Há algumas semanas, uma notícia causou espanto aos leitores do Cine Set. O cineasta e ator Clint Eastwood anunciou que apoiaria Donald Trump na corrida presidencial dos Estados Unidos. Para quem já conhece um pouco de Eastwood, não foi lá uma grande novidade. No entanto, o apoio massivo que os candidatos democratas sempre recebem de Hollywood acabam dando ao público uma falsa noção de que todos amam Obama e que Hilary Clinton é unanimidade – o que é bem distante da realidade.

Se aqui no Brasil temos uma divisão entre os Alexandres Frota da vida –  e o apoio deles a Michel Temer – e os Chico Buarques, pró-Dilma Rousseff, lá fora a situação não é muito diferente. Quem acompanhou as convenções dos partidos Democrata e Republicano, realizadas há pouco tempo, viu que entre os contrários a Trump há uma divisão bem grande – falarei mais sobre isso daqui a pouco.

Entre os apoiadores de Hilary que falaram ou se apresentaram nas convenções, estão Lena Dunham, America Ferrera (que fez uma bela defesa dos imigrantes latinos, tao condenados e ridicularizados por Trump), Katy Perry e Elizabeth Banks. Esta última chegou a dirigir um videoclipe com várias pessoas famosas cantando a chiclete ‘Fight Song’, de Rachel Platten, em homenagem à campanha da ex-senadora. A politizada e ‘ex-hanói’ Jane Fonda aparece no vídeo, pra se ter uma ideia.

A predominância feminina não é por acaso, afinal. Hilary pode se tornar a primeira mulher a comandar a autoproclamada ‘nação mais importante do mundo’. O papel dela ainda é questionado, visto que pesam acusações de corrupção e declarações a favor da intervenção militar – leia-se: guerra – no Iraque, após o ataque nas Torres Gêmeas lá em 2001.

Logo, ter estrelas de alta credibilidade na campanha conta e muito. A prova cabal disso foi que o ápice da campanha de celebridades, até o momento, foi o discurso proferido por Meryl Streep durante o mesmo evento que teve Dunham, Ferrera, Perry e Banks. Com um vestido que estampava a bandeira dos Estados Unidos, a atriz mostrou toda a sua eloquência ao defender a eleição de Clinton. Em sua fala, Streep comparou a candidata a mulheres admiradas pelos americanos,  como a abolicionista Harriet Trubman e outra ex-primeira-dama, Eleanor Roosevelt.

‘Vocês vão fazer história novamente em novembro, porque Hilary Clinton vai ser a nossa primeira presidenta. E ela vai ser uma grande presidenta. E ela vai ser a primeira de uma grande fila de mulheres – e homens – que servem com bravura e graça. Ela vai ser a primeira, mas não vai ser a última’, disse Streep, que chegou a se vestir de Trump em outra ocasião.

O outro lado
Competir com Streep é difícil, mas Trump parece nem ter tentado, já que sua convenção teve como oradores nomes como Antonio Sabato Jr. (conhecido pela novela ‘General Hospital’) e Scott Baio, que chegou a fazer fama nos anos 1970 com a série ‘Happy Days’, mais lembrada por ter revelado o hoje diretor Ron Howard.

Nem mesmo Eastwood – que anunciou o apoio após a convenção, é verdade, mas que já é um conhecido Republicano – participou do evento. Entre os apoiadores de Trump, figuram ainda Tila Tequila (uma estrela de reality shows da MTV), o belga Jean Claude Van Damme (?) e a ex-patricinha de Bervely Hills, Stacey Dash, que ganhou certa notoriedade – e até uma participação especial no Oscar – ao minimizar a polêmica da falta de atores negros na premiação (detalhe: ela é negra).

Mas Hilary não está tão ‘segura’ assim…

A falta de grandes nomes apoiando Trump poderia até deixar a Democrata respirando tranquila, mas esse não é o caso. Há ainda uma parcela grande de astros que veem com desconfiança a candidatura de Clinton. São eles os apoiadores de Bernie Sanders, senador que concorreu com Hilary à vaga pelo partido.

Susan Sarandon, Shailene Woodley, Rosario Dawson e Viggo Mortensen estão entre os adeptos da campanha ‘Bernie or bust’ (algo como ‘Bernie ou exploda’, em tradução livre). Sarandon chegou a participar da convenção que oficializou a campanha de Hilary e admitiu depois que ‘odiou’ toda a situação.

A crítica contra-ataca

Essa divisão ainda não teve grandes impactos em Hollywood – apesar das diferenças, a indústria sempre viu Democratas e Republicanos trabalhando ‘em paz’. No entanto, as redes sociais têm transformado a vida desses atores – seja pró-Hilary, pró-Trump ou pró-Bernie – em um inferno. Um dos casos de embate envolveu justamente uma crítica de cinema, a Sasha Stone, do Awards Watch.

Conhecida na blogosfera por suas opiniões fortes e por não aceitar contra-argumentos – não diga que ‘O Discurso do Rei’ era o melhor filme de 2010 ou que Jennifer Lawrence ‘é tudo isso’ -, Stone é do time ‘Hilary até morrer’ e chegou a dizer no Twitter que nunca mais falaria dos filmes de Susan Sarandon. As menções da crítica à atriz são constantes.

No dia 17 de julho, ela publicou em seu site uma carta aberta a Viggo Mortensen, onde pede para o ator ‘parar a loucura antes que seja tarde demais’. Em seu apelo, ela chega a comparar a ética de trabalho de Mortensen com as suas convicções políticas.

Veredito? Estamos à espera

Dizer que vai haver um boicote aos trabalhos de Sarandon, Eastwood ou Streep é como falar que Chico Buarque nunca mais vai vender um CD. O interessante vai ser ver como a arte vai responder ao atual momento político dos Estados Unidos.

No Brasil, já há quatro filmes em produção sobre o impeachment de Dilma Rousseff. É certo que uma indústria que não se fez de rogada ao produzir filmes exaltando e criticando as guerras do Vietnã, Golfo e Iraque e que tem liberdade o suficiente para fazer uma biografia do presidente atual (no caso, George W. Bush em ‘W.’) vai extrair ao máximo dessa atual situação. E nós, espectadores, ficaremos esperando. Sai que é sua, Oliver Stone!