Começo da noite, final da tarde, fui representando o Cine Set para um casarão próximo da Estação São Paulo–Morumbi onde estavam acontecendo as gravações finais da comédia, “Vudu Delivery”, novo filme do cineasta Alain Fresnot (de “Desmundo” e “Ed Mort”). A missão era acompanhar as filmagens e conversar com parte da equipe do filme que conta a história de um casal interpretado por Natália Lage (“O Homem do Ano”) e Marcos Veras (“O Filho Eterno” e “Um Casal Inseparável”). Os dois possuem um serviço de entregas decadentes e, ao conhecerem um guru espiritual interpretado por Silvero Pereira (“Bacurau”), decidem abrir um novo negócio: a “Vudu Delivery”, uma empresa de azarações para socialites e a classe alta.

O filme ainda traz um elenco coadjuvante estrelar com nomes como Lima Duarte, Bruno Garcia, Zé Carlos Machado, Ary França, Lorenço Mutarelli, Luana Martau e por aí vai. O roteiro de “Vudu Delivery” foi co–roteirizado pelo também produtor Paulo Boccato ao lado de Alain.

“O roteiro é baseado em uma história pré–existente escrita pelo José Rubens Chacá (que também está no elenco do filme). O Alain me chamou pra fazer a co–produção e, no processo, a gente começou a discutir muito o roteiro a ponto de praticamente reescrevê-lo, mantendo a essência da ideia original e dos personagens criados pelo Chacá principalmente o trio de protagonistas sócios da Vudu Delivery”, diz Boccato.

O roteirista e produtor ressalta alguns temas importantes para ele que cabem perfeitamente em uma comédia. “Vudu Delivery é um filme sobre como a sociedade precariza as pessoas, as joga em um universo de insegurança financeira e ainda exalta isso como empreendedorismo. Isso converge para escolhas morais duvidosas, que é o que esses personagens fazem quando eles abrem a Vudu Delivery. O filme ainda mostra como o ódio e a inveja viraram mercadorias, exploradas nas redes sociais e na política. Afinal, o slogan da loja é ‘garantimos os seus piores desejos’”.

SEGURANDO A FERA

Foto: Cheyenne Alencar

Estive no set de “Vudu Delivery” em um dos últimos dias de gravação para a gravação de uma grande reunião centrada nos protagonistas Natália Lage e Marcos Veras com Bruno Garcia e Luana Martau. Sequência trabalhosa, equipe toda na correria. Ainda assim, nos intervalos de uma filmagem e outra, o Alain Fresnot teve um tempo para conversar com o Cine Set. Destaquei como achava curioso que a filmografia dele sempre alterna entre uma comédia e um drama, algo que ele me deu razão.

“Faço o que dá para fazer porque no cinema brasileiro não dá para escolher muito. Vou desenvolvendo os meus projetos e aqueles que eu consigo fazer virar eu filmo. Por coincidência, o penúltimo foi uma comédia, o último foi um drama e agora uma comédia de novo. E o próximo projeto que eu quero fazer é uma dramédia, é um misto, mais denso do que esse”, revelou.

Alain admite que não pode se queixar em relação ao elenco, pois, segundo ele, “ os bons atores gostam de trabalhar comigo, então, eu não tenho problema de conseguir reunir um bom elenco”. Para “Vudu Delivery”, o diretor disse que o trabalho de casting foi feito em parceria com a Paris Filmes até por conta do potencial comercial da comédia. “ A minha preocupação é fazer um filme aberto… E juntar atores da mídia com velhos amigos meus como o Ary França, o Lima Duarte, o qual está me dando a honra de fazer uma participação especial, a Débora Duboc. Tem sido super bacana”.

Ao ser perguntando sobre a relação forte do brasileiro com comédia, Alain ressalta como todas as cinematográficas nacionais periféricas tem esse nicho que faz sucesso de público. “Na França, Alemanha, Itália existe também. Ocorre porque é muito difícil para Hollywood fazer uma comédia dentro da cultura brasileira com sua vivência e intimidade. Isso é diferente do cinema de ação, gênero com uma linguagem mais universal, porque ação é ação em qualquer É como dizia Paulo Emílio (Salles Gomes, um dos maiores teóricos e críticos do cinema brasileiro) falecido, mestre, diz: as pessoas gostam de se ver na tela”.

Graças a essa intimidade, Alain revelou que procurou fazer um humor menos ácido e cruel, duas das principais características provocadoras dele. “Tentei amarrar essa fera que tenho dentro de mim e fazer uma coisa mais família para ter alguma expectativa de grande público sem deixar de tratar de temas importantes”.

HUMOR MAIS CONTIDO

Durante a noite, pude conversar ainda com os protagonistas de “Vudu Delivery”. Marcos Veras, por exemplo, admitiu que se sente desafiado por fazer um paulistano pela primeira vez, logo, ele um ator carioca. Já Natália Lage me contou que a entrada no filme veio por conhecer Alain há muitos anos, mas, somente agora conseguirem trabalhar juntos. O convite surgiu quando fazia a peça “Senhora Klein” ao lado Ana Beatriz Nogueira e a Kika Kalache.

Para a atriz, o estilo de comédia do diretor desafia bastante os atores no set de filmagem. “O Alain tem o filme muito na cabeça dele. Logo, é uma comédia onde temos menos improvisos, mais contida em que precisamos acessar a estrutura imaginada por ele. Bate sempre a sensação: ‘será que está engraçado?’. É um humor de situações, então, há momentos em que estamos super sérios dentro de algo esdrúxulo, o que acaba ficando engraçado”.

“Vudu Delievery” ainda não tem previsão de estreia, mas deve chegar aos cinemas do país entre 2024 ou 2025 com distribuição da Paris Filmes.