Michael Bay é um nome capaz de causar aversão em muita gente ao simplesmente ser mencionado, tamanha é a sua (má) fama construída ao longo da carreira. Ainda assim, misteriosamente, esse mesmo nome arrecada milhões e milhões a cada novo e interminável Transformers que chega às salas de cinema – e espero que alguém um dia estude esse fenômeno. Agora, além das bilheterias, Bay parece ter mais um legado (no bom ou mau sentido) para deixar ao mundo do cinema: seus seguidores.

Afinal, cada frame da mais recente versão de As Tartarugas Ninja imprime o inconfundível jeito Michael Bay de ser, ainda que, na verdade, a direção esteja nas mãos do sul-africano Jonathan Liebesman, responsável também por Invasão do Mundo: Batalha de Los Angeles e Fúria de Titãs 2. Embora Bay assine o filme apenas como produtor, Liebesman mostra que está disposto a seguir os passos do mestre e empregar tudo o que aprendeu com o estilo “Bayhem”, tal como devidamente explorado neste vídeo-ensaio de Tony Zhou sobre o diretor americano.

Sendo assim, não importa muito a história, e nem que as personagens já tenham uma trajetória conhecida pelo público; o que importa mesmo é a nova roupagem frenética que elas ganham. Neste caso, o fiapo de roteiro que serve como desculpa para reapresentar as Tartarugas Ninja ao público acompanha a repórter April O’Neil (Megan Fox), que, determinada a investigar as atividades ilícitas do grupo criminoso Clã do Pé, acaba encontrando no caminho o grupo de heróis batizados com nomes da Renascença – Leonardo, Michelangelo, Raphael e Donatello. Juntos, eles deverão enfrentar o terrível Destruidor, líder do Clã, e impedir que uma ameaça tóxica se espalhe pela cidade.

Há algo de errado com seu filme se uma das melhores coisas nele é a Megan Fox, que, convenhamos, não é nenhum ás da atuação. Ainda assim, a atriz consegue ser crível na pele da repórter obstinada que, vestida constantemente com sua clássica jaqueta amarela, busca descobrir a verdade em torno do Clã do Pé e realizar um tipo de jornalismo mais sério. O mesmo não se pode dizer dos outros personagens: se as Tartarugas Ninja ficaram marcadas na memória do público pelo seu carisma, aqui o resultado é no mínimo frustrante, já que elas não passam de caricaturas unidimensionais que, de vez em quando, soltam algumas piadas e referências pop durante o filme – e, na maioria das vezes, sem graça.

Um dos maiores problemas deste reboot dos vigilantes répteis, aliás, é sua indecisão quanto a que rumo tomar. Algumas vezes, investe na moda do filme sombrio e realista de super-herói, como na cena em que as Tartarugas lutam com os capangas do clã nas docas, entre contêineres, numa ação bem semelhante à que vimos em Batman Begins; nos momentos que insistem em parecer mais dramáticos do que realmente são; ou, ainda, no roteiro que tenta trazer ares de complexidade ao envolver a origem da mutação dos heróis com a infância da própria April. Outras vezes, é só pura ação vestida com uma montagem frenética e cheia de piadas fora de hora. E, em muitos momentos, é simplesmente um produto, no pior sentido da palavra: quase um comercial da Microsoft, frisando bastante que naquele universo diegético todo mundo usa aparelhos Windows Phone e prefere usar a videochamada do Skype a simplesmente telefonar ou mandar uma mensagem.

Nem a fotografia do competente Lula Carvalho salva, já que ela é empregada em ângulos tortos e com movimentos de câmera na mão que em nada ajudam a narrativa, e planos que querem dar ares épicos a cenas em que quase nada acontece. Mais uma vez, tudo bem ao jeito de Michael Bay, e ainda mergulhado em tons azulados como diz a cartilha.

Verdade seja dita, porém: Liebesman pelo menos consegue adotar uma montagem que, embora seja tão rápida quanto a de seu mentor, raramente é confusa. Além disso, a cena que envolve uma perseguição e uma nevasca é eficiente e divertida em sua concepção, mais até do que a batalha do suposto clímax. Pena que o recurso do slow motion também apareça constantemente para tentar trazer mais tensão às lutas, mas sem sucesso. Soma-se a isso a trilha onipresente e óbvia de Brian Tyler, e o roteiro pouquíssimo inspirado que investe nas situações mais óbvias e surreais o possível e em diálogos expositivos e frases de efeito como “Esta noite jantarei sopa de tartaruga”.

Talvez se investisse um pouco mais na naturalidade e na ingenuidade de seus personagens, resgatando um pouco do carisma original da série, As Tartarugas Ninja poderia render um passatempo divertido. O que se vê, no entanto, é um filme que pode não ser tão ruim quanto parece, mas é simplesmente esquecível. Não é que ele precisasse se levar a sério; Guardiões da Galáxia está fazendo o maior sucesso justamente por fazer o contrário e saber rir de si mesmo. No caso de As Tartarugas Ninja, porém, é difícil engolir sua premissa quando ela é empostada por tomadas épicas.

No fundo, a sensação que dá é mesmo que não há envolvimento dos próprios responsáveis pela produção. O projeto parece ter sido tocado adiante só pela prerrogativa de “podíamos fazer, então fizemos”. Afinal, o que diferencia As Tartarugas Ninja de qualquer um dos filmes da série Transformers? A luta final em um arranha-céu, com direito a um Destruidor vestido com uma armadura robótica à lá Autobots, poderia estar em qualquer outro filme desses. A diferença é que pelo menos é mais fácil aturar uma hora e quarenta minutos do grupo de tartarugas do que quase três horas de robôs se matando em meio a Nova York.

Não que isso signifique que a experiência seja boa. Na verdade, guardadas as devidas proporções (sim, eu sei que ninjas e samurais não são a mesma coisa), um harakiri seria preferível a ter que acompanhar produções feitas na escola Michael Bay de cinema. Ou talvez eu esteja só exagerando mesmo.