Você vai em um jantar com amigos. Tem certeza que vai se divertir, mas sabe que um deles vai falar de política, outro reclamar da vida amorosa, outro se esforçar para fazer os comentários mais inteligentes e, talvez, outro só esteja ali de corpo presente. A sensação de familiaridade é ótima e você se diverte, mas, também sabe que não pode cobrar grandes surpresas.

É com esse viés que Olivier Assayas entrega seu novo projeto, “Vidas Duplas”. Como o título dá a entender, o projeto carrega em si uma duplicidade, almejando ser tanto uma comédia sexual francesa sob medida para amantes do gênero quanto uma análise não menos divertida do mercado editorial contemporâneo e da relação entre as pessoas e as mídias sociais.

É um tema bem cabeça e é interessante que Assayas nem seja o único autor do cinema europeu a explorá-lo com uma pegada cômica recentemente (Michael Haneke fez o mesmo, ainda que de forma mais tímida, em seu “Happy End”).

Ambos partem da premissa que a tecnologia serve apenas como um catalisador para predisposições humanas já existentes. Diante do Instagram, Haneke e seu estilo devastador apostam em uma amplificação da apatia e sociopatia. Assayas, por sua vez, toca na nossa necessidade de aprovação e validação através de tuítes, por exemplo.

O calcanhar de Aquiles de “Vidas Duplas” não está em seu conteúdo, mas na forma: o longa tem pouquíssimo apelo para além dos fãs do cinema que emula diretamente o teatro. A França tem lá uma certa tradição nele e já ofereceu excelentes obras no estilo (“Deus da Carnificina“, de Roman Polanski, e “Medos Privados em Lugares Públicos”, de Alain Resnais, vêm à mente), mas, por mais que o roteiro se esforce, pouco do filme chega a surpreender.

O fato de que a parte da produção não dedicada a comentar como a digitalização afeta o mercado atual é um clássico conto de múltiplos adultérios não ajuda. Em resumo, Alain (Guillaume Canet) é casado com Selena (Juliette Binoche) e está no processo de recusar a publicação de um livro do escritor Léonard (Vincent Macaigne). Nesse ínterim, Léonard trai sua namorada tendo um caso com Selena, enquanto Alain resolve ter um caso com a nova funcionária de sua empresa.

As interações entre casais de amantes divertem, mas provocam uma sensação incômoda de déjà vu. Que tudo isso seja cortesia de Assayas, brilhante cineasta que passa por uma excelente fase, torna “Vidas Duplas” uma obra decididamente menor em sua filmografia. O filme diverte e interessa, como um beijo proibido, mas assim como este, o deixamos para trás com atroz facilidade.