Realizado por Ingmar Bergman para ser sua despedida do cinema, “Fanny e Alexander” acabou não sendo seu último filme, mas confirmou uma finalização de carreira a altura do diretor. Marcando seu retorno a Suécia e sua maior e mais longa produção cinematográfica, o drama é sem dúvidas, a última grande obra-prima do mestre sueco. Lançado em três versões, sendo a original para televisão com mais de cinco horas de duração, a obra garantiu não só diversos prêmios, mas o retorno a casa com chave de ouro.

Acompanhado as graças e tragédias da numerosa família Ekdahl, a história narra de forma lúdica e dramática o impacto de certos eventos na vida de Emilie e, especialmente, nos seus filhos, Fanny e Alexander. Depois da morte do pai, as crianças tentam lidar com a repentina mudança de vida, o novo casamento da mãe e a crueldade do padrasto.

Elementos biográficos sempre fizeram parte das obras de Ingmar Bergman. Com narrativas e personagens baseados nas relações mais íntimas do diretor e nos conflitos gerados por esses relacionamentos, “Fanny e Alexander” não é diferente. Nesse que é o mais autobiográfico dos seus filmes, as alusões a vida do diretor estão presentes em cada detalhe. Alguns dos mais evidentes são: a semelhança do jovem protagonista, Alexander é uma projeção da visão que o diretor tinha de si mesmo, e a figura rígida do padrasto pastor das crianças, características compartilhadas com o pai do cineasta. Até mesmo a inserção de objetos da infância do diretor – como sua constantemente citada, lanterna mágica –, aos traços de familiares nos personagens.

Além disso, Bergman versa toda a narrativa pela profunda relação que tinha com a dramaturgia. Ele que se definia antes de tudo como um homem do teatro, ofício que exerceu até o fim da vida, não dispensa reverências aos palcos no filme. Esse amor e devoção é percebido nas diversas referências a Henrik Ibsen, o sobrenome da família Ekdal, e a August Strindberg, na cena final a matriarca lê uma passagem do dramaturgo, como também na pequena companhia teatral administrada pela família e no teatrinho de brinquedo de Alexander, transportado da própria infância do artista.

Considerado pelo próprio diretor como um resumo da sua carreira no cinema, “Fanny e Alexander” é uma homenagem do cineasta a sua eterna divisão entre sonho e realidade, ao seu universo particular de imaginação. O filme é o olhar de Ingmar Bergman sobre as coisas e pessoas. E como muitos bem definem, “Fanny e Alexander” é nada menos que monumental.