Um executivo entra em um pitoresco café em Berlim e pede um doce que sempre leva dali para a mulher. Solícito, o confeiteiro o serve e acaba envolvido em uma conversa. O executivo, então, lhe pede ajuda para escolher um presente para o filho quando o atendente terminar seu turno. Na próxima tomada, eles já estão entre portas fechadas em um terno abraço.

Esta é a apresentação de “The Cakemaker”, primeiro longa do israelita Ofir Raul Graizer e premiado no Festival de Karlovy Vary e passou pelo Festival de Londres. Aos que esperam romance, fica o alerta: o filme é dedicado não à relação entre o executivo Oren (Roy Miller) e o confeiteiro Thomas (Tim Kalkhof), mas à dor desse último quando seu amante morre em um acidente de carro.

O cinema contém fartas análises sobre o luto por um cônjuge, das pesadas (“A Liberdade É Azul”) às leves (“PS Eu Te Amo”), mas a proposta do cineasta estreante, aqui, é ousada: na busca por um senso de resolução para a sua história, Thomas larga tudo e parte para Jerusalém, onde procura a viúva de Oren, Anat (Sarah Adler), eventualmente começando a trabalhar no café que ela administra e se envolvendo em sua vida, com graves consequências.

O que se segue é o retrato de duas pessoas profundamente machucadas por uma perda e como suas dores propõem uma aproximação. Diante da ausência de uma pessoa amada, o cenário armado para ambos em “The Cakemaker” faz a pergunta: até que ponto a busca por reparação emocional está ligada à sexualidade?

Tudo isto é colocado na tela de maneira silenciosa, em que nem atuação nem elementos cênicos fazem muito alarde. Ademais, a relação entre Oren e Thomas, e a homossexualidade do confeiteiro uma vez em Jerusalém, é mostrada de maneira hermética, quase sem nudez – um ponto também criticado em filmes como “Call Me by Your Name” e o brasileiro “Do Começo ao Fim”. Tudo o que aprendemos sobre esse lado das personagens vem de maneiras muito sutis, como uma camisinha achada entre os pertences de Oren ou os olhares furtivos dos homens nos lugares que ele frequentava.

Mais trabalhado é o choque cultural experimentado por Thomas na Cidade Sagrada. Um alemão numa região judia, ele é segregado pela sociedade ao redor, num reverso da situação dos judeus nos anos pré-Hitler. Ao trabalhar no café e começar a fazer seus doces, Anat têm que mentir sobre a sua origem para que eles possam ser vendidos como kosher, isto é, aqueles que obedecem aos ditames alimentares do judaísmo.

Este é um grande dilema moral de um filme cheio deles. Anat aceita mentir sobre os doces para vendê-los porque eles são um sucesso e assim como se envolver com Thomas mesmo sabendo que isso desagrada seus pares e que seu luto não terminou. Thomas, por sua vez, se aproxima dela mesmo sabendo das potenciais consequências e da sua responsabilidade em ter se relacionado com o marido dela por anos. Por fim, o morto Oren aceitou viver uma vida dupla mesmo sabendo de sua latente sexualidade.

O filme pode fazer uma boa sessão dupla com “Yossi”, de Eytan Fox – outro filme israelita que lida com a devastação do luto após o fim de uma relação gay. A visão de Fox, apesar da melancolia, é muito mais camp e permite que o espectador veja possíveis luzes no fim do túnel. Graizer está mais interessado na confusão incessante da falta de respostas, da não conclusão, do silêncio. Como ilustrado em “The Cakemaker”, gays e héteros choram de maneira idêntica.