Quando vi o número “10” ao lado do título impresso no ingresso, precisei sorrir. Dez filmes, um spin-off, missões que percorreram não só a superfície do globo como as fronteiras do espaço também: há algo mais a ser visto em um desses filmes? 

De minha parte, eu pensava menos no filme e mais na partida do Fogão daquele sábado. Mas a minha dúvida fez com que eu precisasse voltar a atenção ao restante do público: eles ainda tiram algo da franquia “Velozes e Furiosos”? Alguém ainda se importa? 

O casal sentado à minha frente parece nos oferecer um bom estudo de caso. Observemo-los. 

Começa o estudo

Ele, o rapaz sentado com a namorada na fileira C, explica para a moça os mecanismos básicos da trama – daquele jeito condescendente que só um bom macho heterossexual pode oferecer. A décima parte da saga começa rememorando o quinto capítulo da franquia, quando Toretto (Vin Diesel) e companhia performaram um ousado roubo na Cidade Maravilhosa. O roubo custou a vida de um bandidão local e agora cabe ao seu filho (Jason Momoa) perpetuar a vingança. 

Conforme o plano do vilão é posto em movimento, o clã de Toretto se vê separado e caçado ao redor do mundo. Más notícias para o piloto de regatas, que não só precisa cuidar da sua família estendida, como deve aprender a lidar com as noites sem dormir que só a paternidade pode proporcionar. 

A coisa vai engatando gradualmente. Uma cena de luta logo no começo, envolvendo Charlize Theron, não causa boa impressão: a ação é picotada demais, a câmera treme daquela forma genérica que conhecemos desde que Bourne pintou nos cinemas, e a moça à minha frente teve dificuldades em entender quem socou quem – coube ao namorado tentar explicar. 

Assim que a família Toretto entra em seus carrões possantes, porém, fica difícil não se deixar levar pelo espírito “tarde de domingo brincando de Hot Wheels com os amigos” de “Velozes e Furiosos 10”. Ajuda, também que, entre uma perseguição e outra, você tenha meia dúzia de estrelas com boa sintonia entre si. Em dado momento da projeção, é comentado que o clã de Toretto é como uma seita: todos que cruzam seu caminho acabam se juntando à família uma hora ou outra. Dá para dizer que a franquia ocupa uma posição similar em Hollywood: uma seita onde alguns dos atores mais carismáticos de hoje se reúnem anualmente para fazer poses e proferir falas duronas – “Eu posso fazer um trem andar em estrada de terra, então saia do meu caminho”, sendo uma das minhas favoritas). 

Mas, com tantos personagens e subtramas no caminho, é preciso pisar no freio. O roteiro acaba precisando sustentar um curioso número de malabares, saltando de núcleo em núcleo, subtrama em subtrama ao longo de 140 minutos. Por si só, isso não seria problema. Mas o ritmo fica verdadeiramente comprometido pela necessidade de termos uma cena de luta medíocre a cada dez minutos (de fato, foi durante uma delas que o casal à minha frente fez sua pausa para ir ao banheiro). 

Resultados do estudo

Felizmente, tudo retorna aos eixos durante o terceiro ato, quando os roteiristas pensam nas maneiras mais criativas de usar dois helicópteros e um carro em uma cena de ação. Mas retomo o questionamento: o público tira algo do filme? Os espectadores estão satisfeitos com o que viram? 

Era o que eu me perguntava enquanto tentava ler o casal à minha frente – que, após um cliffhanger sem vergonha, esperava pacientemente pela cena pós-créditos. Bom, leitores, não estou brincando quando digo que, depois da tal cena, o sujeito na fileira C urrou de felicidade, socou as costas do assento da frente e pulou na poltrona, enquanto sua namorada ria sem fim. Palmas irromperam na sala de cinema. Vitória do Fogão. Ano que vem estamos aí outra vez. Mal posso esperar.