Você pode reclamar de qualquer coisa nos curtas de Ricardo Manjaro, menos que falta precisão técnica nos seus trabalhos. A Última no Tambor sua estreia como diretor, já mostra suas obsessões estéticas, algo que ficaria ainda mais perceptível nos seus curtas seguintes, os atmosféricos Necromante e Morcego de Rua.

Lançado em 2012, A Última no Tambor venceu no Amazonas Film Festival (que saudades desta época) daquele ano nas categorias de melhor ator (Breno Castelo) e melhor fotografia (para o próprio Manjaro em parceria com Leonardo Mancini). O curta acompanha o assassino, de poucas palavras, Batista (Breno Castelo, muito bem caracterizado como pistoleiro solitário) que vaga por Manaus para executar seu último serviço que é matar um empresário local, Miguel Uchoa (Lucas Macêdo).

O curta de Manjaro segue, essencialmente, a linha narrativa dos filmes hollywoodianos voltados para o suspense policial – com bons elementos do cinema noir e de gângster– sem vergonha nenhuma, e faço este comentário sem querer desqualificar o trabalho de Ricardo, até porque é bom ver realizadores da cena amazônica, revelando seus gostos cinematográficos ao mesmo tempo em que imprimem seu próprio estilo. Apesar de A Última no Tambor não apresenta grandes inovações para o gênero na sua abordagem narrativa, o curta tem uma estética muito bem pensada que junto com sua narrativa envolvente, ajudam o público a mergulhar naquele mundo sem emoções do matador profissional de Breno Castelo.

MICHAEL MANN, MANAUS E ATUAÇÕES

Manjaro dialoga muito bem com o cinema mais intimista do final da década 70 e início da década seguinte. De cara, nota-se a influência de Michael Mann, seja pela fotografia de paletas de cores frias de Mancini (hoje no grupo Plano-Sequências), que traduz a atmosfera sombria da história, seja pela temática do assassino na sua trajetória trágica a ser realizada durante uma missão, em uma única noite, semelhante à Profissão Ladrão e Colateral. O próprio figurino que Batista utiliza na seqüência final, lembra as vestimentas do assaltante Neil McCauley de Robert De Niro em Fogo Contra Fogo.

Além disso, os diálogos secos, diretos e irônicos, juntamente com a forma como Manjaro filma a noite manauara – o plano final na ponte Rio Negro dá uma interessante dimensão onírica ao curta -, são escolhas acertadas do diretor. Há momentos, que as imagens evidenciam com certa precisão, o perfil psicológico de Batista como na cena abertura, onde um plano capta o rosto do assassino para, em seguida, cortar para outro, mostrando as águas agitadas do Rio Negro e representando para o público, que estamos diante de uma pessoa instável e turbulenta. A própria sequência sensorial do assassino dentro de um quarto hotel não apenas fornece as pistas sobre a sua loucura como também joga o espectador dentro da mente agitada do personagem.

É claro que o curta apresenta certos buracos no seu roteiro. É difícil aceitar que um assassino profissional como Batista não tenha checado seu “equipamento” antes de um momento crucial. O roteiro também se mostra confuso em explicar as reais intenções de quem contratou Batista. Além disso, apesar de todo o rigor de Manjaro na parte estética do seu curta, o trabalho de som apresenta certas deficiências, principalmente na parte final, ainda que isso não comprometa o ótimo tiroteio final, muito bem realizado e captado pela câmera do diretor.

O curta é beneficiado pelas boas atuações: Breno Castelo acerta com precisão, o jeitão introspectivo e minimalista de Batista, ao passo que Lucas Macêdo incorpora de forma deliciosa, a caricatura do seu gangster Miguel, divertindo-se nos poucos minutos em que aparece. Por fim, A Última no Tambor mostra o caminho ideal a ser seguido pelos jovens realizadores, ao indicar como driblar as limitações orçamentárias com o uso da criatividade a seu favor. Ao unir visão, técnica e narrativa, Manjaro revela, que muitas vezes, fazer cinema pode ser simples e gratificante.