Conhecido por ser integrante da trupe de humor inglesa Monty Python, Terry Gilliam traz uma carreira como cineasta marcada pela estranheza. “Brazil – O Filme”, “Os 12 Macacos”, “Medo e Delírio” e “O Mundo Imaginário do Dr. Parnassus” são obras nada convencionais de histórias incomuns com foco em questões existenciais dentro de um mundo longe da realidade. As composições visuais se destacam e o roteiro sempre se mostra mais complexo do que aparenta ser. “O Teorema Zero” traz boa parte desses ingredientes distribuídos de maneira irregular durante 107 minutos.

Insatisfeito com o trabalho e à espera de uma suposta importante ligação, Qohen Leth (Christoph Waltz) tenta desesperadamente fazer o trabalho de processador de entidades da própria residência. O pedido acaba sendo atendido, porém, o Gerente (Matt Damon) passa a missão de que ele desvende o “Teorema Zero”, mistério capaz de revelar o sentido da vida. Porém, a situação sai do controle e Leth surta contando com a ajuda do filho do chefe, de uma prostituta e uma terapeuta virtual.

Clássico livro de George Orwell, “1984” serve como base para a construção do mundo de “O Teorema Zero”. Desde grandes cartazes com a imagem do Gerente espalhadas pela cidade à presença das câmeras de vídeo por todos os cantos para monitorar os cidadãos, o filme retrata uma sociedade dominada pela falta de diálogo, exploração humana no trabalho, repleta de proibições e traços decadentes escondidos por uma publicidade intrusiva. Leth acaba sendo o retrato dessa realidade em ruínas agarrado a uma esperança esdrúxula de felicidade. Christoph Waltz irreconhecível – careca e sem sobrancelhas – prestes a ficar louco acentuam quão pesado é aquela existência vazia. Encontrar algum sentido da vida para aquela sociedade se torna algo crucial para saber se vale a pena aquela miséria e infelicidade (e por que não à nossa mesmo?).

Os choques propostos pelo roteiro de Pat Rushin em relação à religião são outro atrativo à parte. A casa do protagonista ser uma igreja abandonada enquanto este pesquisa sobre a nossa existência trazem a ironia refinada do Monty Python. Isso para não falar dos ratos surgidos de cada buraco do local. Para completar, Gilliam não teme reações adversas ao instalar uma câmera no lugar da cabeça de Jesus Cristo e trazer elementos que relacionem a invasão feita por religiosos na vida das pessoas com o mesmo do Gerente e o domínio sobre Leth.

Tantas analogias sobre o mundo atual e religião se perdem na confusão que a trama acaba se tornando. Por mais que Waltz se destaque e as aparições de Tilda Swinton e Matt Damon sejam excelentes, o lado emocional de “O Teorema Zero” fica subjugado a um plano inferior. O envolvimento do protagonista com o filho do chefe e a prostituta busca retomar esse aspecto, porém, as situações surgem forçadas e apelam para um sentimentalismo barato. Gilliam parece perceber isso a tal ponto que perde a mão de vez ao incluir a batida “Creep”, música clássica do Radiohead, para embalar diversos trechos da trama.

Terry Gilliam volta a se mostrar um sujeito sagaz na habilidade de ter boas sacadas sobre o mundo moderno aliado caprichos visuais de direção de arte e figurino. Falta emoção e a capacidade de ser objetivo em muitos momentos. “O Teorema Zero” esbarra nesse problema e acaba sendo uma obra incompleta.

A sensação de estranheza, porém, o diretor continua deixando no público.

NOTA: 6,0