A Amazônia sempre foi um reduto de curiosidade humana. Desde o início das grandes navegações, o novo continente atrai olhares que vão desde a admiração, cobiça até o espanto do que se pode encontrar em terras amazônicas. Assim, “Z – A Cidade Perdida” do trágico James Gray revive na tela grande o drama de Percy Fawcett (Charlie Hunnam), um explorador britânico que se aventurou na fronteira entre Brasil e Bolívia em busca de uma civilização perdida.

Gray se apoiou no livro de David Grann para construir seu roteiro. A princípio a sinopse da obra pode nos guiar a ideia de um novo Indiana Jones, entretanto a construção fílmica é bem diferente da realizada por Spielberg. O filme caminha a passos lentos, sofrendo até um pouco com o ritmo que lhe é imposto. A história é baseada em fatos reais. Fawcett era um militar, que tinha uma verdadeira paixão pela arqueologia e acreditava piamente que houvesse vestígios de uma civilização perdida nas florestas amazônicas. Apoiado pelo sindicato dos jornalistas americanos e tendo como patrocinador Rockefeller, enveredou pela floresta amazônica, na altura do Mato Grosso com seu filho Jack e Raleigh Rimell e nunca mais foi visto. Acredita-se que ele tenha encontrado seu fim em alguma tribo indígena ou, para os mais místicos, tenha chego a sua civilização perdida e não voltado mais. Em todo caso, Gray constrói a narrativa fagulhada na visão otimista de Fawcett.

O que pode incomodar na obra é uma propensa falta de vieses nas personagens. Todos estão ali representando um ponto importante no capítulo de vida do personagem central, que também apresenta pouca profundidade. Embora, no início da projeção acompanhe-se certa inquietação de Fawcett pela condição que seu histórico o condicionou na Inglaterra, Hunnam consegue encontrar um equilíbrio entre a ambição exploratória de reconhecimento da personagem e seus conflitos interiorizados. O que é vital para a trama que se fundamenta em cima da narrativa do explorador, sendo guiada intermitentemente pelas decisões que ele toma e as principais pessoas envolvidas com estas. Talvez este seja o motivo pelo qual embora os personagens pareçam ser unilaterais, eles também são complexos para que a história se desenvolva. Pattinson, cada vez mais maduro em suas atuações, e Ashley funcionam como parceiros de expedição. Mesmo que não se saiba nada sobre eles, a não ser a dualidade de posicionamento que apresentam, o espectador consegue acompanhar a importância deles na narrativa e torcer pelo progresso das personagens.

Resultado de imagem para the lost city of z movie

Mas tudo isso cria o ambiente para o que acontece durante a ausência de Fawcett, ai é quando Sienna Miller é exaltada no papel da esposa que leva sozinha a criação dos filhos, a vida familiar e social durante a não permanência do marido. É sobre ela que recai o peso trágico das escolhas dele sem ser reconhecida por isso, nem mesmo por ele. Gray consegue dar o ar de independência e feminismo a personagem, mesmo em uma época que essas características pouco proliferariam. Nina Fawcett representa uma classe de mulheres que até hoje persistem, mas que na época entre guerras era bem mais presente, além de apresentar a luta da mulher pela emancipação e independência. Entretanto alguns diálogos dela com o esposo chegam a doer os ouvidos de quem realmente presa pela luta da emancipação feminina.

Um aspecto interessante na construção audiovisual é a fotografia. A posição do sol nos enquadramentos de Fawcett em Londres é espetacular, dando a impressão de ser luz natural em horários apropriados de iluminação solar para fotografar e dar o tom cálido que o filme emite. Ele está constantemente em posição diagonal a luz, dando um ar de esperança e otimismo a personagem, o que não difere da maneira como ele enxerga sua exploração amazônica. A cada retorno da personagem de sua exploração a família, os enquadramentos variam demonstrando o distanciamento e a diferença que há entre os personagens, mesmo que estejam lado a lado, dividindo o mesmo quadro, a fotografia consegue os distanciar e provocar no espectador o clima de desencontro que há em Fawcett de volta ao lar.

O filme consegue ir além de sua narrativa principal e tecer críticas à sociedade da época, que ainda são pertinentes hoje. A própria escolha fotográfica de distanciamento familiar e o desdobramento irreconhecido da esposa apontam para isso. A arrogância e prepotência dos britânicos em negar a possibilidade de haver grandes civilizações fora de seu perímetro ainda inexploradas quase impedem o crescimento do desenvolvimento do conhecimento geográfico amazônico. Claro, que pela perca de ritmo e os 140 minutos impostos de projeção, algumas críticas tornam-se excessivas e pouco coerentes de acordo com a época em que o contexto narrativo se arma.

Entretanto, acredito que o filme poderia abordar melhor a questão do relacionamento familiar. Do drama que as escolhas de Fawcett acarretaram a sua família. Há um pequeno gancho do filho mais velho, Jack, com o pai, que tenta segurar o arco final, mas é mal construído se observado o retrospecto da obra, Tom Holland tem um bom desempenho, mas a construção do arco é falha e esse drama familiar teria capacidade para alavancar o filme por si só.

A impressão que se tem quando os créditos sobem é que se acompanhou a busca de um homem por emoldurar sua grandeza e glória na parede de sua casa, a qualquer custo. Ao mesmo tempo em que se contemplou um lado positivo da exploração amazônica, já que seu explorador procurava abraçar as comunidades indígenas como suas. Algo poético para o engendramento audiovisual, mas não tão aplicável quando observada sua biografia do explorador britânico. Gray consegue construir um filme cuja dualidade espacial, fotográfica e de personagens é seu principal ponto a favor.