Séries sempre fizeram sucesso entre o grande público. Das mais longínquas, que hoje em dia passam no TCM até as mais recentes, elas sempre tiveram seguidores fiéis ao redor do mundo e títulos de maiores expressão tornam-se verdadeiras religiões para muita gente.

Até pouco tempo atrás, isso não interferia muito no mundo do cinema, pois havia um pensamento de que cada um ocupava uma função diferente do outro e os dois podiam viver juntos sem nenhum problema. Além disso, não havia a necessidade de que uma parte “invadisse” o território do colega.

Porém, de uns anos pra cá, é notória a crescente falta de criatividade que vem atacando Hollywood. Salvando-se poucas exceções, os grandes lançamentos do cinema nos últimos anos são realizados através de fórmulas matemáticas estudadas a exaustão para saber o que vai ser sucesso de público e o que não o agradaria, fazendo com que todas as decisões do filme fossem tomadas com esse fim. Tal situação ignora qualquer possibilidade de se realizar algo por seu valor artístico, apenas tentando encontrar uma maneira qualquer desse elemento ser inserido no trabalho.

Além disso, é raro encontrar trabalhos novos em Hollywood. As maiores bilheterias dos últimos anos são todas frutos de continuações de franquias já estabelecidas, remakes sem a menor razão de existir e encontros ressuscitados de ídolos de ação do passado que retornam tentando voltar a encantar os machões deslumbrados.

Algo genuinamente novo, inédito, criativo é algo que se precisa procurar bastante pra encontrar.

O que nos leva às séries, que vivem momento oposto ao dos grandes lançamentos, regularmente se reinventando, e investindo em linguagens cada vez mais instigantes e criativas, sem mostrar pudor em experimentar diferentes mecanismos de desenvolvimento de narrativa.

Só nos últimos anos temos sucessos de público e crítica como Lost, Breaking Bad, 24 Horas, Boardwalk Empire, Os Sopranos, Mad Men, House, CSI, The Walking Dead, Homeland, House Of Cards, How I Met Your Mother, 30 Rock, The Big Bang Theory, Parks and Recreation, Modern Family, etc.

Séries de diferentes linguagens e temas, tramas distintas, com diversas abordagens e pontos de vista, mas tendo em comum a maturidade de suas tramas e personagens, e a criatividade para desenvolver tudo isso.

Por terem mais tempo de duração do que um filme, as situações podem ser desenvolvidas com mais calma, dilatando mais vários pontos da trama, o que não seria possível num filme de uma hora e quarenta. O que também contribui para a criação dos personagens, que na grande maioria dos casos são extremamente interessantes de acompanhar, com vários lados, desenvolvidos com maior complexidade sendo, muitas vezes, anti-heróis cheios de ambiguidades e conflitos morais, diferentes dos mocinhos maniqueístas que vemos com frequência nas telonas.

Além disso, as tramas estão cada vez mais corajosas, colocando o dedo na ferida, com menos vícios, menos expositivas e mais desafiadoras para os seus telespectadores.

E, veja bem, tudo isso ainda pensando na audiência, claro.

Afinal de contas, não é nenhum pecado ter sucesso de público, buscar alcançar o maior número possível de pessoas e ganhar muito, muito dinheiro. Mas o ponto da questão é que está bem claro que não se precisa fazer um material pobre, óbvio, apoiado em conceitos gastos e pouco corajosos para conseguir tal feito, e as séries mostram isso de maneira categórica.

O fenômeno também acontece no Brasil, com o cinema comercial cada vez mais asfixiado pelas comédias novelescas da Globo Filmes, enquanto que as séries seguem caminho diferentes.

Aliás, justiça seja feita, há de se reconhecer que a Globo sempre desenvolveu minisséries excepcionais. Parece que tudo o que ela tem receio de experimentar nas suas novelas, investe sem medo nesse formato que rendeu trabalhos memoráveis como Os Normais, Queridos Amigos, Maysa, Presença de Anita, Os Maias, Sexo Frágil, Comédia da Vida Privada e tantos outros trabalhos. Soma-se a isso, dois recentes trabalhos como Sessão de Terapia e a ótima série produzida pela MTV, A Menina Sem Qualidades.

É claro que existem exceções, claro que tem séries péssimas surgindo todo mês, assim como tem filmes de grandes estúdios bem melhores que muitas séries. Mas o fato é que esta cada vez mais claro que a balança está pesando cada vez mais contra os filmes, e se formos ter como parâmetro o que está planejado para o cinema nos próximos anos, com todas as continuações e remakes já engatilhados, esse cenário promete ficar ainda mais desigual.