Os principais épicos religiosos americanos surgiram nos anos 50 quando o cinema precisava oferecer espetáculos grandiosos para lutar contra a concorrência da televisão. A nova onda do gênero iniciada com “Noé” segue a luta da indústria de Hollywood para se manter relevante contra as tecnologias recentes (Netflix, por exemplo) e a crise econômica. Assim como os longas estrelados por Charlton Heston e produzidos por Cecil B. DeMille, o foco é no quanto maior melhor, ou seja, efeitos especiais modernos com grandes investimentos, figurinos e direção de arte ostentosos e as principais estrelas do cinema americano.
A grande diferença está no resultado: se na década de 50, esse tipo de filme impressionava por realmente ser um espetáculo raro de ser visto, as superproduções atuais não surpreendem mais. Afinal de contas, todos os dias vemos um “fenômeno nunca antes visto” surgir nos cinemas seja na aventura do momento baseada em histórias em quadrinhos ou na ficção científica da vez.
Em “Êxodo: Deuses e Reis”, o diretor Ridley Scott bem que se esforça para levar ao público esse clima de espetáculo: a cada 10 minutos, há uma cena panorâmica em que se tem noção da dimensão dos locais da história. Podemos ver, lá do alto, a escura cidade onde os hebreus moram, o Rio Nilo tomado de sangue na sequência das sete pragas do Egito ou a fuga liderada por Moisés no meio do Mar Vermelho. Da mesma maneira, a equipe de efeitos visuais precisa trabalhar bastante durante o momento em que besouros invadem o reino comandado por Ramsés e a inundação no clímax do filme para empregar o clima de realismo mágico.
O encantamento visual desses momentos, entretanto, se torna apenas um embrulho bonito para encobrir a pobreza narrativa do roteiro e as escolhas equivocadas de composição dos personagens egípcios. “Êxodo: Deuses e Reis” parece uma mistura de “Batman Begins” (herói em busca da identidade) com “Gladiador” (homem poderoso acaba humilhado, sendo substituído por um sujeito fraco e precisa retornar para reestabelecer a ordem), o que fica mais claro por reunir justo Christian Bale e Ridley Scott. Essa sensação de déja-vu aliada à pressa com que a história acaba sendo contada seja no relacionamento entre Ramsés e o pai (John Turturro não combina com Egito) ou no casamento de Moisés trazem incompletude à história e destroem as pretensões do projeto.
A decisão de representar os egípcios de modo afetado piora ainda mais “Êxodo: Deuses e Reis”. Evidente que as histórias bíblicas se caracterizam pelo eterno confronto do bem contra o mal, porém, o filme exagera desde as escolhas da maquiagem carregada passando pela sequência de atos cruéis até o ar blasé com que os personagens se comportam. Isso reflete na atuação ridícula de Joel Edgerton como um Ramsés bobão e tolo. Para uma época de tensões constantes no Oriente Médio, o épico soa, no mínimo, mal intencionado.
No meio disso tudo, há os dois pilares de “Êxodo – Deuses e Reis”: Christian Bale e Ridley Scott. O ator mostra mais uma vez ser especialista em personagens com grandes conflitos internos ao trazer um Moisés sempre se questionando sobre a necessidade dos castigos impostos por Deus aos egípcios. Mesmo com o fraco roteiro em mãos, Bale empresta dignidade e grandeza ao protagonista.
Já o cineasta inglês escancara a má fase da carreira e parece buscar sempre nos acertos obtidos em “Gladiador” a inspiração para este épico. Tomado pelo senso de urgência dos dias atuais, Scott não consegue desenvolver nada sem o aprofundamento de tempos gloriosos de “Blade Runner” e “Alien” e cria obras cada vez mais vazias como “Cruzada”, “O Conselheiro do Crime” e “Prometheus”, sendo as embalagens mais interessantes que os conteúdos em si.
Para uma indústria de cinema cada vez mais ávida por novidades tecnológicas e impressionar o espectador a qualquer custo, “Êxodo – Deuses e Reis” até cumpre a missão de trazer efeitos visuais e sequências de ação bem feitas. Falta, entretanto, o maior poder de um filme: contar bem uma história.
De todos os recursos, este continua sendo indispensável.
com todo respeito, vi – no lugar do que li – um FILMAÇO – com um roteiro retirado de uma história contada por milênios com bem menos dados que os contidos no filme. Sobre o Ramsés, me pareceu que a atuação descrita como “tola” destaca um rei jovem e, portanto, inseguro na função. Justamente por suas crenças – coisa que o roteiro mostra – em coisas nas quais o próprio não acredita. Sobre o conflito do protagonista – ora comparado mesmo que indiretamente ao Batman – é no mínimo interessantea “versão” de que um líder humano que não tem alcance para compreender por completo o que estava prestes a fazer é vacilante… Continuo achando que o Ridley Scott vem fazendo boms filmes.
Mas essa é a opinião de um amante de cinema…
Abraços e continuem com o trabalho.