2017 é um ano para entrar na história de várias formas e olha que nem chegamos ao seu final. Foi um ano com boas histórias para contar quando nos referimos ao cinema e o mesmo se estende ao retratar o Brasil. 2017 marca os 100 anos da história do cinema de animação brasileiro e para comemorar esse momento, o Cine SET entrevistou Maurício Squarisi, diretor do Núcleo de Cinema de Animação de Campinas.

Em 40 anos de atuação, o Núcleo de Cinema de Animação de Campinas já produziu em torno de 300 filmes sendo curtas, médias e longas-metragens divididos em filmes autorais – criação e realização dos diretores Wilson Lazaretti e Maurício Squarisi – e filmes realizados em oficinas, que possuem o duplo objetivo de produzir um filme e proporcionar aprendizado aos participantes. Nesse ano, dois filmes produzidos no Núcleo foram pré-selecionados para concorrerem a uma vaga na disputa pelo Oscar 2018, na categoria de Melhor Filme Estrangeiro.

Cine Set – Como surgiu o Núcleo de Cinema de Animação de Campinas?

Maurício Squarisi – Em 1975, Wal (Wilson Lazaretti) foi convidado por Léa Ziggiatti para dar aulas de cinema para crianças no Conservatório Carlos Gomes, em Campinas. Como as crianças queriam fazer desenho animado, ele começou a pesquisar em livros estrangeiros e visitar estúdios em São Paulo para montar o currículo desse curso.

Além das crianças, artistas de Campinas procuraram o Núcleo para experimentar sua arte em animação, foi o caso do poeta João Proteti, da ceramista Heloisa Alvin, do artista gráfico Maurício Squarisi e outros. A maioria desses artistas fazia alguns filmes experimentais e retornava à sua arte, Wilson Lazaretti e eu, Maurício Squarisi, permanecemos no Núcleo realizando filmes e desenvolvendo a didática das oficinas de animação.

Cine Set – Como funcionam as atividades do Núcleo?

No Núcleo realizamos filmes autorais (curtas-metragens e longas-metragens) e desenvolvemos oficinas de animação, geralmente o resultado das oficinas são curtas-metragens. Nestas oficinas, o grupo participante é autor do filme. Eles desenvolvem a criação, roteiro, grafismo, animação e trilha sonora sob orientação dos artistas do Núcleo. Nossa maior preocupação é estimular os alunos (crianças ou adultos) a encontrarem sua identidade gráfica, seu traço próprio.

Cine Set – Quais os principais projetos e produções do Núcleo?

Maurício Squarisi – Acho que, entre os projetos autorais seriam nossos longas-metragens “História antes de uma história”, roteiro e direção de Wilson Lazaretti e “Café – um dedo de prosa”, que foi roteirizado e dirigido por mim. Já, entre os filmes realizados em oficinas penso que seria “Çuikíri”, que realizamos na Amazônia, em São Gabriel da Cachoeira, com crianças indígenas em 1991.

Cine Set – Quais são os maiores desafios de desenvolver cinema de animação no Brasil?

Maurício Squarisi – Acho que, primeiro, é levantar recursos. Depois do filme pronto, no caso, principalmente de longa-metragem, é conseguir que o filme chegue ao público.

Cine Set – Como vocês enxergam a conquista de espaço que as animações brasileiras têm tomado nos últimos tempos?

Maurício Squarisi – Penso que é fruto do trabalho de gerações de animadores durante esses cem anos da animação brasileira. Por exemplo, os realizadores de longas-metragens mantém o mesmo empenho e dedicação que Anélio Latini quando realizou “Sinfonia Amazônica” em 1953, o primeiro longa-metragem de animação brasileiro. As séries, que estão chegando à televisão e os longas nos festivais e cinema mostram que o público quer ver animação brasileira.

Cine Set – O que os motiva a prosseguir no mercado de animação?

Maurício Squarisi – O que me motiva é muito mais a arte da animação do que o mercado. É a realização de projetos imagino que traz algo para que vai assistir, seja informação, seja cultura, seja emoção. E também a necessidade individual de se expressar artisticamente.

Cine Set – Como foi a produção do filme “Café, um dedo de prosa”?

Maurício Squarisi – Em 2009 eu tinha realizado cerca de 15 curtas-metragens autorais e grande parte deles tinha a “História” como tema. Por exemplo, tinha realizado “Nhô Tonico”, biografia de Carlos Gomes, “Os Hai-Kais do Príncipe” biografia de Guilherme de Almeida, “1.500” sobre a carta de Pero Vaz de Caminha, entre outros. O que me estimula é uma “história” que tenha um pouco a ver com minha vida pessoal.

No caso do “Café”, eu sou descendente de colonos que vieram da Itália para os cafezais do interior de São Paulo e buscava alguma forma de expressar isso através da animação. Depois de várias pesquisas, encontrei, em 2009, o livro “História do Café” de Ana Luiza Martins. Passei dois anos lendo, rabiscando, resumindo e roteirizando esse livro. Quando tinha  o primeiro story-board pronto, procurei a autora Ana Luiza Martins, mostrei a adaptação a ela (que gostou) e a convidei para prestar consultoria histórica ao projeto. Então, eu tinha uma segurança quanto ao rigor histórico do projeto e fiquei mais livre na criação para explorar o humor no texto, no desenho e nas músicas.

O convite ao músico e ator Wandi Doratiotto foi pelo talento musical e humorístico que ele traz desde o grupo “Premê” (Premeditando o Breque) até o “Castelo Ra-Tim-Bum”. O convite à atriz Vera Holtz foi pelo seu talento cênico e seu natural sotaque do interior paulista.

A produção ocorreu de 2009 a 2014. Utilizamos recursos financeiros do Proac (lei de incentivo estadual), o orçamento é bem baixo. Cerca de 90% da animação é realizada em papel, nas tradicionais pranchetas-de-luz.

Cine Set – Quais são os projetos que o Núcleo tem trabalhado atualmente?

Maurício Squarisi – Continuamos realizando oficinas e desenvolvendo novos projetos autorais de longas-metragens.

Cine Set – Conhecem algo da produção cinematográfica de animação amazonense?

Maurício Squarisi – Tivemos um contato com um grupo na Universidade Federal do Amazonas, mas, realmente, precisamos nos aproximar mais.