque dos Cães”, Caio Pimenta analisa quais os clássicos e os esquecíveis indicados a Melhor Filme entre 2015 a 2022.

QUAL É ESSE FILME MESMO? 

Passa longe de ser raro ver no Oscar muitos filmes fracos, ruins ou simplesmente esquecíveis indicados nas principais categorias. Alguns deles simplesmente são nomeados por terem figuras conhecidas do grande público e com uma fórmula adorada pela Academia. 

“Lion” é um deles. Finalista em 2017, a produção traz Nicole Kidman, Dev Patel, Rooney Mara em um drama sobre um rapaz em busca das suas raízes após uma separação dolorosa. Trata-se de uma obra tão correta, sem maiores riscos que cansa no decorrer do tempo pela previsibilidade. Não é uma bomba, mas, terminado o filme, você pensa que assistiu apenas por ele estar no Oscar. 

Ainda que conte com a Saoirse Ronan, “Brooklyn” também vai pelo mesmo caminho de ser nada memorável. “O Jogo da Imitação” e “O Destino de uma Nação” são duas produções ambientadas no mesmo período histórico, sem maiores inovações e ancoradas pelos seus protagonistas. Certamente um tipo de filme que você já viu diversas vezes. 

Crítica: Ponte dos Espiões: um Spielberg (quase) sóbrio

Se “Ponte dos Espiões” é uma obra correta, mas, aquém dos melhores dramas do Steven Spielberg, “The Post” exagera nas tintas sensacionalistas para defender a imprensa. Nem mesmo a Meryl Streep e o Tom Hanks juntos conseguem tirar a sensação de que foi indicado por ter o elenco que possui. 

Já “O Beco do Pesadelo” é até um suspense que gosto bastante do Guillermo Del Toro, mas, tenho a consciência que, daqui a dois, no máximo, três anos será difícil lembrar dele. 

A turma de decepção esquecíveis chega com “Mank”, drama sonolento e enfezado do David Fincher que, mesmo sendo tecnicamente irrepreensível, desperta cansaço até mesmo nos cinéfilos apaixonados pela Hollywood dos anos 1930 e 1940. Já o Adam McKay não se ajudou com “Vice”, cinebiografia promissora sobre o Dick Chaney, mas, que resultou em uma verdadeira bagunça. 

Alardeado como o favorito ao Oscar 2022 antes da hora, “Belfast” traz um Kenneth Branagh sem saber bem aonde queria chegar, resultando em um filme incerto e pendurado em uma nostalgia que não cola no público. Se como diretor, o Aaron Sorkin prova ser um ótimo roteirista em “Os 7 de Chicago”, “Minari”, “Jojo Rabbit” e “Ford Vs Ferrari completam o time dos filmes esquecíveis. 

NEM LÁ NEM CÁ 

Sabe aquelas produções que são boas, mas, que não são marcantes, não entram para a história? Justamente aqui fica a maioria dos indicados ao Oscar dos últimos anos. 

Adoráveis Mulheres”, “História de um Casamento”, “À Qualquer Custo”, “Até o Último Homem”, “Estrelas Além do Tempo”, “Um Limite Entre Nós”, “Manchester à Beira-Mar“, “Perdido em Marte”, “O Quarto de Jack”, “Selma”, “Dunkirk“, “A Teoria de Tudo”. Difícil dizer que há uma bomba entre estas produções, porém, também passam longe de serem indiscutíveis. Entre elas, todas possuem alguma grande qualidade – a atuação, o roteiro, a direção ou uma área técnica como som ou fotografia -, mas, de modo geral, não chegam a ser memoráveis.  

Há também casos em que a premiação no Oscar ajuda o filme a não ser esquecível. Em 2022, tivemos dois exemplos disso. 

Considero “King Richard” uma verdadeira bomba, contraditória nos seus propósitos e com um discurso de meritocracia a partir do ponto de visto do protagonista bastante questionável. O longa, entretanto, só não cai no esquecimento por toda a novela envolvendo o Will Smith e a primeira vitória dele no Oscar. Mesmo caso de “Coda”, um longa bonitinho com um ótimo elenco, mas, nada espetacular. Porém, será sempre lembrado por ser vencedor de Melhor Filme – para o bem e para o mal. 

“Nomadland”, “A Forma da Água” e “Spotlight” são melhores que “Coda”, mas, também passam bem longe de serem filmes inesquecíveis – nem mesmo são os melhores das filmografias de Chloé Zhao e Guillermo Del Toro para se ter uma ideia. 

Completam esta lista “1917”, um drama de guerra do Sam Mendes muito bem executado na parte técnica, mas, completamente vazio de reflexões sobre a guerra; “A Favorita”, comédia dramática com um ótimo trio de protagonistas, mas, que não alcança totalmente seu potencial; “Roma”, lindo filme do Alfonso Cuáron, mas, incapaz de entender quem de fato é sua protagonista; e “Três Anúncios para um Crime”, um bom drama com suspense e comédia do Martin McDonagh com grande atuação da Frances McDormand, mas, que não chega a ser tão marcante assim. 

FILMES MARCANTES PARA O BEM E PARA O MAL 

Tem obras que podem não ser obras-primas, mas, ficam marcadas na história do cinema. Algumas para o bem e outras para o mal. Vamos começa com a turma de filmaços. 

A deliciosa viagem aos EUA dos anos 1970 trazida pelo Paul Thomas Anderson em “Licorice Pizza” pode não estar no mesmo patamar de “Magnólia” ou “Sangue Negro”, mas, não diminui em nada a força do filme. “Judas e o Messias Negro” e “Bela Vingança” são alguns dos ótimos exemplares da fraca safra de 2021, enquanto “Lady Bird”, “Me Chame Pelo Seu Nome” e “Trama Fantasma” representam o grande ano de 2018.  

A Chegada” colocou Denis Villeneuve de vez no radar de Hollywood e “A Grande Aposta” foi a consolidação do Adam McKay e suas comédias politizadas. “O Regresso” pode até ter a megalomania incômoda do Iñarritu, mas, é um longa de ação de tirar o fôlego. O mexicano também se faz presente aqui com “Birdman”, furioso filme sobre a indústria pop com planos sequências espetaculares. Já o Wes Anderson realiza em “O Grande Hotel Budapeste” o longa mais ambicioso da carreira, enquanto “Whiplash” é um golaço do Damien Chazelle logo no primeiro longa da carreira. “Amor, Sublime Amor” é disparado o melhor filme recente do Spielberg e uma versão para orgulhar o clássico dos anos 1960.

Também tem aquela turma que fica marcada por fatos além do cinema. 

Último grande sucesso do Clint Eastwood, “Sniper Americano” dividiu o público que questionou se o diretor exaltava um atirador responsável pela morte de centenas de pessoas ou se trazia uma crítica à violência da guerra. De qualquer modo, é uma obra essencial na carreira do mestre. “Duna” entra aqui mais como uma esperança de que a continuação consolide a franquia. Já “Green Book” ficou marcado pelo motivo errado: se tornou um dos piores vencedores da história do Oscar. 

Mesmo com uma série de defeitos, “Bohemian Rhapsody” está na memória do público até hoje igual “Nasce uma Estrela” graças à força da dupla Bradley Cooper e Lady Gaga e, claro, a “Shallow”, canção premiada no Oscar 2019. E ainda tem “Não Olhe Para Cima”, o filme mais divisivo da última temporada de premiações, mas, que representa bem os loucos tempos atuais de fake news e líderes messiânicos irresponsáveis. 

CLÁSSICOS IMORTAIS 

Agora, é a elite! São filmes que já podem ficar com a marca de clássicos instantâneos ou que virão a ser. 

A ousadia do Richard Linklater em gravar ao longo de uma década e olhar para a beleza do cotidiano como algo cinematográfico fazem de “Boyhood” algo raro dentro do cinema norte-americano. “Mad Max – Estrada da Fúria” é cinema de ação em estado puro, sendo um show de audiovisual orquestrado de forma ensandecida pelo George Miller. 

Produções tão díspares, mas, que acabaram se indissociáveis pela rivalidade na temporada de premiações de 2017, “Moonlight” e “La La Land mostram a diversidade de uma indústria capaz de realizar um romance dentro do mundo de sonhos de Hollywood e uma pequena joia inclusiva sobre ser negro e gay nos EUA. Falando de representatividade, “Corra”, “Pantera Negra” e “Infiltrado na Klan” foram marcos da provocação necessária do #OscarSoWhite”. 

Sorte do público ter a oportunidade de ver uma corrida como em 2020 com “Parasita”, “Era uma vez em Hollywood” e “O Irlandês”, obras marcantes de três diretores fundamentais para o cinema – Bong Joon-Ho, Quentin Tarantino e Martin Scorsese. Naquela mesma temporada, ainda havia “Coringa”, inferior sim aos três primeiros, mas, que retrata bem uma geração doente e paranoica. 

Apesar de ser menos reconhecido que os filmes anteriores, considero “O Som do Silêncio” aquela produção que será descoberta e valorizada ao longo do tempo pela engenhosidade da ambientação da realidade do protagonista para o público, além de atuações lindas do Riz Ahmed e Paul Raci. Há também “Meu Pai”, sofrido filme do Florian Zeller, inteligente nas escolhas de como traduzir a perturbação temporal e espacial de alguém sofrendo com Alzheimer. 

Da temporada de 2022, “Ataque dos Cães”, um western que quebra padrões com seus personagens frágeis e a tensão sexual fruto de uma repressão enorme, e “Drive My Car”, drama do Ryusuke Hamaguchi sobre as perdas e partidas da vida, são clássicos instantâneos.