Quando um filme é bom, é difícil desapegar dos personagens quando os créditos começam a surgir na tela. Comigo é assim, pelo menos. Às vezes, é aquele coadjuvante do coadjuvante do coadjuvante que nos prende a atenção, outras é o próprio protagonista.

Talvez por isso, a ideia de “Dois Lados do amor” tenha me deixado intrigada. Ver a vida dos dois protagonistas em um filme individual para cada um deles? Era torcer para os personagens serem remotamente interessantes que o resto estava feito. Agora, depois de assistir aos três filmes – o dele, o dela e o compacto com as duas versões – posso dizer que, se Eleanor e Conor não são exatamente carismáticos ou memoráveis, a ideia executada por Ned Benson deixa as manic pixie dream girl do cinema independente americano de lado para nos mostrar a beleza cruel do cotidiano.

Em “Dois Lados…”, Benson recruta a amiga Jessica Chastain, que vive a deprimida Eleanor Rigby (sim, igual à canção dos Beatles), que vive um amor machucado com o personagem de James McAvoy, Conor. Com a incubência de criar dois filmes diferentes – e não só por serem filmados sob pontos de vista diferentes -, Benson nos coloca no meio de uma crise em um casamento. Mais que isso, aliás. Ficamos no olho do furacão enquanto Eleanor e Conor “dão um tempo”. Ela quer se reinventar. Ele precisa dela a todo custo.

O mais legal do filme acaba sendo a maneira com que Benson brinca com diversas situações comuns aos dois protagonistas. Assisti ao “Ela” primeiro e ver o “Ele” meses depois deu uma nova dimensão ao amor e à melancolia mostrados na tela. Entendemos cada situação e até o que é deixado implícito nas duas versões. Por isso, o compacto lançado nos cinemas acaba sendo só uma assistida daquelas “a título de curiosidade”. É algo bem superficial, já que precisa tirar muito da essência dos personagens para criar uma narrativa com começo, meio e fim dentro de duas horas. A montagem funciona, mas, para falar a verdade, seria bem mais legal ver os dois filmes lado a lado.

Nesse duelo, o melhor filme acaba sendo “Ela”. Muito disso se deve ao talento de Jessica Chastain, que está cada vez melhor. Apoiada em um forte elenco feminino – destaco Viola Davis em um papel pequeno, mas fundamental na história -, Chastain cria uma mulher com a dose certa de chatice e a dose certa de vulnerabilidade. Não precisamos saber o que aconteceu para Eleanor desistir de tudo, Jessica nos conta com o seu olhar.

À frente de “Ele”, James McAvoy parece à vontade como Conor. No entanto, apesar de a história nos dar mais dimensão do que realmente acontece, ela acaba sendo menos interessante que o outro lado. Conor é um tanto quanto sem sal perto do je ne sai quoi que a sensibilidade de Chastain trouxe à produção e à também sem muita graça Eleanor. O personagem masculino funciona melhor no compacto.

Ainda assim, cada romance tem dois lados. Para cada Adele desesperada em se descobrir, há uma Emma indomável e cheia de vontades. Para cada Scarlett O’Hara e suas mil e uma crises de egocentrismo com doses de teimosia, há um Rhett e seu cinismo disfarçado de charme. E para cada Eleanor Rigby angustiada e sem rumo, há um Conor tentando reconstruir a vida. Respondendo à pergunta de Lennon e McCartney na música que “batizou” a personagem de “Dois Lados do Amor”, as pessoas solitárias pertencem umas às outras.