O Poderoso Chefão é uma ode sobre o patriarcado, a família e sobre a América. Seus diálogos e personagens o ajudaram a se tornar um dos melhores e mais queridos filmes americanos de todos os tempos.

O filme já começa com um apelo a Vito Corleone: um discurso forte de um pai implorando por “justiça”, pois sua filha sofreu violência. Em seguida, surge na tela a figura do Chefão, Marlon Brando, com sua peculiar e inesquecível interpretação do poderoso padrinho Corleone.

Dirigido por Francis Ford Coppola, O Poderoso Chefão nos apresenta a família Corleone, mostra seu poder, sua união e vai revelando o que ela é capaz de fazer em prol de seus interesses. Nota-se a força do personagem de Brando desde a primeira cena, e um gatinho sendo acariciado em seu colo nos faz pensar: quão complexo será esse personagem? O espectador vai descobrindo a riqueza de sua personalidade, e a dos demais personagens, aos poucos.

Don Corleone protege seus afilhados fazendo “ofertas irrecusáveis” a quem o contraria. É sério, forte, mas sensível também. Marlon Brando, que tinha uma notável expressividade, deu ao personagem a autoridade, o poder de ser temido e respeitado; e ele ainda conseguiu nos mostrar os sentimentos mais íntimos de Vito, relacionados a seu amor incondicional pelos membros de sua família. Sem dúvida, um personagem singular e rico, justamente por atingir o limite da ambiguidade.

Mas não é só Brando que merece aplausos pela sua atuação no filme. O Poderoso Chefão contou com os atores Al Pacino, James Caan e Robert Duvall (os três concorreram ao Oscar de melhor ator coadjuvante), Diane Keaton, e muitos outros que foram competentes por conseguirem transmitir de forma muito real os medos, as preocupações, a frieza, e os demais sentimentos de seus personagens.

Al Pacino fez Michael Corleone, o filho mais novo de Vito Corleone, e também o mais protegido. Ele esteve na Segunda Guerra Mundial e está fora dos negócios da família. Logo no começo do filme esclarece tudo à sua namorada, mas anuncia: – é minha família, não sou eu. Acredita-se nisso apenas até certo ponto do filme, porque quando sua família é atacada, ele se vê obrigado a protegê-la e a vingá-la. Aos poucos, Michael se torna o chefe da família Corleone.

Apesar de jovem e inexperiente (só havia feito dois filmes e um seriado de TV), Al Pacino foi muito convincente como Michael Corleone, um papel nada fácil de fazer, pois além de ser muito importante no filme (um coadjuvante que se torna principal), é complexo. Pacino foi assim: soube sensibilizar e chocar o público.

A última cena em que Vito e Michael conversam é essencial. Além de ser a despedida dos dois, mostra que até o fim Vito o aconselha sobre quem são seus inimigos e sobre como ele deve agir. A morte de Don Corleone também é memorável, pois ele não é assassinado, morre brincando com o neto, numa cena realmente bonita e cinematográfica, que reflete pela última vez o lado doce da personalidade do chefão, de forma simples.

Al Pacino em O Poderoso Chefão

Outro momento fundamental do filme acontece quando Michael assume de vez o papel de poderoso chefão, tornando-se padrinho do mais novo membro da família Corleone; e durante o batismo da criança (enquanto ele jura crer em Deus e renuncia às práticas do demônio), vários assassinatos orquestrados por ele acontecem. É uma cena forte e ousada, pois mostra de forma dura a hipocrisia da sociedade.

Michael mostra-se um perfeito chefão, tem tanta autoridade quanto o pai e age como ele. Mas é ainda mais frio e, ao contrário de Vito, não cumpre sua palavra para ir ainda mais longe pelos interesses dos Corleone.

Além da riqueza dos personagens e suas brilhantes atuações, o roteiro forte e inteligente, é um dos pontos mais admiráveis do filme, mas se você refletir, a simplicidade ajuda a torná-lo tão bom. Há vários diálogos e cenas memoráveis. Com audácia e grandiosidade, sequências como a da cabeça do cavalo na cama; os assassinatos cometidos por Sonny; as cenas que cruzam uma cerimônia religiosa (casamento, batismo, funeral) e a arquitetura de um novo crime são surpreendentes e depois, tornam-se inesquecíveis.

Coppola conseguiu transformar o romance de Mario Puzo numa espécie de ópera, em que reviravoltas impactantes acontecem nas vidas dos personagens. E mais, incluiu a cultura italiana num filme dos EUA, de forma belíssima, mesmo tendo que cumprir exigências da Indústria Hollywoodiana.

O diretor mostrou sua competência, ao trabalhar num único filme os estilos pulp e noir, e mostrar-se tão fluente ao tratar de dramas da sociedade. Repleta por jazz, piano, música italiana, a trilha sonora composta por Nino Rota contém o ar de mistério e suspense que o filme pede em muitos momentos. Já a fotografia do longa-metragem foi criada com todos os cuidados para trazer de volta os anos 40 e 50, e o resultado do trabalho de Gordon Willis é uma paisagem dourada e iluminada de cima para baixo. Aliás, vários filmes que vieram depois de O Poderoso Chefão repetiram a técnica.

Alguns detalhes do filme também são interessantes de serem analisados. O papel do cigarro, por exemplo: este símbolo fálico simboliza, quando aceso, que aquela pessoa detém o poder ou é apoiada, no momento. Há uma cena em que Luca Brasi está prestes a trair a família Corleone e acredita que esteja no comando, então ele pega o cigarro para ser aceso, mas antes que surja qualquer chama, seu inimigo o mata.

A função das mulheres, no filme, também pode ser analisada. Elas, naturalmente, não têm nenhum poder ou importância, já que o filme se trata do domínio masculino. Até mesmo a personagem de Diane Keaton, Kay Adams, que é inteligente e parece ter a consideração de Michael, é enganada por ele, porque segundo Coppola, as mulheres são passionais, e ignoram a realidade para viver numa bela fantasia.

Em 1974, Coppola deu sequência à história da família, de forma muito competente, em O Poderoso Chefão: Parte 2, na qual Robert De Niro fez o jovem Vito Corleone, e Michael é mostrado em 1959, ainda mais cruel.

A história se completa em O Poderoso Chefão: Parte 3 (1990), que se passa nos anos 70, com o herdeiro Corleone já envelhecido.

O Poderoso Chefão ganhou os prêmios Oscar de Melhor Filme, Roteiro e Melhor Ator, para Marlon Brando, que recusou o prêmio. O filme ainda concorreu ao prêmio em outras oito categorias. Acima de tudo, trata-se de uma obra irretocável e considerado por muitos, um dos melhores de todos os tempos. Mas há quem o critique acusando a obra de legitimar e glamorizar a máfia. Mas mesmo os personagens que mais agradam o público não são retratados como “bons” maus moços. Bem pelo contrário, a verdade nua e crua da sociedade está neles, é só enxergar além dos rostinhos bonitos.

The Godfather

NOTA: 10,0

Filmes de gângsteres antes e depois de “O Poderoso Chefão”

Entre 1930 e 1950, aconteceu o apogeu dos filmes sobre gângsteres; entre os principais desta época, está ScarfaceA Vergonha de Uma Nação (1932) e o noir Os Assassinos (1946).

Na época em que O Poderoso Chefão foi lançado, os filmes do gênero estavam em baixa, mas com o filme, ele voltou a fazer sucesso, e vários filmes foram lançados: Capone – O Gângster (1975); Scarface (1983); Os Intocáveis (1987); e os de Scorsese, Caminhos Perigosos (1973), Os Bons Companheiros (1990) e Os Infiltrados (2006).

Todos da mesma escola do filme de Coppola. Mas foi Sam Mendes quem trabalhou mesmo com a obra O Poderoso Chefão, sendo que em seu filme Estrada para a Perdição (2002), o drama do pai (Tom Hanks) tem início quando ele corta seus laços com a família, caminho inverso ao de Michael Corleone.

Curiosidades sobre “O Poderoso Chefão”:

– Michael, desconfiado e paranóico, é um retrato do ex-presidente americano Richard Nixon, afirmou Coppola.

– Marlon Brando precisou fazer teste para ser aceito no papel de Don Corleone. Coppola não gostou da exigência, e permitiu que Brando improvisasse as falas. O grande ator deu uma prévia do que faria no filme, enchendo as bochechas com enchimento (no filme, ele usou bolhas de resina) e empregando toda a sua longa experiência. O ator venceu o prêmio de Melhor Ator, mas não aceitou, mandando uma falsa índia no seu lugar, para ler um discurso contra a política anti-indígena americana.

– Al Pacino foi escolhido para o papel depois de representar a contento na famosa cena em que Michael deve executar os traidores num restaurante. Aliás, essa é uma das melhores cenas dele no filme, a tensão do ainda bom rapaz passa para o expectador, que precisa segurar-se na cadeira.

– Americanos de origem italiana protestaram por difamação, mas foram vencidos pela popularidade imensa do filme.

– Sofia Coppola, filha do diretor, participou do filme como o bebê batizado. Quando cresceu também se tornou diretora de cinema.