Três filmes e três consagrações no Amazonas Film Festival. Pensa que isso ilude Aldemar Matias? Pelo contrário! Entrevista ao Cine Set mostra diretor de “Anos de Luz” com visão crítica sobre o AFF e em busca de processo de amadurecimento na linguagem cinematográfica.

Cine Set: Qual vai ser o futuro do “Anos de Luz”? Você pretende inscrevê-lo em mais festivais? Quais? Vai disponibilizar na internet?

Aldemar Matias: O filme ficou pronto dias antes do fim da inscrição do Amazonas Film Festival. Só agora vou começar a inscrevê-lo em outros. Ainda não fiz o plano para definir quais exatamente. Na internet, estará disponível só em um ano após esse período de festivais.

Cine Set: O que te faz ter vontade de contar uma história para transformá-la em documentário? Como se inicia o processo de realização do filme?

Aldemar: A vontade vem quando encontro um personagem que me emociona e quero que o maior número possível de pessoas seja alcançado pela experiência que eu tive. E que, pela tela do cinema, essa experiência passe a ser delas também. E claro, que esse personagem sirva de instrumento para causar uma reflexão maior, além de sua própria história. Foi como começou “Anos de Luz”. Mas nem sempre foi assim.

“A Profecia de Elizon” foi gravado durante um terremoto. Minha casa começou a tremer e o instinto de uma vizinha foi correr, de outra foi chorar, o meu foi filmar. Não teve muito o que refletir.

“Parente” foi um documentário sob encomenda, recebi a missão de contar aquela história e me apaixonei pelo projeto.

Cine Set: Como cineasta, você sente que evoluiu de “A Profecia de Elizon” até “Anos de Luz? Em quais sentidos?

Aldemar: Sim, em todo e qualquer sentido. Segurança, domínio técnico, trato com o personagem, desapego na edição… Devo muito a EICTV de Cuba por isso. A única coisa que está presente desde “A Profecia” – e me policio para não perder  – é a intuição.

Cine Set: Você tem desejo de sair do campo do documentário e experimentar a ficção? Se sim, quais serão os desafios para isso acontecer?

Aldemar: Sair definitivamente, não. Experimentar, sim. Mas não acho que isso vá acontecer agora. Tem que ser uma transição orgânica. Não quero impor o formato, a história tem que pedir. Gosto muito dos filmes que passeiam entre ficção e documentário sem deixar um limite claro entre um e outro (“Iracema”, “Viajo porque preciso…”).

O maior desafio será a direção de atores. Não quero trabalhar com um elenco enquanto eu não estiver pronto pra transmitir toda a segurança que um ator precisa.

Cine Set: Todos os teus três documentários – “A Profecia de Elizon”, “Parente” e “Anos de Luz” – venceram o Amazonas Film Festival. Como você analisa a tua filmografia? O que você acha que os seus filmes despertam no público e crítica para conquistar tantos êxitos?

Aldemar: Minha filmografia representa bem meu processo de transição no audiovisual. “A Profecia” é muito livre, totalmente influenciado pelo meu ritmo de repórter de TV da época, 100% intuitivo. “Parente” marca o início de um conhecimento sobre cinema (tanto técnico quanto de narrativa).

Já “Anos de Luz” é cirúrgico! Perdi horas na ilha de edição pensando em deixar ou tirar três frames de uma cena. Também foi o primeiro trabalho com um cronograma bem rígido – duas semanas de investigação, uma semana de pré-produção, cinco dias de gravação, três dias de roteiro de edição, seis dias de edição de imagens, cinco dias de edição de som e mixagem.

Os anos trabalhando com TV me viciaram muito. Demorei para aceitar os silêncios que o documentário precisa. Por outro lado, foi a TV que me ensinou a não perder a conexão com o público. Mas é o cinema que me lembra que não se deve subestimá-lo.

Estou contente com meus resultados, mas, sem falsa modéstia, não estou produzindo nada genial. O que contribui com o sucesso no Amazonas Film Festival – e isso me dói dizer – é a baixa qualidade dos curtas amazonenses em competição. Quando se vê domínio técnico, não se vê um discurso potente. Quando se vê um diretor com algo mais contundente a dizer, falta conhecimento de estrutura narrativa. Ou falta linguagem de cinema mesmo.

Entendo a política da Secretaria de Cultura de dar mais espaço ao cinema amazonense. Mas não adianta dar visibilidade ao que não está pronto para ser visto. A categoria “Curta Amazonas” não pode se transformar numa mãe de filho mimado que faz vista grossa pras deficiências e aceita qualquer coisa. Não quero desrespeitar meus colegas. Quero que todo mundo cresça junto. Afinal, estou no mesmo barco. Mas a gente precisa de mais auto-crítica. 17 filmes selecionados? 11 prêmios distribuídos? Ainda não merecemos isso.