Depois de um ano atribulado, mas vitorioso em projetos e reconhecimento, a Artrupe Produções Artísticas, coletivo manauara de produtores culturais, promete diversificar ainda mais as atividades em 2016 – o que inclui novos projetos de curtas, em esquemas cada vez mais profissionais de produção.

Depois de lançar apenas um filme no ano passado, No Céu da Boca Cresceu Saturno”, de Francis Madson (que não é membro do coletivo, mas fez o filme em parceria com seus integrantes), além do videoclipe de “Lulu”, da banda manauara Luneta Mágica, a Artrupe prepara agora o lançamento de dois novos projetos: Aquela Estrada, de Rafael Ramos, gravado no início de 2015, e O Tempo Passa, de Diego Bauer, filmado em dezembro.

O primeiro, depois de um longo processo de pós-produção, finalmente foi dado como pronto. Continuando a busca por um tipo de cinema mais orgânico, menos atrelado aos ditames narrativos tradicionais, vista em A Segunda Balada (2012) e A Menina do Guarda-Chuva (2014), Estrada pode ser considerado o projeto mais radical de Rafael Ramos até aqui. O roteiro inicial, escrito em 2014, foi revisto várias vezes, até ser descartado em definitivo durante as filmagens, levando o cineasta e seu elenco a desenvolverem a premissa básica – a amizade entre os protagonistas, vividos por Danilo Reis e Rafael César – a partir de ideias e discussões sobre os personagens e situações. Segundo César Nogueira, diretor de fotografia e montador do curta, a obra vem sendo inscrita em festivais de cinema e deve estrear em Manaus – e ficar disponível no Vimeo – no mês de julho.

O Tempo Passa, de Diego Bauer, entrou neste mês na fase de pós-produção. Vencedor de um edital da Manauscult em 2014, o filme igualmente amplia as discussões existenciais vistas na obra anterior do cineasta – no caso, O Que Eu Não te Disse (2014), escrito e protagonizado pela atriz Jéssica Amorim, colaboradora frequente da trupe. Dando um novo passo em qualidade e profissionalismo da produção – que, a despeito dos resultados alcançados pelo grupo, vinham sendo tocadas de maneira independente, com dinheiro dos próprios artistas –, o curta não só utilizou o apoio financeiro do edital, como foi colocado para financiamento no site de crowdfunding Catarse, a fim de elevar o resultado final para o nível de qualidade almejado por Diego.

“Nós esperamos conseguir fundos suficientes até junho, para dar ao filme a ‘cara’ exata que a história pede. Passei o último mês, desde o fim das filmagens, envolvido com a relização de uma peça ao lado do Madson (Obevandiva, com Bauer, Danilo e Victor Kaleb, que estreia no próximo dia 11 de fevereiro) e agora posso me dedicar à montagem e finalização do Tempo. Com esse trabalho nos redescobrimos como artistas, perdemos a certeza de muitas coisas, e só por isso ele já valeu a pena. Mas ainda assim, acredito que realizamos algo forte, verdadeiro, que envolveu uma dedicação enorme de dezenas de pessoas, e com um resultado bastante promissor. Estou certo de que o trabalho trará luz a uma discussão importante para nossa sociedade, e isso nos deixa muito estimulados para essa jornada que será a pós-produção”, explica.

Por “discussão importante”, Diego refere-se à questão central da trama: o estupro de um menino e suas consequências na vida adulta, fugindo a soluções simplistas e à definição fácil de seus efeitos. Uma premissa polêmica, sem dúvida, mas que marca a aproximação corajosa de um realizador amazonense com um tipo de tema que, por sua gravidade e complexidade, dificilmente é abordado em qualquer forma de arte. O Tempo Passa tem previsão de ficar pronto no segundo semestre de 2016.


Novos filmes

E não pára por aí. Segundo César Nogueira, novos projetos já vêm sendo discutidos pelos integrantes, e ele próprio parte em março para São Paulo, a fim de estudar fotografia na escola Inspiratorium. “Já estamos elaborando novos argumentos e roteiros, aos quais pretendemos nos dedicar na segunda metade do ano, quando vamos entregar os trabalhos vencedores dos editais da Manauscult”.

Trabalhos, por sinal, que marcam a conquista de um novo espaço para a Artrupe, que aos poucos vai se firmando como referência para o cenário cultural amazonense. Entre espetáculos de dança e teatro, shows e filmes, oficinas e exposições, os rapazes e moças do coletivo mostram que há, sim, efervescência cultural no estado, mesmo com o cancelamento de importantes festivais e raros projetos de incentivo.

O tempo passa – mas a estrada da Artrupe só fica maior e mais promissora.