O que mais chama a atenção em “Sessão Bruta”, filme que compõe a Mostra Aurora em Tiradentes, é a inquietação que não leva ao frenesi, mas busca a calmaria da afirmação, chegar ao limite para se sentir em paz. E o filme se utiliza de interessantes recursos de linguagem para conseguir esse efeito.

“Sessão Bruta” acompanha um grupo de travestis em Minas Gerais. Logo de cara chama atenção a fotografia com ruídos do filme, gravado todo com uma câmera Mini-DV. A escolha confere ao filme um senso de urgência, e também um ar familiar, como se acompanhássemos gravações caseiras de uma enorme família.

O uso abusivo do zoom tanto para se aproximar quanto para se afastar das personagens, combinada às transições em cross-dissolve, reforçam a necessidade da obra em não parar, em trabalhar sempre em fluxo, permitindo sempre que os corpos em tela sejam ativos em busca de protagonismo.

Geralmente, essas combinações técnicas descendem para um filme exaltado, mas aqui o intuito é a reflexão. Os off discorrem sobre a vida, arte, política, gênero, sempre partindo do pessoal para o coletivo, desabafos que buscam encontrar um interlocutor, reafirmando a existência daquelas pessoas tanto pelo que mostram quanto pelo que falam.

A direção é assinada por As Talavistas E Ela Ltda., e busca dar espaço para as diferentes artes produzidas pelas integrantes do grupo desde a dança até pintura. O tom memorialístico passa a predominar após metade da obra, quando são utilizadas mais fotos para compor as cenas e acompanhamos pequenas situações corriqueiras, como um passeio pelas ruas da cidade.

O equilíbrio entre a experimentação estética e o tom contemplativo é a chave para o sucesso de “Sessão Bruta”, o que permite às artistas, a cada sequência, tentar chegar a um novo ponto, uma nova possibilidade, demonstrando a partir da linguagem, seu descontentamento com o padrão, desafiar artisticamente o normativo.

Uma festa lotada passa a ser um lugar para se perceber, refletir sobre a existência e em meio ao coletivo, experimentando com as imagens a retratação das dúvidas e angústias internas de quem está atrás e a frente da câmera. Um cinema que está sempre no limiar, mas afaga buscando o alarme, a urgência de suas protagonistas.

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