A Globo Filmes, sabemos, é responsável por boa parte do que o cinema brasileiro produz de pior atualmente – tramas apelativas, atuações canhestras, visual óbvio e gasto. Raramente os filmes estão acima desse padrão desalentador – mais exatamente, só quando Guel Arraes (O Auto da Compadecida), Jorge Furtado (Saneamento Básico – O Filme) e Daniel Filho (Se Eu Fosse Você 2) assumem o comando.

Há um nome, porém, que representa à perfeição os equívocos da produtora. Roberto Santucci estreou nas telas com Olé – Um Movie Cabra da Peste (2000), comédia ligeira, com um mote que lembrava as antigas chanchadas dos anos 1950. Filme vai, filme vem, o diretor conseguiu um sucesso com De Pernas pro Ar (2008), comédia (mais uma) que trazia a carismática Ingrid Guimarães, e estava dado o start para a nova onda de comédias nacionais.

De lá pra cá, os filmes de Santucci – Sequestro Relâmpago (2010), Até que a $orte nos Separe (2012), De Pernas pro Ar 2 (idem), Odeio o Dia dos Namorados (2013) e a sequência de Até que a $orte nos Separe (idem) –, foram se engessando numa fórmula insuportável, de piadas ruins – daquelas de revistinha mesmo –, estereótipos preguiçosos (Odeio… tem um festival deles) e tramas frouxas, pouco mais do que um mote para alinhavar as gags. Pior, o sucesso desses filmes inspirou toda uma nova geração de comédias bisonhas, do relativamente inofensivo Qualquer Gato Vira-Lata a desastres como Giovanni Improtta e O Concurso.

Eis que, com esse O Candidato Honesto, filme que renova a parceria com Leandro Hassum, de Até que a $orte…, a fórmula… não muda. Mas, ajudada pela performance mais contida do protagonista e o bom desenvolvimento dos personagens, a comédia acaba sendo a mais agradável – e, pasmem, até francamente engraçada – de Santucci desde o De Pernas pro Ar original.

Tá, isso não é grande coisa. Comparado a, digamos, Se Eu Fosse Você 2, o filme de Santucci tem bem menos graça, charme, ou talento genuíno do que o sucesso de Daniel Filho, mas a produção compensa pela boa oportunidade de encarar o tema “política” – coisa rara em filmes brasileiros de qualquer gênero – e por aproveitar boas referências em sua trama simples e eficiente.

João Ernesto (Hassum) é um candidato idealista e empenhado na frente do público, mas envolvido até o pescoço em atos de corrupção no mundo real. Favorito para conquistar o segundo turno da eleição presidencial, ele faz uma visita à avó moribunda – e esta lhe lança uma praga que o torna incapaz de mentir.

Que a trama é um decalque de O Mentiroso, comédia de Jim Carrey lançada em 1997, é algo óbvio. Agora, talvez inspirado pelo astro americano, Hassum consegue equilibrar bem o humor físico com os momentos em que a trama exige seriedade e sutileza. Com a ajuda de um elenco principal atento – Victor Leal, como o assessor de Ernesto, e Flávia Garrafa, como a esposa do político –, o filme consegue emprestar graça às gags batidas, deixando o produto final aceitável. As referências a outros filmes – principalmente O Grande Ditador (1940), no interminável e lacrimejante discurso final – e episódios da política nacional também servem para dar ao filme um estofo acima da média no gênero.

A palavra “aceitável” cai bem, aqui, porque, de resto, o filme não economiza nos defeitos dos outros filmes de Santucci: piadas repetidas até o cansaço – me vêm à mente as sequências na cabana do pai-de-santo (Jovane Nunes), ou a fuga de João Ernesto no ônibus com uma idosa –, a trama romântica forçada (com a jornalista vivida por Luiza Valdetaro), as atuações irregulares, o péssimo uso da trilha sonora.

Porém, num meio onde esses problemas são lugar comum – as comédias da Globo Filmes –, a evolução de Hassum como comediante, além da história despretensiosa e sem medo do politicamente incorreto, devem servir para colocar O Candidato Honesto entre as comédias de destaque do Brasil em 2014. Novamente, não é grande coisa. Mas já é alguma coisa.