Já há algum tempo o diretor Steven Soderbergh vem anunciando sua aposentadoria. Talvez não devesse, pois sua vontade de empacotar várias reviravoltas (e, com elas, os mais diferentes gêneros cinematográficos) em “Terapia de Risco” pode ser um sinal de que ele ainda tem muito fôlego para contar histórias. Ao condensar tantas surpresas em um só filme, ele enfraquece o teor de denúncia contra a indústria farmacêutica, mas cria um thriller curioso, ainda que com falhas.

“Terapia de Risco” mostra o drama vivido por Emily Taylor (Rooney Mara), que enfrenta uma grave depressão após passar quatro anos esperando o marido, Martin (Channing Tatum), sair da prisão após ter cometido falcatruas na Bolsa de Valores. Após uma tentativa de suicídio, ela passa a ser paciente do psiquiatra Jonathan Banks (Jude Law). Este segue o conselho da médica que atendia a moça anteriormente, a Dra. Victoria Siebert (Catherine Zeta-Jones), e receita para Emily um novo medicamento chamado Ablixa. A partir daí, o que começou como drama vira um thriller que não define mais a identidade do filme.

Por um lado, “Terapia de Risco” tem um elenco afiado, que aponta as nuances de cada personagem e garante um encaixe aceitável das peças do quebra-cabeça que o roteiro mostra ser depois da primeira metade. Destaca-se aí Rooney Mara, que desde “Millenium – Os homens que não amavam as mulheres” (2011) mostra um grande talento, e que em “Terapia de risco” transforma completamente sua Emily através de detalhes sutis. Por outro lado, o quebra-cabeça esvazia todos os temas expostos no filme, tais como a obsessão dos norte-americanos por remédios, o lobby da indústria farmacêutica e as consequências para a vida de médicos e pacientes com a disseminação dessa “cultura tarja preta”.

Se “Terapia de Risco” seguisse os passos de outro filme de Soderbergh, “Traffic” (2000), o resultado seria mais previsível, e provavelmente mais interessante enquanto crítica social. Ao optar por transformar o filme em um thriller, com direito a assassinato e investigação não-oficial de um homem só (é o máximo que pode ser revelado sem estragar as surpresas!), o andamento até consegue prender a atenção do espectador contrariado, mas apresenta inconsistências que não permitem que o filme seja tão marcante como prometia ser.

Essas inconsistências do roteiro são parcialmente aliviadas pela direção ágil de Soderbergh. O diretor tem paixão pelo processo de edição, e isso é claro nos momentos em que a mudança de perspectiva, expressa através dos cortes e movimentos de câmera, trazem a tona os reais motivos dos acontecimentos da trama. A fotografia é outro componente que ajuda nesse sentido, auxiliando diretamente na criação da atmosfera opressiva que rodeia Emily, com as cores pálidas e o grande destaque ao vermelho, quase que anunciando o que a condição da moça levaria a acontecer.

Uma pena que o domínio da técnica não ajude Soderbergh a tirar o ranço de Supercine de “Terapia de Risco”, principalmente em seu desfecho cheio de furos. Um diretor com uma carreira tão prolífica e que já conseguiu a proeza de concorrer a um Oscar consigo mesmo (e ganhar) merecia um final melhor, assim como esse filme.

Nota: 8,0