Desde o seu início, em meados de 2000, a franquia X-Men já passou por vários altos e baixos: o sucesso absoluto com os dois primeiros filmes, estabelecendo um novo patamar no gênero de super-heróis, sob o comando de Bryan Singer; a queda dos mutantes, com o terceiro filme e a infame aventura solo de Wolverine; e, finalmente, a reinvenção da saga, graças ao trabalho de Matthew Vaughn em Primeira Classe e o retorno de Singer no recente Dias de Um Futuro Esquecido, mais uma prova de que, nas mãos certas, os mutantes ainda podem render histórias muito boas.

Contestado pelos fãs de quadrinhos, último filme da trilogia inicial dos mutantes ganha defesa do Cine Set.

Nessa trajetória, X-Men: O Confronto Final é sempre lembrado como a pedra que quase sepultou a franquia no cinema: mesmo tendo sido campeão de bilheteria, despertou a ira de muitos fãs dos quadrinhos, e teve uma má recepção da crítica. Visto agora em retrospecto, fica claro que o filme realmente tem sua boa dose de problemas. Porém, o longa de Brett Ratner, apesar da reputação injusta que acumulou ao longo dos anos, está longe de ser tão ruim quanto o pintam.

Vale lembrar que O Confronto Final já nasceu com uma série de problemas em sua produção: Bryan Singer, que tinha dirigido os dois filmes anteriores, preferiu comandar Superman – O Retorno, e a Fox decidiu tocar o projeto adiante sem ele. Depois de muita procura do estúdio, Matthew Vaughn inicialmente aceitou o trabalho, mas largou logo depois por estar insatisfeito com o roteiro. Com tanta pressão em volta, a Fox convidou um nome que certamente seria um diretor inofensivo e que não bateria de frente com as decisões do estúdio. Assim, Brett Ratner, até então conhecido por seu trabalho no suspeito A Hora do Rush, assumiu o comando dos mutantes.

Tendo isso em vista, é nítido que Ratner realmente não tem a personalidade de Singer nem de Vaughn na direção do filme. Mesmo assim, ele faz um trabalho competente, respeitando ao máximo o tom e o visual já estabelecidos nos longas anteriores, e fazendo deste um terceiro capítulo coeso com o restante da saga. Ratner também fez o que pôde com o roteiro, que tem a tarefa ingrata de ter que lidar com duas tramas paralelas ao longo de sua curta duração: a saga clássica da Fênix Negra, que envolve a “ressurreição” de Jean Grey, e o surgimento da cura mutante, baseada no arco Gifted, escrito por Joss Whedon.

Se o tratamento dado à trama de Jean Grey desapontou muitos dos leitores de HQs, o tema da cura mutante dá uma virada interessante ao filme, ao reforçar mais uma vez a alegoria sempre presente dos mutantes como qualquer outra minoria discriminada na sociedade. Daí surgem momentos dramáticos que ajudam a expandir o tema, como uma das cenas que abrem o filme, mostrando Warren Worthington (o Anjo, vivido por Ben Foster) ainda criança tentando arrancar as próprias asas, sob o olhar de repulsa do pai preconceituoso. Vampira (Anna Paquin), que sofre por não poder tocar nas pessoas, é outra que se vê no dilema de abdicar de seus poderes para enfim se sentir aceita.

x-men o confronto final

É uma pena que o ritmo apressado do filme acabe afetando o desenvolvimento de muitos desses personagens – caras novas como o próprio Anjo e a Fera são pouco exploradas –, mas, ainda assim, Ratner encontra um bom equilíbrio entre ação e drama ao longo da trama. Em compensação, o elenco mais uma vez se mostra consistente, e alguns personagens ganham mais tempo de tela, como Tempestade (Halle Berry) e Kitty Pride, perfeita na pele de Ellen Page. Se alguns momentos correm muito rapidamente na tela, outros tomam seu tempo necessário e estabelecem bem as discussões a que o filme se propõe, como qualquer aventura de ficção científica digna. Prova disso está nos personagens do professor Xavier e de Magneto, sempre revelando uma curiosa complexidade por trás de suas ações.

Além disso, o filme tem o cuidado de encerrar os arcos dramáticos iniciados em seus antecessores, respeitando a continuidade da trilogia, e sem medo de tomar rumos inesperados com a perda de personagens importantes – o que também revela muito do universo construído em torno dos X-Men, que, embora heróis poderosos, também possuem fragilidades e estão sujeitos ao perigo, o que acrescenta uma dose de tensão para quem acompanha suas aventuras.

No fim das contas, embora fique claro que O Confronto Final não tem o mesmo peso dos filmes anteriores, ainda tem emoção e ação o suficientes para fazer dele um bom entretenimento e um robusto filme de super-herói. É fato que o resultado poderia ser bem melhor sem tantas interferências do estúdio, mas, só pelo fato de perceber que há uma tentativa de manter a discussão do subtexto da franquia e apontar novos caminhos a ela, mesmo por trás de todas as explosões e cenas de luta épicas, para mim já vale a pena.

E convenhamos: antes assistir o filme de Ratner do que a bagunça geral de X-Men Origens: Wolverine, esse sim um longa praticamente indefensável.