Em um filme baseado em fatos reais, muitas vezes, o grande segredo é tornar sua história inteligível ao espectador. Nesta tentativa, recursos que buscam dinamizar a trama são fortemente adotados: narração em off, quebra da quarta parede e até mesmo animação ou texto escrito. No caso de ‘O Escândalo’ todos esses elementos são utilizados excessivamente, deixando seu tema central sufocado em meio a tantas estratégias narrativas. Ironicamente, ao abordar um caso sobre assédio sexual contra mulheres no mercado de trabalho, o longa aproxima-se muito da realidade ao não oferecer a importância e seriedade necessária ao tema.
Com roteiro de Adam McKay (“A Grande Aposta”), a história em questão rememora as denúncias de assédio que derrubaram o ex-presidente da Fox News, Roger Ailes, em 2016. Impulsionado por Gretchen Carlson (Nicole Kidman) e Megyn Kelly (Charlize Theron), o processo judicial reuniu o depoimento de várias vítimas, as quais inspiraram o roteirista Charles Randolph a criar a personagem Kayla Pospisil (Margot Robbie) exclusivamente para o longa.
Mesmo com um elenco de peso, ‘O Escândalo’ pouco se esforça para que suas atuações possuam um desempenho extraordinário. Kidman e Theron dominam a tela quando aparecem em cena, sendo uma pena não possuir um momento de maior diálogo entre as duas. Enquanto isso, Robbie se esforça em um papel estereotipado e apático, sendo também responsável por momentos mais densos da trama que perdem a força devido à falta de profundidade do roteiro.
Assédio sexual longe da discussão
Além de não proporcionar grande momentos para suas personagens, “O Escândalo” também negligencia seus desenvolvimentos. As vidas pessoais de cada uma, assim como os traumas por terem sofrido assédio, poderiam ser melhor aproveitados, não como forma de explorar o sofrimento de personagens femininas, mas de maneira que a temática tão séria e relevante fosse realmente aprofundada, mostrando seus efeitos na vida das vítimas.
Ao apresentar outros casos de assédio rapidamente através de recursos como narração ou flashbacks, “O Escândalo” deixa claro que gerar questionamento acerca de seu tema não é sua maior preocupação. Como diretor, Jay Roach (“Entrando Numa Fria”) prioriza uma montagem enérgica para que o longa seja dinâmico e facilmente compreendido, entretanto, seu comprometimento em repassar tais acontecimentos e até mesmo motivar ações contra o assédio sexual é deixado totalmente de lado.
Até mesmo a forma de abordagem sobre uma possível sororidade em que as vítimas se unem contra o agressor é irresponsável. Ailes aparece como o acusado injustiçado em todo trâmite do processo e o único momento de confronto sobre a falta de denúncia anterior contra ele é protagonizada por duas vítimas, intuindo uma culpa contra si, algo que o filme logo em seguida renega. Porém, o principal culpado na situação pouco aparece como tal.
Apesar de ser uma grande oportunidade para ver Nicole Kidman, Charlize Theron e Margot Robbie numa trama sobre um tema tão latente às mulheres, ‘O Escândalo’ poderia ser um filme com um desenvolvimento muito melhor. Para isto, seria preciso, ao menos, que sua temática fosse tratada com a seriedade devida.