Poucos dias depois de lançada, a proposta da Screening Room, iniciativa que pretende reinventar o modelo tradicional de janelas da indústria, divide Hollywood. Cineastas de renome manifestaram seu apoio ao novo serviço, que não encontrou o mesmo entusiasmo no setor de exibição. Pelo contrário. A Art House Convergence, organização que reúne exibidores de arte, divulgou uma carta pública conclamando estúdios a boicotar a empresa. E NATO, principal associação de donos de cinema dos Estados Unidos, também publicou um comunicado em tom cauteloso.

Em seu texto, a NATO reafirma a primazia dos cinemas para os produtos de Hollywood e diz que as decisões sobre janelas devem ser tomadas em comum acordo por distribuidores e exibidores, em vez de envolverem “terceiros”, numa clara referência à Screening Room. Mas deixa margem para que o tradicional hiato de 90 dias entre a estreia cinematográfica e em outras plataformas volte a ser discutido. “Modelos mais sofisticados de janelas podem ser necessários para a continuidade do sucesso da moderna indústria do cinema”, admite.

O modelo de negócios da Screening Room, start-up criada por Sean Parker (Napster, Facebook) e Prem Akkaraju (SFX Entertainment), prevê lançamentos simultâneos nos cinemas e no serviço de streaming premium, que exige do usuário uma taxa de US$ 150 para a instalação de um conversor e US$ 50 por conteúdo assistido. Os títulos ficariam disponíveis por 48 horas, e parte da renda gerada pelo aluguel (US$ 20 por filme) seria repassada aos exibidores parceiros.

Para que seu negócio ganhe força, Parker e Akkaraju precisam costurar um consenso difícil, que envolve distribuição e exibição, duas forças nem sempre harmônicas, e um sistema consagrado por décadas. Experiências semelhantes, como uma iniciativa da DirecTV de 2011, falharam ao enfrentar boicote dos donos de cinema. Estúdios como a Paramount têm ensaiado janelas encurtadas para lançamentos específicos, mas as principais cadeias dos EUA relutam em aderir com medo de prejudicar seu ganha-pão no longo prazo.

Disposição para encarar a missão não tem faltado aos dois sócios, que contrataram o advogado Skip Brittenham, veterano da indústria, e Jeff Blake, ex-conselheiro da Sony Pictures, para ajudar no lobby. Já percorreram da Filadélfia – onde se reuniram com o CEO da Comcast (controla a Universal), Brian Roberts – até a China, território da Dalian Wanda, dona da rede AMC. Os representantes da start-up asseguram que já contam com uma carta de intenções da exibidora, prestes a se tornar a maior do mundo depois da compra da Carmike.

Apoio de Spielberg e Scorsese

No time dos apoiadores, estão ainda cineastas e produtores de renome, como Steven Spielberg, Martin Scorsese, Peter Jackson e J.J. Abrams. Sócios na Imagine Entertainment, Ron Howard e Brian Grazer divulgaram um comunicado declarando sua simpatia ao projeto. “A Screening Room é a única solução que comporta todas as peças da indústria: exibidores, estúdios e diretores. O modelo é justo, equilibrado e oferece vantagem para toda a indústria que amamos”, diz um trecho.

Já a Art House Convergence, que tem sob seu guarda-chuva 600 cinemas, como a rede Drafthouse, publicou um texto pedindo aos distribuidores que não forneçam conteúdo para o serviço. Para os signatários, a iniciativa enfraqueceria a experiência da sala de exibição e criaria brechas para a pirataria. A organização ainda levanta dúvidas a viabilidade do modelo (leia o comunicado completo aqui).

Iniciativa envolve questão em alta

Apesar de polêmica, a redução das janelas é vista como um tema urgente para a indústria, cada vez mais concentrada em grandes blockbusters e com concorrência pesada de serviços voltados para a TV não linear como a Netflix. A questão é mais delicada no caso dos filmes de desempenho mediano, que fazem carreira curta nos multiplex e precisam hibernar por três meses até buscar outro chamariz de público em blu-ray ou video on demand. Em modelos como o Screening Room, os estúdios só precisariam gastar uma vez com o marketing do lançamento, que escorreria para as outras plataformas.

O tema promete esquentar os corredores do CinemaCon, em Las Vegas, entre os dias 11 e 14 de abril. A principal conferência da indústria é organizada pela NATO, que representa perfeitamente as dificuldades de consenso na exibição. A associação reúne os donos de nada menos que 32 mil salas em 50 estados americanos, além de representados em 81 países estrangeiros. “Em vez das palmadinhas no ombro, vai haver uma conversa séria sobre o estado do nosso negócio e o que estamos preparados ou não para fazer”, resumiu um executivo de estúdio ouvido pelo Deadline.

do site Filme B