Em O Grande Gatsby, o publico é levado à época dos “loucos anos 20”, aquele período de efervescência econômica, social e artística da história americana. Era a época da explosão do jazz e da lei seca (que gerou o contrabando de bebida e a violência dos gangsteres), e tudo chegaria ao fim com a quebra da bolsa de valores de Nova York em 1929. O filme do diretor Baz Luhrmann capta, com a sua criatividade e extravagância habitual, a energia desse momento – mas se esquece de emocionar o espectador no processo.

A história é contada em flashback. Nick Carraway (vivido por Tobey Maguire) é o narrador, aspirante a escritor e corretor de ações. Num sanatório ele relembra, ao conversar com seu médico e escrever sua história, como chegou a se mudar para uma casinha em Long Island, uma propriedade vizinha à mansão do milionário Jay Gatsby (Leonardo DiCaprio). A mansão era visitada por convidados ilustres e palco das mais incríveis festas de Nova York. Gatsby e Carraway iniciam uma amizade, motivada pelo interesse do milionário: a prima de Carraway, Daisy (Carey Mulligan), foi o grande amor da vida de Gatsby e agora, cinco anos depois da separação do casal, ele planeja reconquistá-la. O problema é que a moça agora está casada com o bruto Tom Buchanan (Joel Edgerton), e este não pretende abandonar a esposa facilmente. A situação se complica quando Buchanan descobre fatos a respeito da origem da fortuna de Gatsby.

Baseado num clássico da literatura americana, escrito por F. Scott Fitzgerald, O Grande Gatsby é acima de tudo um espetáculo com a marca registrada de Baz Luhrmann. O filme até segue, aproximadamente, a mesma estrutura do maior sucesso do diretor, Moulin Rouge: Amor em Vermelho (2001): narrativa em flashback, um escritor como narrador, um amor impossível no centro da história… O diretor também segue à risca o estilo da obra anterior. Os numerosos zooms, feitos com auxílio de computação gráfica, transportam o espectador para dentro de mansão de Gatsby da mesma forma que os movimentos de câmera semelhantes faziam em Moulin Rouge. E a grande festa, cuja trilha sonora é repleta de hip-hop e covers de canções famosas, é um anacronismo musical típico do cineasta, que se esforça em dotar seus projetos de uma aura pop e divertida.

Baz Luhrmann é um diretor incapaz de fazer um filme pequeno, aparentemente. Por isso, suas narrativas sempre tendem para a grandiosidade – e desta para o exagero, basta um passo. Afinal, de que outra forma explicar as gigantescas cortinas presentes na cena de apresentação da personagem Daisy? Elas estão ali pelo estilo do cineasta, porque criariam um “visual incrível” para introduzir a personagem – e a lógica e a funcionalidade do ambiente podem se lixar. A metáfora da placa do oculista, outro elemento visual interessante representando os olhos que estariam observando os personagens, é repetida à exaustão – sutileza não é a praia do diretor. O melhor lance de direção criado por Luhrmann é a tomada mostrando um personagem morto visto pelo interior de uma piscina, uma referência ao clássico Crepúsculo dos Deuses (1951): é um mau sinal quando um dos mais belos momentos de um filme é uma referência explicita a outro. E porque o roteiro do filme obedece ao estilo, e não o contrário, os atores ocasionalmente se entregam a um histrionismo em suas performances. Ver DiCaprio se comportando de forma tola no seu encontro com Daisy é um momento embaraçoso para o ator, que se mostra caricato, e este é um exemplo até contido em comparação com a composição exagerada da atriz Isla Fisher. A melhor atuação do filme é a de Joel Edgerton, intenso e ameaçador como Buchanan.

O mesmo podia ser dito de Moulin Rouge, no entanto aquele filme funcionava porque conseguia emocionar o espectador. O Grande Gatsby não consegue. O tom frio da narrativa só é quebrado em alguns momentos, e o longa é muito superficial na caracterização dos seus personagens e dilemas. Afinal, nada explica o real interesse de Gatsby por Daisy, nem a busca por ascensão social por si só o justifica. A história até pode ser interpretada como um conto de amor entre dois homens – e a amizade entre Carraway e Gastby, surpreendentemente, funciona melhor que o romance aborrecido entre o ricaço e Daisy, o suposto centro da narrativa – mas o espectador não percebe, em momento algum, uma transformação no personagem de Tobey Maguire após testemunhar os eventos na vida do seu amigo. Sem essa transformação, o filme acaba não sendo mais do que um bonito, mas vazio, exercício de estilo. O público termina vendo um triângulo amoroso frio, sob a ótica de um narrador claramente apaixonado por um dos vértices do triângulo, e quando o filme pede ao espectador para se importar com o casal principal, isso se torna muito difícil.

No fim das contas, todas as atitudes de Gatsby na história são para impressionar Daisy. Assim, o personagem acaba sendo uma espécie de alter-ego do diretor Baz Luhrmann: toda a riqueza e beleza do universo apresentado na tela, com o objetivo de impressionar o público, terminam por esconder um vazio interior. É um filme de muito estilo e pouca substância: nesse sentido, se parece até demais com seu personagem-título.

Nota: 4,5