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Japão – O Segredo das Águas

A morte de um homem encontrado boiando no mar da ilha japonesa de Amami-Oshima dá o ponto de partida para a jornada de dois adolescentes na descoberta do ciclo de chegadas e partidas da vida no belo “O Segredo das Águas”. Dirigido por Naomi Kawase, filme transmite através de referências com a natureza as etapas para a complexidade do desenvolvimento dos protagonistas.

“O Segredo das Águas” se coloca como um grande desafio para o espectador acostumado com o ritmo do cinema de Hollywood e da própria vida: diferente da rapidez cotidiana de nossos tempos, Kawase aposta em uma narrativa contemplativa, cadenciada e envolta de silêncios para ir revelando os dramas daquelas pessoas. Caso consiga entrar no clima do filme, público se vê recompensado com momentos em que a beleza se mistura com o sofrimento, em especial, na sequência decisiva para a mãe de Kyoko e na conversa entre o senhor mais velho da região com os dois garotos.

A essência de “O Segredo das Águas”, acima de tudo, está no mar. Simbolizando a força da vida com toda a beleza, vastidão e, ao mesmo tempo, perigo, se aventurar nele pode servir como experiência enriquecedora e única. Um filme para ser visto, ouvido e sentido.

NOTA: 7,5


belle Gugu Mbatha-Raw amma asante

Reino Unido – Belle

Há uma constante tentativa de se sabotar “Belle” ao longo dos 104 minutos de duração. Desde o uso excessivo da trilha sonora passando pela presença de personagens maniqueístas ao extremo (o irmão do pretendente a noivo da protagonista, por exemplo, lembra vilão de novela das 6 pelas caras e bocas de malvadão) até um romance impossível digno de Jane Austen dos piores momentos quase faz o filme dirigido por Amma Asante ir para o buraco.

“Belle”, entretanto, sobrevive a cada sabotagem pela excelente história baseada em fatos reais. O inusitado fato do mais importante juiz britânico na era colonial ter uma sobrinha negra e julgar um abusivo caso de morte de dezenas de escravos por comerciantes em busca do seguro dessas “mercadorias” cria uma série de vertentes possíveis dentro da trama. O contexto de fragilidade social em que a protagonista se insere como uma espécie de commodity seja pela cor da pele ou por ser mulher em uma época que a única função desta era arranjar um bom marido são explorados à perfeição pelo roteiro de Misan Sagay.

Com uma ótima direção de arte e belos figurinos, “Belle” ainda revela o talento da excelente atriz Gugu Mbatha-Raw e traz o sempre ótimo Tom Wilkinson. Se tivesse tintas menos fortes no melodrama, seria uma filme brilhante.

NOTA: 7,0


o libertador venezuela simon bolivar

Venezuela – O Libertador

Para quem usa o termo bolivariano sem saber direito o que significa, “O Libertador” ajuda a tirar a dúvida. Projeto pré-selecionado ao Oscar deste ano na categoria de Melhor Filme Estrangeiro traz a história de vida do líder político Simón Bolívar, responsável por tirar Bolívia, Venezuela, Colômbia, Equador, Peru e Panamá do comando da Espanha no século XIX.

Chega a ser irônico perceber que o filme de um sujeito contrário às atitudes imperialistas tenha mais semelhança com o cinema americano do que o produzido na América Latina. “O Libertador” procura mitificar a figura de Simón Bolívar com um sujeito amoroso, atencioso com todos, idealista, sonhador, íntegro e mobilizador de grandes multidões. Não que isso não fosse verdade, porém, a ausência de nuances no personagem provoca incômodo constante no sentido de ser uma espécie de biografia autorizada em que tudo fica nos moldes do retratado sem a presença de possíveis inconvenientes. Os primeiros 30 minutos do longa vão ao cúmulo disso com o romance açucarado do protagonista com a esposa repleta de cenas com o casal no campo correndo um atrás do outro.

A própria condução sem grandes ousadias estéticas/narrativas fazem de “O Libertador” uma cinebiografia para lá de convencional nos moldes de “O Jogo da Imitação”. O filme somente não se torna um desastre pela própria história de Simón Bolívar ser rica e capaz de trazer inúmeras reviravoltas, impedindo a produção de se tornar desinteressante. Destaque ainda para a belas tomadas panorâmicas da região por onde o filme passa raras de serem vistas nos projetos exibidos na América Latina com tamanha dimensão.

Qualidades técnicas e dimensão épica à parte, o convencionalismo de “O Libertador” transforma o filme em um projeto insosso sem conseguir chegar à altura da figura de Simón Bolívar.

NOTA: 6,0