A primeira coisa que você vai ver em “Aliança do Crime” é um criminoso delatando seus parceiros para o FBI. Ele proverá boa parte da estrutura narrativa para o resto do longa. Sim, qualquer semelhança com “Os Bons Companheiros” é mera coincidência. Apesar de ter sua ligação com “Os Infiltrados”, é do filme anterior de Scorsese sobre a máfia que o novo projeto de Scott Cooper deve mais do seu DNA.

A relação com “Os Infiltrados” não é tanto estrutural quanto narrativa: tanto ele quanto “Aliança” funcionam como dois lados de uma mesma história, a união do FBI com a máfia de Boston, com o filme de Scorsese contando-a do ponto de vista dos policiais e o de Cooper, dos mafiosos.

Ter laços estreitos com não só um, mas dois filmes de Scorsese é uma tarefa ingrata, ainda mais considerando as modestas ambições de “Aliança”: nota-se muito claramente, logo nos primeiros dez minutos, que ele quer ser tão-somente um bom filme policial. Nestes termos, “Aliança” funciona muito bem, largamente devido ao zelo de todos os envolvidos.

Para início de conversa, o alarde que tem sido feito em torno da performance de Johnny Depp é mais do que merecido, de fato. Nas mãos de um ator mais queridinho da Academia (estamos olhando para você, Bradley Cooper), estaríamos diante de uma indicação quase certa ao Oscar. Independente disso, Depp, que vinha emendando bomba atrás de bomba nos últimos anos, investe fundo em um papel hipnótico que nos mantém presos a um personagem que, a despeito de seu fundo muito real, tinha tudo para virar um gângster cartunesco no celuloide. Seu James Bulger se mostra uma pessoa traumatizada com o passado cuja sanidade cai como um castelo de cartas no momento em que se vê em uma situação de poder.

A decisão de manter fora do elenco os típicos galãs do momento ou esconder os que aparecem sob toneladas de maquiagem é um ponto positivo para os responsáveis tanto pelo casting quanto pela maquiagem, bem como um alívio em uma Hollywood tão obcecada pela juventude e pelo maquinário promocional que um filme de um grande estúdio pede hoje em dia. Isso dá margem para uma enérgica atuação de Joel Edgerton como o agente do FBI John Connolly, mentor da ideia de unir Bulger com a agência, e aparições de atores do calibre de Kevin Bacon e Corey Stoll em papeis certeiros.

O diretor de fotografia Masanobu Takayanagi, tarimbado do cinema de ação, entrega imagens clássicas, sisuda e meticulosamente trabalhadas que não chamam a atenção para si mesmas. O trabalho com luz, bem como o com posicionamento e movimento de câmera traduzem bem do ritmo deliberadamente lento e tenso que Cooper estabelece desde o princípio até o fim do longa. Junkie XL, por sua vez, que fez fama compondo trilhas de eletrônica pesada para filmes como “300: A Ascensão do Império”, aqui entrega músicas com muitas cordas que poderiam ter vindo de um Howard Shore da vida numa boa.

Tudo isso para dizer que sim, “Aliança do Crime” funciona mediante a sua proposta e, enquanto não busca reinventar a roda, não frustra porque, em nenhum momento, demonstra desejo em fazer isso. Com sólidas atuações e alto valor de produção, é um policial adulto que vale suas duras horas de projeção, mas qualquer vontade de rever as três de “Os Bons Companheiros” depois dele é mera coincidência.