Famoso movimento do cinema americano nos anos 1970, o Blaxploitation teve como público-alvo os negros do país tão mal representados nas grandes produções de Hollywood. Sempre com o nível de violência acima da média, as produções transitavam entre policiais, westers, terror e até comédia. Estrelas como Pam Grier, protagonista décadas depois de “Jackie Brown”, de Quentin Tarantino, e Richard Roundtree, de “Shaft”, marcaram a geração.

No meio disso, um comediante fracassado, sempre correndo atrás do sucesso, que resolveu roubar piadas de mendigos e, inspirado nelas, criou um personagem icônico chamado Dolemite. O sucesso das rimas levou Rudy Ray Moore a virar lenda a ponto de se tornar conhecido como o Padrinho do Rap. Agora, a história dele chega à Netflix com o divertido “Meu Nome é Dolemite”, dirigido por um inspirado Craig Brewer (“Entre o Céu e o Inferno”) e um brilhante Eddie Murphy.

A bem da verdade, “Meu Nome é Dolemite” engrena quando o protagonista decide se aventurar no cinema. Muito disso se deve ao elenco muito bem escalado com especial destaque para Craig Robinson e Wesley Snipes roubando a cena toda vez que aparece – a forma como ele fala ‘ação’ é sensacional. Intérprete de Lady Reed, Da’Vine Jay Randolph brilha tanto nos momentos de humor quanto no drama. Não à toa que o trecho mais comovente pertence a ela ao ressaltar a importância da representatividade daquele elenco negro.

RIR DAS LIMITAÇÕES

“Meu Nome é Dolemite” caminha pela trilha já frequentada por filmes como “O Artista do Desastre” e “Os Picaretas”, este também protagonizado pelo próprio Eddie Murphy. Aqui, porém, ficamos encantados em ver que todos os envolvidos fazem o seu melhor apesar de suas claras limitações, enquanto no filme de James Franco isso levava ao riso pelas bizarrices.

Talvez, por isso, não espanta o sucesso de bilheteria alcançado pelo filme como se pode ver no fim de “Meu Nome é Dolemite”. E se Tommy Wiseau no primeiro momento ficou magoado com a crítica, Rudy ao ser detonado pela mesma, não se entristeceu – e até acalentou colegas – ressaltando que era pelos supostos defeitos do filme que o público compareceria as sessões.

Muito do sucesso da comédia deve-se, sem dúvida, a Eddie Murphy. A entrega do ator é perceptível, pelos trejeitos e pela forma como compõe Rudy, especialmente, na sua mudança de postura pós-Dolemite. E isso conversa bastante com a carreira do ator:  se Rudy Ray Moore aprende com seus fracassos, o astro parece seguir pelo caminho, afinal, chegou a ser uma das maiores estrelas de Hollywood, mas, viu tudo ruir após polêmicas pessoais e fracassos consecutivos de público e bilheteria.

A produção ainda capta muito bem o espírito da trilha sonora e reconstituída nos deslumbrantes figurinos criados por Ruth E. Carter, vencedora do Oscar de Melhor Figurino por “Pantera Negra” e com boas chances de voltar a ser indicada. A comédia da Netflix fala de sonhos, representatividade e amor pelo cinema. Acima de tudo, “Meu nome é Dolemite” alimenta o desejo de ver Eddie Murphy em mais filmes de maior qualidade como este.

CRÍTICA | ‘Deadpool & Wolverine’: filme careta fingindo ser ousado

Assistir “Deadpool & Wolverine” me fez lembrar da minha bisavó. Convivi com Dona Leontina, nascida no início do século XX antes mesmo do naufrágio do Titanic, até os meus 12, 13 anos. Minha brincadeira preferida com ela era soltar um sonoro palavrão do nada....

CRÍTICA | ‘O Sequestro do Papa’: monotonia domina história chocante da Igreja Católica

Marco Bellochio sempre foi um diretor de uma nota só. Isso não é necessariamente um problema, como Tom Jobim já nos ensinou. Pegue “O Monstro na Primeira Página”, de 1972, por exemplo: acusar o diretor de ser maniqueísta no seu modo de condenar as táticas...

CRÍTICA | ‘A Filha do Pescador’: a dura travessia pela reconexão dos afetos

Quanto vale o preço de um perdão, aceitação e redescoberta? Para Edgar De Luque Jácome bastam apenas 80 minutos. Estreando na direção, o colombiano submerge na relação entre pai e filha, preconceitos e destemperança em “A Filha do Pescador”. Totalmente ilhado no seu...

CRÍTICA | ‘Tudo em Família’: é ruim, mas, é bom

Adoro esse ofício de “crítico”, coloco em aspas porque me parece algo muito pomposo, quase elitista e não gosto de estar nesta posição. Encaro como um trabalho prazeroso, apesar das bombas que somos obrigados a ver e tentar elaborar algo que se aproveite. Em alguns...

CRÍTICA | ‘Megalópolis’: no cinema de Coppola, o fim é apenas um detalhe

Se ser artista é contrariar o tempo, quem melhor para falar sobre isso do que Francis Ford Coppola? É tentador não jogar a palavra “megalomaníaco” em um texto sobre "Megalópolis". Sim, é uma aliteração irresistível, mas que não arranha nem a superfície da reflexão de...

CRÍTICA | ‘Twisters’: senso de perigo cresce em sequência superior ao original

Quando, logo na primeira cena, um tornado começa a matar, um a um, a equipe de adolescentes metidos a cientistas comandada por Kate (Daisy Edgar-Jones) como um vilão de filme slasher, fica claro que estamos diante de algo diferente do “Twister” de 1996. Leia-se: um...

CRÍTICA | ‘In a Violent Nature’: tentativa (quase) boa de desconstrução do Slasher

O slasher é um dos subgêneros mais fáceis de se identificar dentro do cinema de terror. Caracterizado por um assassino geralmente mascarado que persegue e mata suas vítimas, frequentemente adolescentes ou jovens adultos, esses filmes seguem uma fórmula bem definida....

CRÍTICA | ‘MaXXXine’: mais estilo que substância

A atriz Mia Goth e o diretor Ti West estabeleceram uma daquelas parcerias especiais e incríveis do cinema quando fizeram X: A Marca da Morte (2021): o que era para ser um terror despretensioso que homenagearia o cinema slasher e também o seu primo mal visto, o pornô,...

CRÍTICA | ‘Salão de baile’: documentário enciclopédico sobre Ballroom transcende padrão pelo conteúdo

Documentários tradicionais e que se fazem de entrevistas alternadas com imagens de arquivo ou de preenchimento sobre o tema normalmente resultam em experiências repetitivas, monótonas e desinteressantes. Mas como a regra principal do cinema é: não tem regra. Salão de...

CRÍTICA | ‘Geração Ciborgue’ e a desconexão social de uma geração

Kai cria um implante externo na têmpora que permite, por vibrações e por uma conexão a sensores de órbita, “ouvir” cada raio cósmico e tempestade solar que atinge o planeta Terra. Ao seu lado, outros tem aparatos similares que permitem a conversão de cor em som. De...