Talvez por ter sido inspirado por um famoso game, Need for Speed: O Filme não sinta uma necessidade tão forte de se preocupar com realismo ou lógica. O filme parece se passar numa outra realidade, onde as leis funcionam de forma diferente e os acidentes de trânsito raramente causam a morte de alguém – a não ser quando a trama necessite disso, claro. Tudo nele é rápido, descontraído e meio descerebrado, mas também inegavelmente divertido.

Need for Speed busca inspiração no game, mas também nos velhos “filmes de carro” do passado e nos heróis que os estrelavam. O herói deste é uma versão atualizada do cowboy e do piloto, algo como um personagem de Steve McQueen ou Burt Reynolds rejuvenescido e com um jeitão de “bróder”. Tobey Marshall (interpretado por Aaron Paul, intenso como a versão raivosa do seu famoso personagem Jesse Pinkman da série Breaking Bad) é o jovem dono de uma oficina mecânica. É também um ocasional piloto de corridas fora-da-lei. Com a oficina em dificuldades, ele é forçado a aceitar uma proposta financeiramente muito boa de um antigo desafeto, Dino Brewster (Dominic Cooper). Este, no entanto, acaba sacaneando o herói, colocando nele a culpa por uma tragédia e fazendo-o passar dois anos na cadeia.

Ao sair, Tobey só tem uma coisa em mente: vingança. Ele e seus amigos então embarcam num plano mirabolante cujo objetivo é fazer com que Tobey e seu carro Ford Mustang atravessem o país até chegar à corrida secreta do milionário misterioso Monarch (Michael Keaton). É nela que o herói e seu rival irão se encontrar para resolver suas diferenças a bordo de máquinas poderosas.

O diretor Scott Waugh mantém a história o mais dinâmica possível e, junto com sua equipe de dublês, cria imagens espetaculares de batidas de carro. É impossível não se impressionar quando, por exemplo, a câmera acoplada ao carro o mostra “levantando voo” numa cena dramática e importante da história. Em diversos momentos, Waugh também recria o ponto de vista do videogame, colocando a câmera no lugar do motorista, com direito até à contagem da velocidade aparecendo no interior do vidro do carro. E o diretor também cria inspirados momentos utilizando a ferramenta do 3D: o show de luzes na apresentação do Mustang, ou a “chuva de folhas” criada pela manobra do mesmo carro, passando por sobre árvores, demonstram a inventividade visual do filme.

Já o roteiro de George Gatins sacrifica um pouco a profundidade em prol da rapidez. A história concebida para o filme capricha nas referências a filmes e personagens icônicos do passado. Bullitt (1968), com Steve McQueen, cuja cena de perseguição ainda hoje é uma das melhores do tipo, é visto num momento. Corrida Contra o Destino (Vanishing Point, 1971) também é referenciado – o personagem de Keaton lembra muito o radialista que acompanhava a trajetória do piloto Kowalski e o incentivava no cultuado filme setentista. O próprio herói Tobey Marshall é o rebelde iconoclasta que se envolve numa enrascada ao ceder ao poder do dinheiro, mas depois demonstra seu espírito independente numa jornada que cativa vários ao seu redor.

A trama se move tão rápido que os absurdos vão aos poucos se acumulando. Por exemplo, como Benny (Scott Mescudi), da equipe do herói, consegue acesso a tantos veículos aéreos? E quanto aos bandidos que tentam matar – isso mesmo, matar, e não apenas parar – Marshall no trecho desértico da estrada? E o vilão, que não destrói uma evidência importante capaz de prejudica-lo mais à frente? E quanto às várias vezes em que os personagens escapam vivos de batidas impressionantes? Esse espírito absurdo acaba sendo responsável por grande parte da diversão de Need for Speed.

Esse absurdo também faz com que Need for Speed chegue a ser uma obra moralmente nebulosa, mostrando corridas em alta velocidade em meio ao tráfego normal. O filme não mostra nenhum inocente morrendo por causa dos “pegas” dos personagens. Porém, é óbvio que alguns policiais, pelo menos na sequência final, devem ter se dado mal. Isso é típico não só desta obra, mas de vários exemplares do cinema de ação – quantos inocentes não devem morrer nas batalhas de filmes recentes de super-heróis? Os personagens de Need for Speed não estão nem aí, só querem correr e isso contribui para o aspecto de irrealidade do filme. Ao menos a produção colocou um aviso ao final, recomendando que as proezas do filme não sejam imitadas…

Correção política à parte, é preciso dizer que certos filmes, especialmente no gênero ação, sustentam-se apenas na base da energia. O roteiro pode até ser repleto de lugares-comuns, mas se a narrativa tiver energia, o filme resulta numa experiência despretensiosa e agradável. Need for Speed é assim, e retira sua energia principalmente das imagens e do simpático elenco.

Need for Speed - O Filme, com Aaron Paul e Dominic Cooper