Na sua essência, a história do curta A Menina do Guarda-Chuva é familiar. Nas cenas iniciais acompanhamos o protagonista, Raul, interpretado pelo ator Danilo Reis. Ele é um jovem que recentemente perdeu o pai – não sabemos como nem por que – e parece alheio ao mundo ao seu redor. Essa sensação é expressa visualmente pela opção do diretor do curta, Rafael Ramos, e do seu diretor de fotografia, de mostrar o mundo ligeiramente desfocado, segundo a ótica de Raul.

Ao buscar umas fotos que deixou para imprimir numa loja, ele encontra uma bela garota, vivida por Jéssica Amorim. Ela segura um guarda-chuva colorido e Raul acaba ficando com as fotos dela por engano. Ela então começa a fazer parte dos seus devaneios, até que enfim surge a oportunidade para eles se verem no mundo real.

Diz-se que a história do curta é familiar porque, no fundo, é a mesma de dezenas de outros filmes, de muitas comédias românticas e sucessos do cinema indie: é a história de um rapaz tímido e meio travado emocionalmente, que é despertado para a vida por uma garota bonita, incomum e idealizada. Não há nada de errado com essa abordagem, mas é verdade que essa noção tão familiar torna, em alguns momentos, A Menina do Guarda-Chuva um filme… fofo. Essa é a melhor expressão para descrever algumas cenas do filme.

Afinal, a montagem das fotos tiradas entre Raul e a Menina é um momento que deixa clara a aproximação de ambos e como a presença dela o modifica. Depois, o renovado interesse do protagonista pela vida é representado pelo momento no qual ele sai correndo em disparada pela rua e é acompanhado pela câmera num plano contínuo – a fotografia e a trilha sonora do curta são muito interessantes e ajudam a compor o clima onírico da experiência. O filme também usa eficazmente duas canções da banda Luneta Mágica, que se encaixam na narrativa.

Porém, em meio à sua história doce e quase romântica, o meio do filme apresenta algumas imagens assustadoras que refletem a fixação do protagonista pela morte, embora isso nunca seja realmente explicado. Um misterioso homem de preto aparecendo para o protagonista e uma cena com um ladrão armado se misturam à narrativa, expondo a perturbação de Raul. Essas cenas sugerem algo que talvez pudesse ser mais desenvolvido – de acordo com o próprio diretor, algumas cenas e narrações em off foram descartadas na montagem – mas de qualquer forma elas evitam que o curta se torne doce demais e dão um pouco mais de pungência ao dilema do protagonista.

O simples fato de essas cenas estarem no filme demonstra que a produção seguiu um processo muito intuitivo, nos quais as coisas pretendiam fazer sentido do ponto de vista emocional e não tanto intelectual. Essas experimentações se concluem com um grupo de palhaços aparecendo ao final, sem ter muito o que fazer na história. Ainda assim, outro momento com os palhaços sugere a ideia de morte: eles se detêm observando e brincando com uma caveirinha de plástico. A Menina do Guarda-Chuva é interessante justamente por contrapor uma história doce e até meio clichê com algumas imagens mais estranhas e potentes. Essa mistura parece acidental e por isso o filme não alcança mais. Ainda assim, é um curta com um elenco simpático e muito bem resolvido tecnicamente. Se esses dois aspectos tivessem se integrado melhor, com um propósito mais claro, a experiência poderia ser mais forte.

a menina do guarda-chuva rafael ramos