Era uma vez uma história ambientada num reino estranho, estilo medieval, com disputas pelo poder, dragões, mortos-vivos e magia. Já vimos isso antes, certo? Sim, porém mesmo com esses ingredientes Game of Thrones da HBO é diferente. A série, uma das mais assistidas do momento, é uma experiência interessante justamente por transformar essas convenções de gênero e os clichês aos quais nos acostumamos. Pensamos que a trama seguirá por uma direção e ela vai para outra. O herói íntegro salvará o dia e resolverá o problema? Provavelmente não. O vilão se dará bem no final? Não é impossível. Quem são os heróis? Quem são os vilões? Quem é o protagonista da história? Todas essas perguntas acabam contribuindo para deixar outra no ar, pairando sobre todas elas: Como esse negócio vai terminar?

Em resumo, Game of Thrones é uma série que se tornou um fenômeno cultural acompanhado de polêmicas, nudez, sexo, violência e, acima de tudo, muita imaginação. Mas para o seriado chegar às telas foi um longo caminho…

daenerys emilia clarke game of thrones

As origens

Em 1991, o escritor americano George R. R. Martin – que divide muitos “erres” com o autor de O Senhor dos Anéis, o britânico J. R. R. Tolkien – começou a esboçar uma história épica a ser contada numa trilogia de livros. Martin já era um autor veterano e tinha tido experiências com Hollywood, escrevendo para seriados de TV.

O autor diz que a obra rapidamente saiu do seu controle e foi crescendo, a ponto de três livros se tornarem insuficientes. Em 1996, o primeiro livro da série As Crônicas de Gelo e Fogo, A Guerra dos Tronos (A Game of Thrones no original), foi publicado. Mais quatro livros o seguiram, e ainda faltam mais dois para terminar a história.

Alguns chamam o autor de preguiçoso e outros mais fatalistas já até manifestaram receio dele falecer antes de terminar os livros – Martin tem 66 anos. Mas ao lê-los, percebe-se o meticuloso trabalho de construção da trama e caracterização dos personagens, e a vastidão do universo imaginado por ele impressiona. O mundo de Gelo e Fogo é um dos mais detalhados e complexos da história da literatura fantástica. E Martin é conhecedor de História e, às vezes, busca inspiração em eventos e povos da vida real para compor a fantasia. São livros complexos que demandam tempo, tanto para serem escritos quanto para serem lidos.

Sobre a série, a HBO comprou os direitos em 2007 após ouvirem o pitch, a oferta da ideia, vinda dos roteiristas e produtores David Benioff e D. B. Weiss, fãs da obra de Martin que não queriam vê-la ser comprimida numa eventual adaptação para o cinema. O próprio Martin é produtor do seriado e escreveu o roteiro de pelo menos um episódio por temporada.

Game of Thrones - bastidores

A produção

Game of Thrones tinha tudo para ser um desastre. O primeiro episódio não agradou a ninguém e precisou ser reescrito e refilmado, com alguns dos atores sendo substituídos, ainda por cima. A HBO ainda estava ressabiada com o fracasso de Roma alguns anos antes, por isso a sequência de batalha no Bosque dos Murmúrios nos últimos episódios da primeira temporada teve de ser cortada para controlar os custos. Ainda assim, quando a série estreou em 2011, Game of Thrones se tornou o sucesso de audiência que Roma não foi, e que a HBO não tinha desde o final de Família Soprano em 2007.

Animados pela repercussão, a HBO liberou a verba para uma grande batalha na segunda temporada, e por incrível que pareça, ela não ficou muito a dever ao que vemos em filmes épicos de cinema. E o escopo da série e seu elenco foram progressivamente aumentando. Hoje, Game of Thrones é filmado em vários países (Irlanda, Croácia, Marrocos e, nesta nova temporada, a Espanha foi incluída) e é a maior produção televisiva do mundo, com o maior elenco.

Game of Thrones Cersei e Jamie Lannister

As polêmicas

Em se tratando de uma produção HBO, é claro que há cenas fortes de nudez, sexo e violência em Game of Thrones. Tanto que de vez em quando alguns espectadores protestam contra o seriado, acusando-o de explorar o seu elenco feminino – quase todas as atrizes do seriado apareceram nuas ou pelo menos topless em algum momento do programa.

Bem, é preciso deixar claro que a sexualidade e a violência presentes na TV já existem nos livros. O mundo criado por George R. R. Martin é brutal e nele, muitas vezes, o sexo é usado como ferramenta de poder. Isso não é desculpa, porém, para o momento mais infeliz da série, a cena de “estupro não intencional” de um dos episódios da quarta temporada. “Não intencional” porque nem os atores nem o diretor que gravou a cena pareciam ter ideia de que se tratava de uma relação não consensual entre os irmãos Jaime e Cersei – sim, além de estupro, eles praticam também incesto. A repercussão negativa foi grande, com a série sendo acusada de trivializar o ato e de buscar o choque pelo choque. Pelo menos naquele caso, as acusações foram justificadas…

Os tons de cinza

O aspecto mais fascinante da série é ver como muitos dos seus personagens evoluem e se transformam ao longo do tempo. E Martin, para seu crédito, buscou evitar o maniqueísmo tão presente nesse tipo de história. Tudo em Game of Thrones é complicado e com tons de cinza, com todos os personagens na disputa do Trono de Ferro possuindo suas complexidades. Os personagens mais virtuosos, que seriam os heróis em outras histórias do tipo, já se foram há bastante tempo e não foram recompensados pelas suas virtudes. Enquanto isso, alguns que se mostraram maus e inescrupulosos no início, aos poucos passaram por fascinantes mudanças, a ponto de se tornarem simpáticos aos olhos dos espectadores. É o tipo de mudança que deixa a aparentemente manjada trama de “bem contra o mal” diferente e mais rica. Isso não acontece, por exemplo, em O Senhor dos Anéis ou Star Wars, outras famosas fantasias com diferenciações muito fortes entre o bem e o mal.

Jon Snow Kit Harring Game of Thrones

Motivos para ficar empolgado com a quinta temporada

A partir desta temporada já vão começar a aparecer elementos inéditos em relação aos livros: Afinal, já foi até confirmado por Weiss e Benioff que a série deve acabar antes que Martin publique os dois livros restantes. Então, em breve os espectadores entrarão em território realmente desconhecido.

Mulheres no poder: Para um programa que já foi acusado de sexista, esta temporada poderá ser a hora de reverter isso. Várias personagens femininas estarão em grande posição de poder este ano, como Daenerys e Cersei, e veremos também o amadurecimento de Sansa e a jornada de Arya. Além, claro, de Melisandre exercendo influência sobre Stannis e Jon Snow, e das Serpentes de Areia de Dorne, que buscarão vingança. Os homens podem ir à guerra, mas muitos deles o farão após ordens de suas soberanas.

O encontro entre Tyrion e Daenerys: Isso é algo esperado desde que a jornada dela começou. Os fãs imaginam como ocorrerá a interação dela com os demais personagens desde o início da série, e agora poderemos ver esse processo começar.

Não há nada igual na TV: Game of Thrones representa para a TV um momento de grande ambição narrativa e tecnológica. É a TV mostrando que pode competir de igual com o cinema em termos de escala e de qualidade narrativa, especialmente em se tratando de histórias épicas e fantásticas, antes territórios exclusivos da tela grande. E quando lembramos que entre as últimas investidas do gênero no cinema estão projetos como 300: A Ascensão do Império ou a decepcionante trilogia O Hobbit, então Game of Thrones se torna ainda mais especial e incrível.