Os primeiros indícios não são nada animadores: a imagem escura e a profundidade de campo reduzida; as investidas na “mitologia” do filme anterior; o plano-sequência protocolar. Já nos primeiros minutos, “A Órfã 2 – A Origem” parece menos um filme do que uma checklist de tiques genéricos do cinema contemporâneo. 

A clareza espacial e o formalismo elegante que Jaume Collet-Serra trouxe para o primeiro longa se tornam uma memória distante ao longo da nova produção. No comando da sequência, William Brent Bell, que parece estar numa missão para tornar seu filme o mais descartável possível. 

Ficou para trás a atmosfera de crescente pesadelo doméstico, outrora pautada pelo controle formal de Collet-Serra. O novo longa parece satisfeito em se entregar aos mecanismos mais protocolares dos thrillers – e com tão pouco tesão que é como se o filme tivesse medo de existir, de se mostrar. Ele parece até tentar se esconder de nós. 

Só isso explica as imagens que temos aqui: perpetuamente escuras, embaçadas, feias de olhar – criminalmente feias, ouso dizer. Eu até precisei checar se o problema não estava nos meus óculos – cujas lentes, nem sempre tão limpas, podem deixar a desejar no quesito clareza ótica, a bem da verdade. Não pareceu ser o caso: “A Órfã 2” é realmente mais um argumento convincente contra a filmagem em digital no cinemão contemporâneo. 

(E a essa altura, devo soar como um disco arranhado para os leitores do Cine Set. Não é minha culpa se a praticidade do digital, quando somada à falta de inventividade visual de 99,9% dos realizadores contemporâneos, resulta em… bom, imagens medíocres – o mínimo denominador comum em forma de pixels). 

Virada estratégica

Até Isabelle Fuhrman (agora também produtora associada), que 13 anos atrás matou a pau como Leena/Esther, é utilizada aqui como um monstro genérico e engessado. Após escapar de um manicômio (e se lançar numa matança das brabas), Leena se infiltra na mansão dos Albright, passando-se por sua filhinha perdida, Esther. Mas dessa vez, é ela quem descobre que nem tudo é o que parece naquela família. 

É então que o filme nos atira uma virada na trama tão maluca que só nos resta admirar sua audácia. Passamos, assim, do tédio ao interesse genuíno: é que o longa mergulha com tanto desembaraço no seu absurdo que só nos resta sorrir intrigados. 

Outra vez, Esther despontará, ao final da projeção, como elemento desarticulador da sagrada instituição da família – que, neste capítulo, remete aos colonos pioneiros do Novo Mundo, aparentemente. Só que o resultado está mais para a promessa não cumprida, mesmo: ficamos desejando que mãos mais hábeis (ou ao menos imaginativas) tivessem comandado a produção. 

Nem que a vaca tussa “A Órfã 2” será considerado um bom filme. Mas, Jesus Cristo, ele deve ser ao menos divertido de assistir com uma plateia animada – em um domingo à tarde, por exemplo, longe da frieza de uma cabine de imprensa numa segunda de manhã.