No início do filme dos Simpsons, lançado em 2007, o personagem Homer se perguntava por que tanta gente estava dentro daquele cinema para ver algo que poderiam ver de graça em casa, na TV. E logo depois chamou a si mesmo e a todos os espectadores de “otários”, num exemplo do humor depreciativo do seriado que, ao ser transportado para o filme, não poupou nem a audiência. Pois é essa a sensação do espectador ao assistir Crô, uma péssima desculpa para filme que mostra o que acontece quando as egotrips de certos atores se unem com o dinheiro (aparentemente ilimitado) de uma grande produtora de cinema. Perdoem-me por ser um pouco mais pessoal que o habitual, mas eu me senti um otário, não de forma sarcástica como Homer, mas de verdade.

Este Crô e o filme de José Wilker Giovanni Improta (2013), lançado no inicio do ano, representam o ápice de certa vertente atual da produção cinematográfica brasileira: o das comédias da Globo Filmes com estética televisiva e estrelada por atores globais. Representam o ápice porque, além dessas características, ambos ainda são protagonizados por personagens que ficaram famosos em novelas da Rede Globo. Nunca cheguei a ver a novela da qual saiu o personagem Crô porque procuro fugir delas o máximo que posso – em minha opinião, novelas só não representam a pior forma de entretenimento televisivo porque algum “gênio” conseguiu criar algo ainda mais tolo e pernicioso nas últimas décadas, os reality shows.

Mesmo assim, me lembro de ter visto o ator Marcelo Serrado interpretando o Crô em algumas cenas, até mesmo porque parece ser impossível escapar totalmente do bombardeio de mídia da Rede Globo. Pois bem, no filme Crô está de volta… No início da “trama” escrita pelo autor de novelas Aguinaldo Silva, vemos o personagem tentando encontrar outras ocupações (cantor, cabeleireiro), mas após um sonho com a sua mãe e “Deusa”, percebe que sua vocação é mesmo ser mordomo e parte à procura de uma nova patroa. Ele acaba se deparando com Vanuza (Carolina Ferraz), que possui uma confecção construída com trabalho escravo.

Não há muito o que falar de Crô, e o pouco a se comentar só dá ideia do quão abismal é a experiência de assisti-lo. Todos os personagens são caricaturas rasas, especialmente o protagonista, o típico gay afetado de quem grande parte do publico brasileiro adora rir. A história tem o mau gosto de aliar o humor pastelão e tolo do personagem a algo sério como a escravidão. E a cada aparição de alguma celebridade (como a cantora Ivete Sangalo ou a apresentadora Ana Maria Braga), a cada aparição do merchandising intrusivo, a vontade de se afundar na poltrona domina o espectador.

No comando de Crô está o cineasta Bruno Barreto, um diretor que não merece ser levado a sério já que o próprio parece não se levar. Apesar de ser um cineasta completamente sem personalidade, Barreto já havia feito alguns bons filmes ao longo dos anos. Porém seu trabalho aqui se torna ainda mais imperdoável ao lembrarmos do seu bom e sensível Flores Raras (2013), lançado há alguns meses e que mostrava um caso de amor entre duas mulheres com sensibilidade e sem nenhuma ridicularização. Ir de Flores Raras para Crô é um absurdo tão grande que deixa claro como Barreto é um cineasta sem ambições e aparentemente aceita o que lhe aparece na frente.

Já quanto ao ator Marcelo Serrado, o outro grande responsável pelo filme, percebe-se que ele claramente se diverte com o personagem e até consegue transmitir um pouco dessa diversão para a plateia – em raríssimos, pouquíssimos momentos, como em algumas cenas com seu amigo Zoiudo (Alexandre Nero), e a química os dois atores é inegável. Mesmo assim, é incompreensível o apego dele por um personagem tão caricato – será que o apelo popular, “ser famoso” aos olhos da massa, é assim tão importante para certos intérpretes? Afinal, este filme só existe por causa de Serrado… Uma questão para refletir.

A mentalidade dominante em Hollywood hoje é o da franquia, é a de apostar na familiaridade para levar pessoas aos assentos dos cinemas. Por isso hoje em dia vemos tantas continuações, refilmagens, adaptações de best-sellers e de super-heróis de quadrinhos. Aqui no Brasil não temos isso. Não há interesse em refilmagens nem temos super-heróis para sustentar uma indústria. O que resta então, para uma produtora que visa o sucesso comercial acima de tudo? Apostar naquilo que as pessoas já conhecem, a estética televisiva. O problema de um filme como Crô é que, para atrair o publico, ele se contenta em levar para a tela grande apenas os piores vícios das novelas: a superficialidade, as caricaturas e os clichês. E essas coisas não fazem bom cinema.

NOTA: 1,0