O cinema e a cultura amazonense perderam Joaquim Marinho neste domingo (2).

Por isso, o Cine Set rende esta homenagem resgatando os momentos históricos da passagem do radialista pelo audiovisual local.

Membro Fundamental da Geração Cineclubista dos Anos 1960

Segundo o saudoso professor da Universidade Federal do Amazonas, Narciso Lobo, o cinema amazonense vive em constantes ciclos de descontinuidades. O primeiro auge foi com Silvino Santos, nos anos 1920, e o segundo se caracterizou com o movimento cineclubista na década de 1960.

Na esteira da agitação política (as tensões antes e durante o golpe militar, a Guerra Fria, a Crise dos Mísseis de Cuba), cultural (o surgimento da Bossa Nova, Jovem Guarda e Tropicália) e cinematográfica (Nouvelle Vague e Cinema Novo), uma geração de cineclubistas estimulou o debate, a produção e eventos de cinema em Manaus. Os cineclubistas da época traziam gente como Roberto Kahané, Ivens Lima, Cosme Alves Neto, Márcio Souza, Normandy Litaif e, claro, Joaquim Marinho.

O Grupo de Estudos Cinematográficos (GEC) projetou na cidade obras-primas como “O Encouraçado Potenkim”, “O Gabinete do Doutor Caligari”, “Milagre em Milão”. A Cinemateca Brasileira considerou o cineclube o terceiro mais importante do Brasil.

Organizador do I Festival Norte de Cinema Brasileiro e a Homenagem a Silvino Santos

Mesmo com o endurecimento do regime militar com o AI-5, em 1969, o movimento cineclubista teve tempo para um último e importante capítulo: o I Festival Norte de Cinema Brasileiro.

Joaquim Marinho foi figura fundamental: o festival foi organizado pelo Departamento de Turismo e Promoção, do governo estadual, na época, comandado por ele. A habilidade de articulação de Marinho ainda levou o evento a contar com apoio do Instituto Nacional de Cinema e da Cinemateca do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, sob a gestão de Cosme Alves Neto.

O I Festival Norte de Cinema Brasileiro contou com 42 filmes inscritos, sendo 25 curtas-metragens, três deles do Amazonas. O clássico “Macunaíma”, de Joaquim Pedro de Andrade e estrelado por Grande Otelo, foi o vencedor do evento, enquanto Paulo José e Helena Ignez foram premiados pelas atuações.

O grande destaque, porém, foi mesmo o resgate histórico a Silvino Santos, pioneiro do cinema na Amazônia. Aplaudido de pé no Teatro Amazonas, este gigante do audiovisual local teve a homenagem que merecia em vida.

Sonho de uma Indústria e Apoio ao Cinema Local

A inquietude era uma das marcas da personalidade de Joaquim Marinho e pessoas com estas características tendem a ser sonhadoras, buscando sempre formas de transformar os seus desejos em realidade.

Durante o início dos anos 1970 e toda a empolgação com as perspectivas de crescimento regional com a implantação da Zona Franca de Manaus, Joaquim Marinho idealizou a proposta de um possível polo cinematográfico. Se o sonho não chegou a ir para frente, pelo menos, a vontade de possibilitar a realização de filmes no Amazonas não terminou.

Superintendente da Fundação Cultural do Amazonas, Joaquim Marinho apoiou filmes locais como “Ajuricaba – O Rebelde da Amazônia”, de Oswaldo Caldeira, e “Mater Dolorosa”, de Roberto Evangelista.

A produção amazonense pode ter sofrido solavancos nos anos 1970 e 1980, mas, o apoio de Marinho foi decisivo para não chegar a zero.

Dono de Cinemas de Rua no Centro de Manaus

Atualmente, o Casarão de Ideias é um alívio dentro da programação de cinemas de Manaus. Filmes europeus, latinos, asiáticos e produções brasileiras do circuito alternativo ganham espaço em contraponto aos “Vingadores”, “Aladdin” e “Toy Story” dos multiplexs dos shoppings locais.

Essa trajetória foi traçada décadas antes por Joaquim Marinho. Em parceria com Antônio Gavinho, ele comandou os cinemas Chaplin, Oscarito, Grande Otelo, Carmen Miranda, Renato Aragão e mais duas salas no Shopping Nova.

Os cartazes e artes visuais impressionantes de Marinho Bell, as filas históricas pela Joaquim Nabuco, as homenagens a ídolos históricos da cultura popular brasileira… Os cinemas do Centro de Manaus formaram uma geração de cinéfilos na cidade, inclusive, muitos deles, como Rod Castro e Emerson Medina, decidiram ingressar no audiovisual.

 Uma influência cultural inestimável para Manaus.

 Incursão na Crítica

Bem antes do Cine Set, a crítica cinematográfica no Amazonas traz nomes históricos neste gênero, entre eles, Benjamin Lima, José Gaspar com a lendária revista Cinéfilo, Ivens Lima com o programa de rádio “Cinemascope no Ar” e o escritor Márcio Souza.

Como um gigante cultural que é, Joaquim Marinho também fez trajetória na crítica cinematográfica.  O programa “Chegou a Hora do Cinema”, da Rádio Difusora, foi uma das primeiras incursões dele na crítica e na divulgação de notícias de filmes. Além de cinema, a cultura pop também era assunto com quadrinhos, livros e música. Isso se manteve, nos últimos anos, com um programa na Rádio Amazonas FM.

Falando por mim, conheci o trabalho de Joaquim Marinho com a coluna dele no Jornal do Norte. Eram pequenos comentários, até mesmo despretensiosos, sobre filmes, mas, algo raro nos jornalões de Manaus. Foi quando vi que era possível escrever sobre cinema aqui no Amazonas.

Obrigado, Joaquim!

Fotos Capa e Imagem 5: Camila Henriques