Sou apaixonado por futebol. Pela capacidade única do meu Botafogo sempre perder, consigo acompanhar o esporte com uma certa isenção e um olhar crítico. Tanta amor me faz recordar agora de um caso que considero singular: o lance do título do Corinthians no Mundial de Clubes de 2000.

Comandado por Oswaldo de Oliveira, o time paulista tinha um elenco impressionante: Edílson, Marcelinho Carioca, Ricardinho, Rincón, Gamarra e o ótimo goleiro Dida, protagonista do tal momento. O atacante e ídolo do Vasco, Edmundo, precisava converter a cobrança na decisão de pênaltis para empatar o confronto e seguir a disputa. Porém, o ‘Animal’ chutou longe e o Timão se sagrou campeão do mundo pela primeira vez. A imagem que ficou na minha memória não foi o erro do craque e sim a frieza do arqueiro que simplesmente andou para o meio do campo como se nada tivesse acontecido.

Pois bem, ao término de “O Necromante” lembrei de Dida: a frieza, falta de emoção versus a técnica e qualidade indiscutível.

Dirigido por Ricardo Manjaro, o curta-metragem conta a história de Nestor (Breno Castelo), um sujeito com o dom de entrar em contato com os mortos e extrair deles informações. Ele é chamado pela polícia para auxiliar na investigação da morte violenta de uma adolescente e acaba descobrindo como um crime hediondo aconteceu.

Para quem não conhece, Manjaro comandou  “A Última no Tambor”, disparado melhor filme do estado exibido no Amazonas Film Festival de 2012. Assim como na obra anterior, o cineasta mantém a pegada hollywoodiana na trama de suspense/policial acrescentando o tom sobrenatural. Com o auxílio da boa fotografia de Leandro Rezende que aposta no jogo de sombras e escuridão, além da edição de som precisa ao ilustrar cada leve movimento e trilha sonora mantida constante em tom moderado, a sensação de estranheza daquele ambiente prevalece, o que eleva o clima de tensão. Quase sem diálogos, a história ganha força à medida em que o mistério aumenta, assim se mantendo até a excelente sequência da floresta com portas inseridas em meio a uma construção abandonada, um achado visual e criativo.

Até este momento, “O Necromante” vai bem e consegue prender o espectador. Daí, por diante…

O grave problema do roteiro criado pelo próprio Manjaro é não conseguir construir bons personagens para que a história se desenvolva. Temos apenas caricaturas: a mocinha doce e delicada caminhando pela rua sem saber do trágico destino que lhe aguarda, o vilão com cara de ameaçador e o anti-herói justiceiro para vingar a maldade cometida. Para piorar, o diálogo final, composto de provocações baratas, palavrões feitos apenas para chocar e um eco grande, piora ainda mais o contexto e enfraquece a história, o que deixa o público sem qualquer reação com o destino deles. As atuações de Castelo, Diego Bauer (ele mesmo, nosso crítico do Cine Set) e Amanda Magavier são pouco inspiradas, o que pouco contribui para alguma ligação do espectador com o que se passa na tela.

“O Necromante” passa longe de ser um filme ruim, principalmente, pelo excelência técnica exibida ao longo dos 20 minutos. Porém, falha em conseguir construir unidades dramáticas capazes de nos levar a importar com os personagens.

Como Dida, a obra pode ser admirada pelo talento que possui, mas não será capaz de alimentar paixões ou idolatria.

NOTA:6,5