Quando se procura a palavra “esplendor” no dicionário, o que se acha é algo como “fulgor”, “pompa”, “brilho intenso”, “resplandecência” e vários outros termos similares. O filme novo da diretora Naomi Kawase leva os significados dessa palavra – que é o título brasileiro da produção – a um patamar mais existencial.

As sensações são importantes em ‘Esplendor’. Afinal, é uma história de amor entre um fotógrafo que está ficando cego e uma mulher que trabalha com audiodescrição de filmes.  Com isso, a brincadeira entre os olhares dos dois personagens é um dos motes da produção: logo no início, somos apresentados a Misako (Ayame Misaki) e percebemos que, por conta do trabalho, ela tem uma sensibilidade diferenciada, o que explica a sua conexão com Masaya (Masatoshi Nagase), algo quase irônico, já que ele vive do próprio olhar.

O trabalho de Kawase é íntimo. Estamos tão próximos dos personagens que parece que estamos invadindo o espaço deles. Essa proximidade aguça a sensação de impotência que se tem quando há algum obstáculo para Masaya ou quando Misako precisa enfrentar e desvendar o seu passado. Ao mesmo tempo, há uma confusão nas imagens, algo de perturbador, como se nós também estivéssemos a ponto de parar de enxergar.

Além da direção e do trabalho de fotografia, as atuações do casal principal são fundamentais para que essa sensação de intimidade seja tão incômoda quanto é acalentadora. Ayame Misaki, em especial, entrega um trabalho contundente ao retratar Misako como o contraponto para os sentimentos mais pesados de Mayasa, no entanto surgindo mais como uma “nova chance” e menos como “a musa fofinha que dá sentido ao sofrimento do protagonista”, trope tão comum no cinema daqui do Ocidente.

O “brilho intenso” que aparece junto à palavra “esplendor” no dicionário pode ser visto a cada vez que o filme se refugia na natureza e nas belas paisagens coloridas de um Japão que na obra de Kawase surge ainda mais poético. E, no fim das contas,’Esplendor’ é isso: poesia singela em uma história de amor à imagem, ao olhar, às memórias