Biografias procuram um tom de emoção que nos interliguem ao personagem em evidência e sua história. Raça propõe também conectar ao contexto histórico que seu personagem se insere. Contando a história de Jesse Owens (Stephan James), grande campeão das Olimpíadas de Berlim, em 1936.

Dirigido por Stephen Hopkis, Raça traz a trajetória de Jesse Owens, desde sua saída de casa para a faculdade de Ohio, o início de seu treinamento até ganhar quatro medalhas nas olimpíadas e desmoralizar as teorias de superioridade racial que o Reich pretendia instaurar. Dando vislumbres da situação olímpica, esportista e política de um mundo pré Segunda Guerra Mundial.

O filme é plano e tenta fazer uma correlação simultânea da trajetória de Owens, até se tornar um campeão olímpico, com as negociações de Avery Brundage (Jeremy Irons) para que o comitê olímpico dos Estados Unidos participasse da edição olímpica de 1936.  Neste ponto, o roteiro e a montagem não conseguem apresentar uma sequência uníssona no filme. Deixa o espectador um tanto perdido quanto ao que está acontecendo, embora se utilize legendas indicado o local, ano e evento ocorrendo, torna o filme uma concha de retalhos, que é positiva quando a proposta cinematográfica ou literária é esta. O que não é o caso. O recurso tenta dar dinamização a obra, mas peca por acaba apresentando um filme equivocado em relação a sua montagem.

O roteiro também tem seus furos. Há muitos personagens na película, alguns de importância histórica que poderiam ser talhados mais detalhadamente devido a sua complexidade natural, como Joseph Goebbels (Barnaby Metschurat), responsável por um trabalho forte de marketing e por popularizar que “uma mentira contada dez vezes torna-se uma verdade”, e é relegado a uma interpretação robótica beirando a psicopatia. Em contrapartida a ele, há Luz Long (David Kross), que é posto como o atleta alemão resistente ao governo nazista e que vê em sua própria derrota uma atitude de resistência às ideologias do terceiro Reich.  Outros personagens também pouco explorados são Avery Brundage, Jeremiah Mahoney (William Hurt) – dois atores experientes que foram regados a poucas sequências e já marcadas, Dave Albritton (Eli Goree), Eulace Peacock (Shamier Anderson) e a própria família Owens que são apresentados no inicio da projeção, relembrados ao final, mas não existem por quase 100 minutos de transmissão.

Outro ponto de fragilidade no longa-metragem é o apelo político que ele tenta transpassar. Raça tenta levantar um discurso político. Mas apenas tenta. São muitos discursos com tomadas inacabadas. Desde a disposição do roteiro em comentar o boicote proposto pelos cidadãos e alguns membros das associações de atletismo na América até a campanha levantada de limpeza de todo racismo e preconceito que dominavam a Alemanha Nazista nesse período.  E tudo isto envolto de uma matriz discursiva política maior que consistia no próprio preconceito norte americano que ainda se mantém forte em tempos de pré governo Trump.

A cabeça baixa de Owens ao conhecer Larry Snyder (Jason Sudeikis) e terem sua primeira conversa de técnico pra pupilo, o comportamento dele dentro do vestiário e sua reação às provocações, o uso de banheiros diferentes, entradas diferentes, a casa de show onde só há negros. Tudo isso contribui para o discurso sobre racismo que o longa-metragem procura debater juntamente com a denúncia da hipocrisia americana, contra a política nazista, mas realizando seu próprio holocausto social. A segunda contribuição é funcional e consegue gerar um mínimo de desconforto no espectador atento. Mas a primeira, é rasa, como um não-lugar que não consegue se realizar ideologicamente. “Raça” faz uma crítica ao racismo, porém tímida e sem grandes referências ao espectador da película.

Isto se deve ao roteiro construir um herói idealizado, que persistiu em busca de seus objetivos, embora o único obstáculo que enfrenta durante a narrativa seja um machucado que não é o suficiente para impedir que ele se torne campeão olímpico, a montagem não permite que se tenha tempo de suspeitar isso. Embora plano, justamente pela falta de reviravoltas, o filme é anacrônico. Coloca Owens num patamar de semideus olímpico e tenta por nas figuras de Hitler e Goebbels o maniqueísmo que não existe.

“Raça” é delineado em uma série de fórmulas folhetinescas e, nos últimos 20 minutos, garante certa empolgação. Mesmo que seu ritmo e desenvolvimento da narrativa pareça por muitas vezes redundante e pedante, há química na relação de Owens com seu técnico que consegue cativar a atenção do espectador. É no mínimo interessante assistir Jason Sudeikis distante de seus típicos personagens de comédia pastelão.

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O longa-metragem, apesar de tudo isso, procura evocar a memória de um atleta olímpico negro em plena construção do Reich, que não apenas se torna um herói nacional de uma nação hipócrita e intolerante racial, mas deixa sua marca na trajetória da história mundial.