Nós, do Cine Set, sempre temos grande prazer em anunciar que há um novo filme amazonense na praça. Mas, assim como é ótimo poder saudar o lançamento de “ASSIM”, novo curta da inquieta e prolífica diretora Keila Serruya (Sardinhas em Lata), também é preciso admitir que a execução da obra põe a perder uma premissa instigante e corajosa.

Segundo Keila, “ASSIM” é a segunda parte de um projeto do Coletivo Difusão, núcleo independente de artistas e produtores culturais de Manaus, que se propõe a investigar a questão da transexualidade. Com o nome de “ASSIM AQUI”, o projeto teve início em 2010, com intervenções nas ruas da cidade. As pesquisas do grupo levaram Keila a conceber o curta como um breve estudo da rotina de duas travestis, “interpretadas” por Nayla Bianca e Patrícia Fonttine.

As aspas acima se referem ao enfoque documental do filme: Nayla e Patrícia são transexuais na vida real e apenas encenam as situações que vivem no seu dia-a-dia. A câmera se limita a segui-las de perto – tão de perto, aliás, que chega a ser invasivo, como ao mostrar o modo com as duas se portam no banheiro. Elas saem à rua; às vezes recebem um flerte; na maior parte do tempo, porém, precisam enfrentar a hostilidade dos transeuntes. O filme parte desse microcosmo de situações para fazer um retrato honesto e imparcial do que é ser um travesti – a solidão, o preconceito, a coragem, as pequenas alegrias. O problema é que o filme aposta num ritmo silencioso, reservado, quase “ausente”, como a enfatizar o distanciamento e objetividade da diretora. Essa abordagem seria útil se o que estivesse em jogo fosse um material excessivamente carregado ou melodramático. Com os pequenos incidentes diários das protagonistas, porém, o saldo é apenas indiferente. Algumas situações em potencial são abertas, mas ficam pelo caminho, como a reação delas às provocações na rua.

Uma pena que um filme com essa proposta não consiga ir mais longe. O engajamento e o talento de Keila são evidentes, como mostram o apuro na composição das imagens e no encadeamento dos planos – a sequência do supermercado é o melhor exemplo, ao ilustrar, em travellings sucessivos, o isolamento das protagonistas. Mas, para um produto realmente interessante, seria necessário mais do que um simples “olhar”, isento, como o que lança a diretora. Um exemplo, nem tão antigo, dessa abordagem menos reservada, sem temer o melodrama, é o documentário de Rafael Ramos, “Ali na Esquina”, lançado em 2008. Ao mostrar, através de entrevistas, a realidade das prostitutas transexuais, o filme provoca a empatia e a comoção que, justamente, faltam a este “ASSIM”.

keila serruya