Em 2008, o curta-metragem Criminosos ganhava o Prêmio do Público como Curta-Metragem 35mm na edição do Amazonas Film Festival. Dirigido pelo então produtor executivo da Secretaria de Cultura do Amazonas, Sérgio Andrade, o curta-metragem é um filme de ficção que relata a rede de conexões de uma comunidade e sua reflexão sobre questões da criminalidade urbana a partir da morte de um menino. O Cine Set conversou com o diretor e o roteirista, Emerson Medina, sobre as impressões do filme, desde a formulação do projeto até as participações nos festivais de cinema.

Pré-Produção

O argumento cinematográfico de Criminosos surgiu após um debate sobre redução da maioridade penal. De acordo com o roteirista do curta-metragem, Emerson Medina, “durante a conversa se percebeu que reduzir a maioridade numa canetada não resolve os outros aspectos da cadeia de criminalidade: corrupção policial, criminalização das drogas, tráfico de armas e o que financia o crime, como o caso da pirataria”, disse. Por ser jornalista, boa parte do roteiro de Medina esteve embasado em informações vistas no cotidiano da redação jornalística e aspectos do jornalismo investigativo, “através da leitura sobre espiral concêntrica”, contou.

O termo espiral concêntrica no jornalismo investigativo é visto a partir de um fio que vai formando um espiral tendo por ponto de partida o corpo vitimado. Em algum momento a espiral vai conduzindo às pistas que podem ser uma pegada, marcas de pneus, os cartuchos do revólver, evoluindo até as testemunhas e suspeitos. Em Criminosos, a estrutura narrativa se assemelha ao espiral, visto que todas as personagens estão em volta de Neguinho (exceto o vereador e o traficante) e suas tramas são desenvolvidas a partir de então. Para Medina, que lera sobre o termo após ter finalizado o roteiro e momentos antes de começarem as gravações do curta, “foi uma surpresa perceber como o tema estava interligado ao filme”, relatou.

Segundo o roteirista, “a estrutura da narrativa tem influência dos quadrinhos, principalmente de Alan Moore, autor de “Liga Extraordinária”, Watchmen”, entre outros”, afirmou. As histórias de Moore trabalham com a ideia de que as micro-ações reverberam no universo macro gerando efeitos em cadeia que afetam o coletivo, algo semelhante à aplicação da teoria do caos. “Ele acompanha as histórias de personagens cujos atos convergem em algum evento maior, sendo que, muitas vezes a história abandona o protagonista, para buscar a óptica das personagens coadjuvantes. Em Criminosos, procurou-se fazer isso: uma história a partir de vários pontos de vista”, revelou.

Embora utilize os pontos de vista a fim de contar a história, para o jornalista, os argumentos expostos no filme “não justificam a redução da maioridade penal. O sistema está todo comprometido para sair apontando o dedo e desejando que a corda arrebente no lado mais fraco que é o menor criminoso”. Dessa forma, o curta-metragem apresenta visões diversificadas que, de alguma forma, incluam ao menos a metade da audiência.

Produção

Convidado pelo roteirista Emerson Medina, o produtor executivo Sérgio Andrade assumiu a direção geral do curta-metragem. “O filme foi um presente, ele possui uma potência interessante que mostra um trabalho de dedicação da equipe, principalmente quando estávamos seguindo as etapas de sua produção. Servindo de modelo para um cinema amazonense que se iniciava e que pretendia ser profissional e com capacidade”, contou o diretor do filme.

A locação escolhida para ambientar Criminosos foi uma área do bairro Planalto, próximo ao Alvorada, que na época do processo de criação do curta-metragem tinha elevada incidência de tráfico de drogas. A equipe de produção optou por se aproximar da comunidade e entrosar-se com seus personagens. “O próprio roteiro falava bastante da questão de drogas, violência e ali se encontravam personagens reais que tangiam esse universo”, contou o diretor. Alguns moradores da região participaram do filme como figurantes.

Fascinado pela produção audiovisual, Criminosos foi o primeiro passo como diretor na carreira de Sérgio Andrade e representa o início de um trabalho de equipe. “Um time dedicado, que demonstrou essa característica principalmente nas etapas de produção”, disse o diretor que viu a união e o entrosamento de sua equipe de produção como alguns dos requisitos para o sucesso do filme, além de esboçar um novo caminho para a produção cinematográfica no Amazonas.

Pós-Produção

Criminosos  rendeu a primeira indicação do Amazonas Film Festival na categoria de roteiro para Emerson Medina e também seu primeiro prêmio. “A continuidade da premiação tem parte da contribuição de Criminosos, pelo menos enquanto durou o Festival”, contou. Outro mérito dividido por ele e Sérgio Andrade, foi a participação do curta-metragem na conferência Creative Clusters, um evento sobre comunidades criativas em Glasgow, na Escócia.

Para Sérgio Andrade, Criminosos tem valor simbólico muito importante, embora, hoje, ele observe no filme algumas falhas. “Como todo filme que se inicia, um primeiro curta-metragem tem suas fragilidades”, disse o diretor que enxerga “uma potência interessante no filme, que tem como um dos maiores legados a dedicação de uma equipe de produção”, afirmou.

O filme abriu-lhe a mente para o que procurou “durante toda a sua vida, alimentando o êxtase pela produção cinematográfica”, contou. Além de que, para o diretor, a obra oportunizou o trabalho de outros profissionais da área audiovisual que continuam produzindo até os dias de hoje. Dessa forma, a obra “contribuiu para um novo caminho no cinema amazonense”, afirmou.

Criminosos é um dos filmes que faz parte da história do cinema amazonense e, considerando a atual situação em que o país se insere e a peculiaridade do ano em vigência, é  bom estar atento às conexões implícitas que há em cada situação. O que o curta-metragem, de certa forma, procura evidenciar, tornando a sua temática e construção narrativa atemporais.