Uma coisa bem complicada em cinema é tentar erguer um filme em torno de uma mensagem. Tentei encontrar um exemplo positivo – O Grande Ditador (1940), de Charles Chaplin, me vem à cabeça, mas a verdade é que o filme ficaria bem melhor sem aquele discurso solene do final –, que pudesse redimir os desastres de, digamos, Deus Não Está Morto (2014), A Reconquista (2000), ou tudo que as irmãs Wachowski vêm fazendo desde Matrix Reloaded (2003). Não consegui. Mesmo o brasileiro Tropa de Elite 2: O Inimigo Agora é Outro (2010) perde muito na comparação com o original, na sua ânsia de apontar o que há de errado com o país.

Fiquei pensando nisso enquanto assistia a Beleza Oculta, o novo filme do diretor David Frankel (O Diabo Veste Prada, Marley & Eu), com um elenco que reúne, entre outros, Will Smith (À Procura da Felicidade), Edward Norton (Clube da Luta), Kate Winslet (O Leitor), Helen Mirren (A Rainha) e Keira Knightley (série Piratas do Caribe) – e que, ainda assim, não consegue dar qualquer vigor à mistureba de autoajuda, esoterismo e dramas familiares do roteiro.

Howard Inlet (Smith) é um executivo à frente de uma grande agência de publicidade em Nova York. O segredo para o seu sucesso é a atenção que ele dedica às três grandes “Abstrações” da vida: Amor, Tempo e Morte. São esses conceitos, pontifica Howard, que dão sentido e urgência a todos os nossos momentos. Três anos depois, reencontramos o protagonista num estado catatônico, erguendo grandes filas de dominós por dias seguidos, só para derrubá-las e erguer de novo. Howard perdeu a filha pequena, e está mergulhado numa depressão profunda desde então. Num gesto de revolta, ele escreve cartas para o Amor, o Tempo e a Morte, onde desanca a todos pelo ocorrido (bem a propósito, um dos personagens o compara a uma criança escrevendo para Papai Noel). Eis, então, que seus melhores amigos e parceiros de agência, Whit (Norton), Claire (Winslet) e Simon (Michael Peña, de Homem-Formiga), têm a ideia de contratar um trio de atores para personificar as Abstrações (Knightley como o Amor, Jacob Latimore [Maze Runner: Correr ou Morrer], como o Tempo, e Mirren como a Morte), a fim confrontar Howard, e fazê-lo ou reagir ou abandonar de vez o comando da empresa.

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Se a premissa do filme já não parecia artificial e tola o bastante, o desenrolar dos acontecimentos, até o inacreditável final, faz de Beleza Oculta um trabalho difícil de justificar.  Nada no filme de Frankel soa verdadeiro – Norton e Winslet, com todos os respectivos talentos, parecem ter dificuldades em atravessar todas as platitudes dos diálogos (coisas do tipo “eu não senti amor. Eu era o amor”, que Norton diz a certa altura); Smith, com seu permanente muxoxo e o balançar da cabeça, a cada vez que a conselheira Madeleine (Naomie Harris, também de Piratas) pede que ele diga o nome da filha, provocou risadas da plateia na minha sessão; e Peña está apagado, sem conseguir despertar mais empatia como o infeliz e estoico Simon. Só Helen Mirren, na pele da espevitada Morte, traz alguma graça à produção, com seu figurino azul escandaloso e um refrescante (dir-se-ia necessário) tom irônico, que atenua a solenidade da coisa toda.

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Infelizmente, a tentativa do filme de apresentar ao espectador sua teoria de uma “beleza oculta”, inerente e ligada a todas as coisas, esbarra num receituário raso de crenças religiosas e pretensões filosóficas como conteúdo, e de soluções narrativas batidas e simplórias como forma. Os apelos de Frankel às lágrimas, explorados com habilidade diabólica em Marley & Eu, só agravam o resultado de um filme que, no fim das contas, não tem nada a oferecer ao espectador como experiência cinematográfica, que dirá como uma mensagem ou ideia capaz de intrigar. Ponto negativo sobretudo para Will Smith, produtor do filme, que há muito anda preocupado em estrelar apenas histórias edificantes, abafando o grande ator visto em Ali (2001), Eu Sou a Lenda (2007) e até mesmo À Procura da Felicidade (2006). Gaste melhor o seu tempo revendo o querido O Diabo Veste Prada – este sim um ótimo filme de Frankel.