Pode parecer absurdo que um filme vigoroso de 76 minutos ouse ser intitulado “About Endlessness” (“Sobre o Infinito”, em tradução literal). Sendo este um filme de Roy Andersson (“Um Pombo Pousou num Galho Refletindo sobre a Existência”), alguém poderia ser perdoado por pensar nisso como uma piada. Desta vez, no entanto, o impassível mestre sueco muda de marcha e desafia o público com seu retrato mais nítido da condição humana. É um canto de cisne agridoce de um dos grandes diretores do cinema.
Estilisticamente, “About Endlessness” parece uma peça integrante da Trilogia do Ser Humano do cineasta – composta por “Canções do Segundo Andar”, “Vocês, os Vivos” e “Um Pombo Pousou num Galho Refletindo sobre a Existência”, premiado com o Leão de Ouro no Festival de Veneza, em 2014 – e os fãs reconhecerão seu estilo idiossincrático desde o início. Andersson estava claramente decidido a fazer algo diferente, porém, incorporando uma narração que orienta o espectador através de emendas aleatórias da vida à maneira do clássico “As Mil e uma Noites”. Como um ser místico, os descreve como sonhos rememorados ou memórias retiradas do nada.
JUSTAPOSIÇÕES CHOCANTES
À princípio, surge uma procissão de personagens, profundamente marcados por algo que lhes falta. Um menino sem amor, um gerente de comunicação sem vergonha, um homem sem confiança e, principalmente, um padre sem fé. A cena em que este último vai a um psiquiatra em busca de ajuda é puro ouro cinematográfico e uma das melhores da carreira de Andersson.
No meio de “About Endlessness”, o foco muda e as coisas ficam mais sombrias, com a morte – e a reação dos personagens a ela – sendo o assunto de muitas cenas. Aos olhos do cineasta, é uma parte da vida como qualquer outra coisa e aumenta sua beleza e terror.
Isso permite algumas justaposições chocantes – a mais extrema das quais acontece por volta dos 47 minutos, quando uma cena focada em uma mulher cujos saltos quebraram corta um assassinato familiar – um homem soluçando, abraçando um cadáver ensanguentado. “Vi um homem que queria proteger a honra da família”, continua o narrador, “e mudou de ideia”. Por alguns minutos, é impossível sentir nada além de um coração partido.
TODAS AS DORES E ALEGRIAS DO MUNDO
Se você está pensando que nada disso parece material adequado para a comédia, você não está exatamente errado. Andersson reduziu consideravelmente suas tendências surrealistas aqui. Não há maquiagem bizarra e, mesmo quando satiriza uma das figuras históricas mais desprezíveis de todos os tempos, o diretor o faz em tom melancólico. Essas histórias demasiadamente humanas transcorrem sem se preocupar com piadas, o que pode fazer com que o resultado geral seja menos engraçado, mas não dilui nada de sua potência.
Ao contrário de seus antecessores, “About Endlessness” parece menos inclinado à crítica, preferindo observar e admirar a vida na Terra. Aceita de todo o coração que a dor e a alegria são faces da mesma moeda e que uma delas é necessária para que a outra seja percebida.
De volta ao consultório do psiquiatra, quando o padre lhe pergunta qual seria o significado de uma existência sem Deus, ele responde: “Talvez estar contente de estar vivo”. Essa filosofia simples está no cerne de “About Endlessness” – um filme que ousa, não apenas ter um título potencialmente absurdo, mas pedir a seus espectadores que olhem em volta e se maravilhem com a magia de tudo.