Durante conversa com o marido ao chegar em casa após perder um importante jantar, Alice afirma que preferia ter câncer a Mal de Alzheimer. Segundo ela, a escolha fúnebre se daria ao aspecto menos vergonhoso para o enfermo de uma doença em relação a outra. O momento revela o desespero da protagonista pelo temor de perder a própria identidade e não ser mais a pessoa que era.

“Para Sempre Alice” acompanha o drama da personagem-título após os primeiros sinais e o diagnóstico de ser portadora do Mal de Alzheimer. Mesmo nova para ter a doença, ela apresenta um estágio de rápida evolução do problema, precisando se adaptar às constantes falhas da memória e desorientações espaciais. O apoio do marido e dos três filhos se torna essencial para esse processo.

Baseado no romance da escritora Lisa Genova, “Para Sempre Alice” se concentra no duro processo de despersonalização do portador de Alzheimer com o avanço do doença. Sem ter como se tratar e à espera do pior a ser oferecido a cada dia, Alice Howland vive a experiência de estar prestes a perder noção de quem ela é, o que já fez, quem são os amores de sua vida, além de não poder mais ter autonomia do próprio corpo. Essa consciência da derrota para si próprio sem ter alguma válvula de escape surge aos poucos, o que deixa tudo ainda mais tortuoso para o doente.

A derrota do corpo e da mente está atrelada à solidão. Se o aprendizado da linguagem, como bem diz a protagonista na palestra inicial, acontece pelos instintos naturais, o Alzheimer destrói esse fluxo com uma agressividade ímpar e interrompe o fluxo da comunicação tão fundamental para nos inserirmos na sociedade. Não à toa que na mesma conversa com o marido citada no primeiro parágrafo, Alice diz que um dos motivos para não se sentir à vontade é o medo de não lembrar mais palavras, nomes e piadas, se tornando uma vergonha para ela e os outros.

São esses dramas e conflitos vividos pela protagonista que tornam “Para Sempre Alice” um filme de Julianne Moore. Atriz conhecida por mesclar ótimas produções (“Mapas Para as Estrelas”, “Minhas Mães e Meu Pai”) com bombas (“Carrie – A Estranha”, “O Preço da Traição”) atinge nesta obra uma maturidade sensível. A degradação e o desespero latentes em tons cada vez maiores expressos em sequências como a ida ao banheiro e a busca pelo celular mostram o domínio de Moore sobre a personagem.

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Tal excelência acaba deixando o ótimo elenco coadjuvante (Alec Baldwin, Kristen Stewart) quase sem espaço para conseguir competir em pés de igualdade. O talento de Julianne Moore eleva ainda a qualidade de “Para Sempre Alice” para muito além de uma dramalhão ameaçado por vezes pelas tintas sentimentalistas aplicadas pelos diretores e roteiristas Richard Glatzer e Wash Westmoreland (até quando o cinema americano vai insistir em cenas grandiloquentes com trilhas melosas terminadas em aplausos da plateia?).

Independentemente dos maus tratos causados pelo Mal de Alzheimer e do fim dos vínculos humanos como conhecidos anteriormente pelo doente, “Para Sempre Alice” aponta a valorização do tempo vivido pela pessoa com o olhar sobre a trajetória com tudo que será deixado devido à existência dela: filhos, amigos, bons e maus momentos.

Pode ser e é piegas, porém, necessário para o alívio de tanto sofrimento.