Neste domingo, o Oscar chega à sua 90ª edição. Muito se falou sobre como, em nove décadas de história, apenas cinco mulheres foram lembradas na categoria de melhor direção (todas brancas e apenas uma delas vencedora), pegando o gancho da indicação de Greta Gerwig, por “Lady Bird – A Hora de Voar”.

Além de Greta, outras três mulheres estão sob o microscópio neste ano, todas pelo filme “Mudbound – Lágrimas Sobre o Mississipi”: a diretora de fotografia Rachel Morrison, a diretora e roteirista Dee Rees e a atriz, cantora e compositora Mary J. Blige. Três momentos históricos para as mulheres: Morrison é a primeira a ser indicada na categoria de Melhor Fotografia, enquanto Dee Rees é a pioneira entre negras e homossexuais assumidas a ser reconhecida em uma categoria de Roteiro, e Mary J. Blige é a primeira pessoa indicada por atuação e canção no mesmo ano.

É uma cerimônia que, como eu já escrevi acima, existe desde muito antes de as mulheres citadas acima – e provavelmente as mães delas – terem nascido. Ainda assim, a cada ano parece que há uma nova barreira a ser quebrada. E isso só prova o quanto Hollywood tem a evoluir como indústria.

Pensando nisso, resolvi passear pela história do “carequinha dourado” e pontuar cada uma das pioneiras e o que se fez do legado delas. Vem que a leitura é longa.

  • Janet Gaynor: Foi a primeira mulher a ganhar um Oscar. Venceu o prêmio de melhor atriz na cerimônia de 1929, pelos filmes “Aurora” e “Sétimo Céu” (a premiação reconheceu os filmes de 1927 e 1928). Abandonou o cinema dez anos depois. Morreu em 1984, aos 77 anos;
  • Frances Marion: primeira mulher a ser indicada e ganhar em uma categoria de roteiro, por “O Presídio” (1931). Com “O Campeão” (1932), se tornou a primeira pessoa a vencer duas vezes nessa categoria. Marion chegou a dirigir um filme, mas, com a invasão masculina em Hollywood do pós-crash de 1929, perdeu espaço. Nos anos 1940, deixou a indústria do cinema para se dedicar ao teatro;
  • Gale Sondergaard: foi a primeira vencedora na categoria de melhor coadjuvante, em 1936, por “Anthony Adverse”;

  • Louise Rainer: vencedora por “Terra dos Deuses” (filme problemático onde faz yellowface ao viver uma chinesa) e “Ziegfeld, O Criador de Estrelas”, foi a primeira mulher a ganhar dois Oscars de atuação e a primeira pessoa a ser premiada dois anos seguidos entre os atores.
  • Hattie McDaniel: primeira atriz negra a ganhar um Oscar. Ela foi premiada por “…E O Vento Levou” (1939) na categoria de coadjuvante. A segunda vez que isso ocorreria seria só em 1991!, com Whoopi Goldberg, reconhecida por “Ghost – Do Outro Lado da Vida”. Filha de escravos, Hattie McDaniel venceu seu Oscar. Na noite da cerimônia, sentou em uma mesa longe do palco, e separada de seus colegas de elenco, também indicados. A atriz seguiu na carreira interpretando personagens semelhantes a Mammy – inclusive no polêmico “A Canção do Sul”, da Disney -, e morreu em 1952.
  • Marlee Matlin foi a única pessoa surda a vencer um Oscar de atuação. Ela também é a mulher mais jovem a ganhar o prêmio de melhor atriz. Isso aconteceu em 1986, com “Filhos do Silêncio”.

  • Halle Berry: foi a primeira e única negra vencedora da categoria de melhor atriz. A primeira a ser indicada foi Dorothy Dandridge (que Berry interpretou em um telefime um ano antes de ganhar o Oscar). Outras atrizes reconhecidas na categoria, mas sem vitórias, são Viola Davis, Angela Bassett, Whoopi Goldberg, Diana Ross e Cicely Tyson.
  • “Filhos do Silêncio” fez história em outra categoria naquele ano, ao se tornar o primeiro trabalho dirigido por uma mulher a ser indicado a melhor filme. A diretora Randa Haines não foi indicada, no entanto.
  • Miyoshi Umeki foi a primeira e única atriz asiática a ganhar um Oscar, pelo filme “Sayonara”. Entre as latinas, apenas a porto riquenha Rita Moreno (‘Amor, Sublime Amor’) e a descendente de cubanos Mercedes Ruehl (‘Pescador de Ilusões’) foram reconhecidas. As três atrizes ganharam como coadjuvantes.

  • Fernanda Montenegro foi a primeira atriz latina indicada ao Oscar de melhor atriz. Além dela, Salma Hayek e Catalina Sandino Moreno seriam nomeadas anos depois.
  • Kay Rose foi a primeira editora de som mulher a vencer um Oscar, isso só em 1984 por “O Rio do Desespero”. Outros créditos dela incluem “Velocidade Máxima”, “Um Espírito Baixou Em Mim” e “Gente Como a Gente”.
  • Lina Wertmuller foi a primeira mulher indicada ao Oscar de Direção, em 1975, por “Pasqualino Sete Belezas”. A segunda vez que isso ocorreria seria apenas em 1994, com Jane Campion e “O Piano”. Kathryn Bigelow foi a primeira mulher a vencer o prêmio, só em 2009, com “Guerra ao Terror”.
  • Julia Phillips foi a primeira mulher a vencer o Oscar de melhor filme. A produtora ganhou por “Golpe de Mestre” (1973). Isso só se repetiu em 1989, com Lili Fini Zanuck, premiada por “Conduzindo Miss Daisy”.

  • Com “A Excêntrica Família de Antônia” (1995), a holandesa Marleen Gorris se tornou a primeira mulher a dirigir um ganhador de Melhor Filme Estrangeiro.
  • Thelma Schoonmaker está entre as pessoas que mais venceram Oscars de Melhor Montagem, com três estatuetas e outras quatro indicações. A primeira mulher indicada na categoria, no entanto, foi Anne Bauchens, por “Cleópatra”, em 1934! Vale notar que, no início do cinema, as mulheres costumavam trabalhar na montagem dos filmes, já que os diretores e cabeças de estúdio acreditavam que elas tinham mais habilidade para isso por terem experiência com trabalho manual (leia-se costura). Ai, ai.
  • Dorothy Fields foi a primeira mulher indicada (1934) e também a primeira a vencer, no ano seguinte, um Oscar de Melhor Canção. Ela o fez por “The Way You Look Tonight”, do filme “Ritmo Louco”, de 1936.

Ainda falta muito chão pra percorrer, mas já passou da hora de vermos uma diretora negra indicada ao Oscar (olha a Dee Rees e a Ava DuVernay aí!), uma latina vencedora na categoria de atriz principal, assim como mais negras para seguir os passos de Halle Berry. A esperança é que, com os movimentos e protestos intensificados na Era Trump e no pós-Harvey Weinstein, essas vozes, que já estão falando alto, sejam escutadas pela indústria.